507 anos do Protestantismo e a escravidão negra nos Estados Unidos

Em 31 de outubro de 2017, a reforma protestante completou 500 anos, foi uma data oportuna para a reflexão histórica do protestantismo e a escravidão negra no mundo. Neste artigo vamos pincelar alguns fatos da relação do protestantismo com a escravidão negra nas igrejas protestantes nos Estados Unidos. Primeiramente é importante frisar que as igrejas  não saíram ilesas pela controvérsia da escravidão. Quase todas as Igrejas protestantes nos Estados Unidos sofreram consequências como a divisão e o cisma. As grandes denominações chegaram até a se racharem, resultando em Igrejas “do Norte” e “do Sul”.

Vejamos alguns fatos dessa  divisão nas igrejas  norte-americanas pelo pecado da escravidão.

Os Metodistas e a escravidão:

O movimento metodista na América era conhecido como a Igreja Metodista Episcopal. John Wesley, precursor do movimento Metodista, condenava a escravidão como uma “vilania execrável”. Ele não admitia, sob hipótese alguma, que um ser humano fosse dono de outro; daí escreveu contra a escravidão e encorajava Wilberforce na sua luta no parlamento inglês contra o mal. Mas nas colônias americanas, quem trabalhava nas fazendas de arroz eram os negros e, apesar da Declaração da Independência (1776) afirmando como uma “verdade auto-evidente” que todos foram dotados pelo Criador do Direito da Liberdade, no novo país (EUA) a escravidão não foi abolida na época!

Os membros da denominação poderiam ter escravos, o clero não podia. Em 1832 James Andrew Osgood da Geórgia foi consagrado bispo, ele não tinha escravos, porém, Andrew casou com uma mulher que possuía um escravo, tornando-se um proprietário de escravo. Em 1844, Andrew viajou a Nova Iorque para a Conferência Geral Anual da Igreja Episcopal Metodista. Alguns bispos do norte levantaram a questão de Andrew ser um proprietário de escravos. Essa questão foi o estopim para a divisão da Igreja Metodista. A questão foi decidida pelo voto: 136 votaram a favor da separação, quinze votaram contra. Os sulistas criaram a Igreja Metodista Episcopal do Sul e no Norte, os metodistas continuaram com o nome Igreja Metodista Episcopal.

As poucas vozes de protesto ao sistema não foram suficientes para levantar a consciência da Igreja de modo geral; e, com o tremendo aumento da produção do algodão, para a qual pensava-se indispensável o labor negro, criou-se um argumento tanto filosófico como bíblico que apresentava a escravidão não como um mal, senão como bem positivo! Foi só de 1830 em diante que o movimento de abolição começou a crescer; e nesta luta muitos metodistas participaram plenamente.

Os Batistas e a escravidão:

Os Batistas foram à segunda das grandes denominações protestantes divididas sobre a questão da escravidão. Nas igrejas batistas do Norte, vários pastores e um grande número de leigos Batistas tornaram-se convencidos da necessidade de arrependimento imediato do pecado da escravidão.

Em 1836, os Batistas do Norte declararam a escravidão como pecado e questionaram se deveriam manter relações com os donos de escravos. Os Batistas do Sul, por outro lado, defenderam a instituição da escravidão e atacaram os abolicionistas do Norte. Os oficiais das missões batistas queriam evitar qualquer controvérsia, evitando que os trabalhos missionários das igrejas batistas não fossem prejudicados.

Os batistas da Geórgia recomendaram que James E. Reeve, um proprietário de escravos, tornar-se um missionário. Os batistas do Norte rejeitaram a ideia de um missionário escravista e se recusou a nomeá-lo. Batistas do Sul se reuniram, na Geórgia, em 1845 e formaram a Convenção Batista do Sul. Foi mais um sinal das tensões graves transversal que se desenvolveu no país antes da eclosão da guerra civil.

Rev. Basil Manly, Sr., então presidente da Universidade do Alabama (1838-1855), elaborou uma resolução defendendo a escravidão. Manly dono de uma plantação e 40 escravos, defendia a “humanidade dos escravos”, acreditava que a instituição era parte do esquema adequado de estruturas sociais do homem, e que a religião batista poderia ajudar no tratamento humano aos escravos.

Os Presbiterianos e a escravidão:

Diferente dos metodistas e batistas, os presbiterianos a separação não foi centrada em um indivíduo, mas pela ideia  da própria escravidão. Já em 1787, o Sínodo de Nova York e Filadélfia havia sugerido que os escravos fosse libertados. A questão da escravidão se alargou ainda mais a divisão entre os presbiterianos liberais (nova escola) e conservadores (velha escola). A nova escola (igrejas presbiterianas do Norte) aprovou várias resoluções condenando a escravidão. Nas igrejas presbiterianas do Sul, velha escola, se defendia a escravidão nas escrituras e considerava infiéis os abolicionistas.

O pastor presbiteriano da velha escola Robert Lewis Dabney reconhecia a escravidão permitida biblicamente e o comércio de escravos licito. Ele documentou que os nortistas, que atacava a escravidão, eram os que tinham iniciado o comércio de escravos e enriqueceram com isso. Ele também pediu a reforma da escravidão do Sul para eliminar os abusos que eram incompatíveis com a instituição da escravidão como biblicamente definido.

Os Anglicanos e a escravidão:

A relação da Igreja Anglicana no tráfico de escravos se deu através da Sociedade para a Propagação do Evangelho, em especial nas ilhas Barbados. A Igreja Anglicana, através de sua filial missionária, foi dona de uma plantação em Barbados. Os escravos do local eram marcados como gados no peito com a palavra “Sociedade”, referente à Sociedade para a Propagação do Evangelho no Estrangeiro. Os donos da plantação recebiam uma indenização por libertar os escravos, o bispo de Exeter recebeu centenas de libras por este motivo. Apesar dos esforços dos reformadores anglicanos como William Wilberforce, a Igreja era parte do problema, bem como parte da solução.

William Wilberforce, nasceu em 24 de Agosto de 1759 e morreu em 29 de Julho de 1833, foi um político britânico, filantrópico e líder do movimento abolicionista do tráfico negreiro. Nativo de Kingston upon Hull, Yorkshire, começou sua carreira política em 1780 como candidato independente, sendo deputado do condado de Yorkshire entre 1784 e 1812. Em 1785 converteu-se ao evangelicalismo, mudando completamente o seu estilo de vida e se preocupando ao longo de toda sua vida com a reforma evangélica. Em 1787, William Wilberforce conheceu Thomas Clarkson (abolicionista britânico) e um grupo abolicionista ao tráfico negreiro que incluía Granville Sharp, Hannah More e Charles Middleton, importantes nomes da época e que juntos persuadiram Wilberforce a entrar também na causa. Assim, Wilberforce  logo se destacou tornando-se líder do grupo britânico abolicionista. E liderando uma campanha no parlamento inglês contra o tráfico negreiro até a então assinatura do Ato contra o Comércio de Escravos de 1807William Wilberforce foi influente para a libertação dos negros.

Os Luteranos e a escravidão:

A Igreja Luterana foi amargamente dividida por assuntos teológicos e políticos, os mesmos problemas que dividiu a nação em uma guerra civil. A questão da escravidão foi debatida muito antes dos Estados Unidos se dividido pela Guerra Civil. “Na verdade, muito antes da criação da Confederação e o estabelecimento de uma igreja luterana do Sul, as instituições da escravidão e um crescente sentimento de distinção entre Norte e Sul tinham preparado o terreno para essa evolução.” Foi surpreendente, contudo, que a Igreja Luterana entrou no debate sobre a escravidão relativamente tardia, quando comparado a outras denominações. Os metodistas, presbiterianos, batistas ja vinha discutindo a questão da escravidão desde o final de 1700. Dentro da Igreja Luterana, um dos primeiros adversário da escravidão foi o Sínodo Franckean do Estado de Nova York.

Pregadores Luteranos do Norte denunciou o longo silêncio de suas próprias igrejas e outros sobre a questão da escravidão, e confessou que, ao tentar preservar uma falsa paz que tinham, provavelmente, contribuíram para a calamidade da guerra. (Paul A. Baglyos, Luterana Historical Society do-Newsletter Mid Atlantic, Inverno 1999)

Os luteranos do sul retiraram os seus homólogos do Norte, e em 1863 formaram uma nova organização, conhecida como o Sínodo Geral do sul. Embora muitas outras questões podem ter contribuído para a guerra, a disputa principal na Guerra Civil Americana foi a escravidão e, especialmente, a sua expansão para novos territórios ocidentais. Embora alguns luteranos no Norte eram abolicionistas radicais (o Sínodo Franckean sendo uma exceção).  A maior parte dos luteranos do sul eventualmente, apoiavam  o sistema de escravidão e a questão da escravidão havia complicado as suas relações com os seus homólogos do Norte.

Os Congregacionais e a escravidão:

O nome “congregacional” geralmente descreve o seu estilo  organizacional, que promove a autonomia da igreja local e de propriedade, enquanto que promovem companheirismo e responsabilidade entre as Igrejas a nível Nacional.

A Igreja Congregacional foi a primeira igreja da América a se levantar contra o racismo e a escravidão. Também fundou a American Missionary Society(1849) para ajudar na liberdade dos escravos.

Em 1785, a Igreja Congregacional ordenou Lemuel Haynes, o primeiro Afro-americano a ministrar na América.

Entre as denominações protestantes, os congregacionais foram os mais abertamente contra a escravidão.

Nas igrejas congregacionais não aconteceu a divisão entre igrejas do norte e igrejas do sul, acreditamos que divido o seu sistema onde cada congregação local é autônoma e independente.

Em resumo, o protestantismo nos Estados Unidos sofreu grandes consequências, como a divisão e o cisma, com o pecado da escravidão. Nas denominações metodista, batista e presbiterianos, outras questões contribuíram para o racha, mas a escravidão foi a de maior gravidade, em cada caso.  No caso dos anglicanos, luteranos e congregacionais a questão escravista tem suas particularidades, como: sua relação com a escravidão te acontecido fora dos Estados Unidos em outras colônias e até mesmo na Inglaterra que é o caso dos anglicanos; os luteranos apesar de também terem se dividido entre a questão da escravidão, entrou no debate sobre a escravidão já bem mais tarde; Entre as denominações protestantes os congregacionais foram os mais abertamente contra a escravidão, os primeiros da América a se levantar contra o racismo e a escravidão.

Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

Consciência Negra para crianças

Como ensinar “Consciência Negra” para os pequeninos dos anos iniciais?

Devemos começar falando sobre Africanidades. Apresento como sugestão uma parte de um texto meu que está numa serie de 5 livretos com pequenas histórias, com variados tipos de texto, dedicada ao Ensino Fundamental ajudando aos professores com a Educação para as Relações Étnicorraciais e Ensino da História e Cultura Africana e Afrobrasileira. Sairá em 2017…

Começando pelas africanidades fica muito mais fácil entender o que é “CONSCIÊNCIA NEGRA“. Com certeza serão adultos melhor informados sobre o que isso significa e não vão questionar sobre a necessidade de se ter consciência negra no Brasil…

Fica a dica..

AFRICANIDADES
(…)

Escutando a professora e pensando,
aos poucos fui entendendo,
Devagarzinho compreendendo
Essa tal africanidade.
É verdade !

(…)

A professora contou uma história que eu não conhecia. A história da “Árvore do Esquecimento”.

Nome diferente e triste para uma árvore não é mesmo?

Veja porque ela assim ficou sendo chamada…

“Existiu, lá no continente Africano, na Nigéria, no Porto do Benin, uma antiga e frondosa árvore. Ela ficava nas proximidades onde os africanos escravizados eram colocados nos navios tumbeiros para atravessar o oceano e chegar ao Brasil. Conta-se que antes do embarque, os homens eram obrigados a dar sete voltas ao redor dessa árvore e as mulheres nove voltas. A cada volta teriam que repetir em voz alta que esqueceriam tudo o que havia passado antes em suas vidas: sua família, sua religião, seu modo de viver, suas canções, seus valores…

Essa foi a tentativa dos escravizadores para tentar roubar as lembranças das raízes desses homens e mulheres africanos.Fazê-los esquecer sua terra natal,sua identidade,sua dignidade como pessoas. Eles pensavam que se tudo isso ficasse esquecido, apagado da mente desses homens e mulheres seria mais fácil transformá-los em escravos submissos,mercadoria pronta para ser vendida!

Mas a tentativa do ritual da “Árvore do Esquecimento” fez o efeito contrário. Escravizaram apenas o corpo pois na mente, na alma e no coração ninguém manda!”

(…)

“Os ancestrais africanos, quando fizeram a viagem forçada para o Brasil, não vieram sós. Trouxeram consigo seus rituais, seus valores,linguagens, religiões, costumes, vestimentas, canções e saberes de agricultura, metalurgia e pesca. Todos esses conhecimentos, princípios e valores foram transmitidos aos seus descendentes por meio das histórias contadas de geração em geração.”

(…)

Foi muito importante saber
Que os negros escravizados
No Brasil foram deixando
Pensamentos, crenças, idéias

Marcas de ser e viver !

Junto ao corpo escravizado
vindos nos grandes tumbeiros
carregavam, sem permissão
falares, sabores, saberes.

Viva, sua tradição !

Vivencias, crenças e idéias
ritmos, hábitos, sentimentos
comida, bebida, condimentos
modos de plantar e colher,
de tocar e de cantar !

Tudo ficou bem gravado
No coração brasileiro
são tradições, são valores
São heranças ancestrais
É a tal africanidade.

Não vou esquecer nunca mais !

Foi, nesse dia, então
Que pude melhor entender.
Que essa tal africanidade.
Com outras culturas parceiras
Teceram os fios coloridos
Da cultura brasileira !

Nessa aula eu aprendi
Uma verdadeira lição
Somos todos, os brasileiros
no sangue e na alma, herdeiros
De tradições africanas

Que bacana !
Desejo que usem a criatividade característica de professores para as atividades que poderão ser desencadeadas com esse texto. Tenho certeza de que os estudantes do 3°,4°,5° anos do Fundamental gostarão…Desde o desenhar e colorir a árvore, localizar no mapa o local dela, pesquisar na internet como está o local agora e principalmente entender facilmente o que são as Africanidades que já estão ouvindo falar em todos os lugares…

Sucesso! Se desejar mande fotos das atividade desenvolvidas para serem socializadas para outros professores mostrando possibilidades.

Por  Rosa Margarida

10 pessoas negras nas histórias bíblicas

 

Para percebermos a presença negra na Bíblia devemos considerar o seu contexto, não vamos ver escrito na bíblia: pessoas pretas, negras ou africanas. Mas vamos ler os termos etíopes, egípcios, hebreus, ou outros termos tribais. Etiópia é mencionada mais de 40 vezes na Bíblia; Egito é mencionado aproximadamente 700 vezes, e África é mencionada mais do que qualquer outro continente da terra na Bíblia. Também devemos considerar que o “Oriente Médio”, incluindo a Terra Santa foi conectado ao mapa da África até 1859, quando o Canal de Suez foi concluído. Tudo isso nos mostra que a Bíblia é um livro afro-asiático e tem muitos negros e negras como protagonistas. Nesta direção, vejamos 10 pessoas negras nas histórias bíblicas e como ilustração as imagens da última série do fotógrafo James C. Lewis.

 1 – A Rainha de Sabá

 

A primeira vez que a Bíblia menciona uma Rainha refere-se a uma mulher negra. (Gn 10: 7).  A tradição etíope afirma que o nome da rainha era Makeda, mas as Escrituras se refere a ela como a Rainha de Sabá, ou a Rainha do Sul, e sua fama era tal que 2.000 anos depois,  Jesus Cristo conhecia seus feitos. Jesus se referiu a ela dizendo que tinha vindo dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão. – Mt 12.42.

2 – A Rainha Candace

Corajosas guerreiras, as candaces  são as rainhas mães da realeza africana na antiguidade. Em Atos 8, no Novo Testamento da Bíblia, a Rainha Candace é citada quando Filipe, o Evangelista, encontra um chefe dos tesouros de “Candace, rainha dos etíopes“, cujo nome não foi mencionado no texto. Importante esclarecer que na Antiguidade, o termo Etiópia era utilizado para denominar a região onde se situavam os povos negros do continente africano. O nome Candace foi dado a todas as rainhas da Etiópia durante o seu tempo, bem como o título de Faraó foi dado a todos os reis africanos do antigo Egito.

3 – Zípora a mulher negra

Zípora, uma africana, esposa de Moisés, e filha de Jetro (Êxodo 2: 21). Segundo a Bíblia, Deus  permitiu que os israelitas casassem com mulheres cusitas/etíopes ( negras) Êxodo (34: 11 e 16). Há diversas passagens Bíblicas que demonstram que Deus mantinha uma relação única com os etíopes, assim como mantinha com os Israelitas: “Não me sois, vós, ó filhos de Israel, como os filhos dos etíopes?” (Amós 9:7), “Príncipes virão do Egito; a Etiópia cedo estenderá para Deus as suas mãos” (Salmo 68:31). Moisés, que escreveu os primeiros cinco livros da Bíblia, se casou com  Zipora, etíope, e foi criticado por Miriã e Arão (Números 12: 1).

4 – Tamar a negra da linhagem de Cristo

Tamar aparece pela primeira vez na Bíblia depois que Judá vai para Canaã. Então Tamar, a mulher Cananeia (Negra) fica grávida de Judá, e dá à luz aos gêmeos Zerá e Perez, formando a Tribo de Judá, antepassados do rei Davi e de José e Maria, os pais terreno de Jesus. Gênesis 38.

5 – Maria a mãe  de Jesus

Os antepassados de Maria na genealogia de Jesus Cristo  são Tamar, Raabe, Rute, Bateseba (Mateus 1:1-16). As primeiras senhoras mencionadas eram de descendência de Cam. Assim, Maria pode ser  descendentes  dos povos semitas e de Cam. Deus enviou  Maria e José para o Egito com o propósito de esconder o menino Jesus do rei Herodes (Mateus 2:13). Eles não poderiam se esconder no norte da África se fosse uma família branca.

6 – Jesus nasceu em Africa

Além da sua linhagem negra, Jesus nasceu em África. Os Evangelhos dizem de maneira explícita que Jesus nasceu em “Belém de Judá, no tempo do rei Herodes” (Mt 2,1 cfr. 2, 5.6.8.16), (Lc 2, 4.15), (Jo 7, 40-43). Nos tempos antigos, incluindo o tempo de Jesus, Belém de Judá era considerado parte de  África. Até a construção do Canal de Suez, Israel fazia parte da África. Esta visão haveria de perdurar até 1859, quando o engenheiro francês Ferdinand de Lesseps pôs-se a construir o Canal de Suez. A partir daí, foi a África separada não somente geográfica, mas sobretudo histórica, cultural e antropologicamente do que hoje chamamos Oriente Médio. Aquela milenar extensão da África passa a figurar nos mapas como se fora Ásia.

7 – Simão o Negro 

Os evangelhos são unânimes em afirmar que um certo Simão de Cirene ajudou Jesus a carregar a cruz, a caminho do Calvário (Mt 27.32; Mc 15.21; Lc 23. 26).  Cirene fica no norte da África. Em Atos 13:1 ele reaparece como, Simeão NígerSimão o negro, ele é um dos pastores da igreja, é o homem que impõe as mãos sobre Paulo para enviá-lo ao campo missionário. A Bíblia fala dos seus filhos e esposa como pessoas importantes na Igreja.

8 – Sofonias o profeta negro

O  capítulo 1 do livro de Sofonias   o identifica pela sua família: “Palavra do SENHOR, que veio a Sofonias, filho de Cusi, filho de Gedalias, filho de Amarias, filho de Ezequias, nos dias de Josias, filho de Amom, rei de Judá.”Sofonias foi filho de um homem chamado Cusi; esse nome – Cush, em hebraico – significa Etiópia, e Etiópia significa “a terra do povo de rostos queimados”, ou seja: pessoas negras; baseando-se nisso, Sofonias foi um homem negro.

9 – Moisés tinha as características físicas dos egípcios

A Bíblia em várias ocasiões descreve os antigos hebreus como parecendo os egípcios. Em  Gênesis capítulo 50 versículos 7-11, a escritura descreve  os hebreus como parecido com os egípcios. Um exemplo bíblico aconteceu no enterro de Jacó (Israel) que morreu na terra do Egito, os hebreus e egípcios foram à terra de Canaã para enterrá-lo. Os cananeus disseram: “Grande luto para os egípcios.”  Lembrando que no cortejo estava  os hebreus e egípcios que vão enterrar um hebreu, e os cananeus identificaram os dois como egípcios. Se os hebreus fosse um povo de pele branca os cananeus teriam reconhecido os dois, dizendo: “Este é um  grande luto dos egípcios e hebreus.”

Moisés era um hebreu – israelita da tribo de Levi (Êxodo 2: 1-3). Ele passou 40 anos no Egito (Atos 7:23), era o neto do Faraó (Êxodo 2: 6, 10).  Moisés tinha  as mesmas características físicas dos egípcios, ele foi criado na casa de Faraó, como o neto de Faraó, quando o faraó ordenou que todas as crianças, do sexo masculino, hebraicas fossem mortas ao nascer. Se os israelitas eram um povo de pele branca, como poderia Moisés hebraico sobreviver secretamente na casa de Faraó, entre egípcios de pele negra durante 40 anos, e não ser notado. As  filhas do sacerdote de Midiã também descreveram Moisés ao pai como um “egípcio”.

10 – Adão o primeiro homem

No hebraico, Adão é definido com o solo  marrom-avermelhado, pele escura como uma sombra.  O Jardim do Éden foi descrito em Gênesis como tendo sido perto de um sistema de quatro rio na região das terras de Cush, Havilá, Assur, que hoje seria perto das fronteiras do Leste do Sudão, Etiópia e Eritréia. O berço da humanidade foi confirmado quando os mais antigos restos humanos foram encontrados na Etiópia em 1974. Ciência e  Bíblia confirmam:  o berço da humanidade foi na África Oriental.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

Imagens da última série pelo fotógrafo internacional: James C. Lewis – ÍCONES DA BÍBLIA  – https://br.pinterest.com/rawnoire/icons-of-the-bible/

10 fatos que você não sabia sobre a escravidão nas igrejas evangélicas no Brasil

Os primeiros protestantes chegaram ao Brasil ainda no período da escravidão. Era um grupo composto principalmente por defensores da escravidão, omissos, e poucos abolicionistas. Os protestantes também foram proprietários de escravizados. 

Veja também: 10 fatos que você não sabia sobre a abolição da escravatura nas igrejas evangélicas no Brasil.

Segue 10 fatos que você não sabia sobre a escravidão nas igrejas evangélicas no Brasil:

1 – Anglicanos buscaram cristianizar os filhos dos escravizados.

Na cidade do Rio de Janeiro encontrava-se um grupo de anglicanos da Christ Church. Os membros dessa igreja, em sua maioria bastante abastados financeiramente, eram donos de escravos. Estes anglicanos buscaram cristianizar os filhos dos escravos de seus membros, forçosamente batizando-os e dando-lhes nomes cristãos. Consta no livro de atas da Christ Church os seguintes relatos:

Thereza, filha de Louisa – escrava negra, nativa de Manjoula, África – propriedade de James Thonton, um comerciante inglês”. Lê-se também: “Em 11 de maio de 1820 foram batizados 11 escravos do fazendeiro Robert Parker”. Fonte: Livro nº 1 de Registro de Batismo da Christ Church, p. 19/20. Doc. Christ Church. Rio de Janeiro.

Em outra igreja Anglicana, a que se reunia em Morro Velho, também se constata escravos pertencentes a membros. Há registros de batismos de escravos domésticos de John Alexander em 1830 e do Coronel Skerit em 1833. As cidades de Morro Velho e Passagem no estado de Minas Gerais eram locais de exploração a minas por uma empresa inglesa. Em torno dessas minas crescia uma colônia britânica numerosa, sempre visitada pelos bispos da igreja anglicana.

2 – Os primeiros evangélicos batistas no Brasil possuíam escravos.

Os primeiros colonos batistas no Brasil possuíam escravos. Muitos vieram para o Brasil por causa das facilidades e similaridades escravagistas aqui encontradas. Crabtree fora um missionário batista enviado pela Junta Missionária de Richmond (Convenção do Sul). Em 1859 ele escreve à Junta avaliando aquilo que seria, para ele, muito tranquilizador para o envio de missionários americanos para o Brasil:

o Brasil era como os Estados Unidos, tem escravos e os missionários enviados pela Convenção Batista do Sul não podiam sentir-se constrangidos a combater a escravatura e assim envolver-se na política do país”. Fonte CRABTREE, A.R. História dos Batistas do Brasil até 1906. Rio de Janeiro. Casa Publicadora Batista.1962, p.5

Muitos batistas em Santa Bárbara D’Oeste, em São Paulo, possuíam escravos para os trabalhos domésticos e, também, na lavoura. Rute Mathews, contando a história de Ana Bagby (missionária batista pioneira no Brasil), relata a história da Senhora Ellis, batista, senhora de escravos, e que hospedou os fundadores da Primeira Igreja Batista do Brasil, os missionários W. Bagby, em sua casa nos primeiros meses do casal no Brasil:

Depois de dormir uma noite na Capital Paulista, os missionários tomaram o trem para Sta. Bárbara, onde chegaram sob forte aguaceiro. Na estação os aguardavam os enviados da Sra. Ellis, com dois cavalos e um escravo, para carregar a bagagem. A estrada até o sítio estava bem lamacenta, mas ao chegar, foram carinhosamente recebidos”. Fonte CRABTREE, A.R. História dos Batistas do Brasil até 1906. Rio de Janeiro. Casa Publicadora Batista.1962, p.5

3 – Evangélicos Ingleses eram proprietários de mais de 2 mil escravizados.

O Rev. Boys era um capelão inglês da ilha britânica de Santa Helena, no meio do Atlântico Sul. Em 1819, ele foi obrigado a permanecer por um bom tempo no Rio de Janeiro, por causa de uma enfermidade de sua esposa. Sua carta informa que a cidade do Rio de Janeiro tinha naquela época 300 mil habitantes, 80 mil dos quais eram escravos. Ele continua:

Aqui temos residindo um embaixador inglês, o sr. Thornton, e aproximadamente 1.500 negociantes ingleses mais os franceses, muitos dos quais sei que favorecem uma sociedade bíblica auxiliar. A maioria deles possui escravos, os quais, naturalmente, eles têm a obrigação de instruir, e não poderiam ser incomodados [por cumprirem essa obrigação]. Daí haver bastante oportunidade para o estabelecimento de uma escola para adultos em casa para o benefício deles próprios… E quanta utilidade isso teria aqui! Pois não devem existir menos de 2 mil escravos, propriedade de negociantes ingleses (eu os estimaria em 3 mil ou 4 mil), inteiramente às ordens de nossos compatriotas”. Fonte: REILY, História documental, p. 49.

4 – Os Metodistas tinha duas classes de escola dominical de escravizados.

Spaulding foi o primeiro missionário metodista no Brasil; partindo de Nova York, chegou com sua família ao Rio de Janeiro em 29 de abril de 1836. Antes de completar um mês de estada no país, organizou a primeira escola dominical. Sua escola dominical tinha uma assistência de mais de quarenta crianças e jovens. Quanto aos escravos, ele diz:

Temos duas classes de pretos, uma fala inglês, a outra português. Atualmente, parecem muito interessados e ansiosos por aprender…”. Fonte: REILY, História documental, p. 92

5 – Os crentes evangélicos compravam escravos nos leilões.

No dia 10 de outubro de 1859, dois meses após desembarcar no Rio de Janeiro, Simonton escreveu em seu diário:

Fui com o senhor H. a um leilão em que ele comprou dois negros. Outra vez estou no meio do horror da escravidão”. Fonte: SIMONTON, Ashbel G. O Diário de Simonton, 1852-1866. 2. ed. ampliada. São Paulo: Cultura Cristã, 2002, p. 11.

Alguns dias antes (28/09), ele tivera uma discussão na qual contrariou certo Sr. “S.”, que o desapontara muito, pois esta pessoa era “absurdamente a favor” da escravidão. Simonton era nortista, logo, favorável à abolição, pois considerava a escravidão pecado e opressão. Apesar de sua opinião contrária à escravidão, Simonton se mostrou cauteloso quanto à exposição pública de suas ideias antiescravistas no Brasil. Três anotações em seu Diário, datada de 3 de janeiro de 1860 e 31 de dezembro de 1866, dão conta de que Simonton se utilizou do trabalho de escravos no Brasil, embora nunca os tenha possuído. Em 1860, quatro negros fizeram o transporte de sua mudança para a casa do Sr. Patterson. Em 1866, um negro chamado Quitano, alugado por Blackford, o ajudou na arrumação de sua nova casa. Depois, quando novamente se mudou de endereço, para a Rua dos Inválidos, uma escrava chamada Cecília trabalhou para ele por um tempo. Um dado interessante é que uma das últimas pessoas a orarem por ele junto ao seu leito de morte foi um negro, membro da igreja de São Paulo. Fonte FERREIRA, Júlio Andrade. História da Igreja Presbiteriana do Brasil. 2 vols. 2. ed. São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1992, vol. 1, p. 84.  

6 – Missionários levavam escravizados em suas viagens de pregação do evangelho.

Júlio Andrade Ferreira, ao narrar a chegada de John Boyle a Cajuru, interior de São Paulo, diz que ele se fazia acompanhar de um negro, que, cansado, queixou-se da longa viajem. Todavia, não faz qualquer alusão ao fato de esse negro ser um escravo, seu ou da missão, limitando-se a chamá-lo de “acompanhante”. Esse fato ocorreu entre 1882 e 1884, portanto, antes da abolição. Fonte: FERREIRA, História da Igreja Presbiteriana do Brasil, vol. 1, p. 251. A citação original vem de outro livro de sua autoria, Galeria evangélica, p. 95-97.

7 – Evangélicos luteranos alemães possuíam escravizados.

Émile Léonard comenta em seu livro que nos estados do sul do Brasil, os alemães, em sua grande maioria protestantes, possuíam muito poucos escravos. Em São Leopoldo seu número era bastante reduzido e Hermann Blumenau não aceitava escravos na sua colônia. Porém, a razão para isso era mais econômica do que motivada por princípios cristãos, uma vez que os colonos eram muito pobres para possuir escravos.

Por outro lado, Léonard afirma que nas regiões onde “os alemães foram submetidos a uma economia escravagista, eles se conformavam”. Um exemplo disso foi a colônia Leopoldina, no sul da Bahia. Ali se contavam em 1853 apenas 25 trabalhadores livres para 1.245 escravos, que garantiam sua sobrevivência sob um clima terrível. Fonte LÉONARD, O protestantismo brasileiro, p. 101, nota 81.

8 – Na Revolta dos Malês dos 160 acusados, 45 eram escravizados de evangélicos.

Os súditos britânicos, membros da Saint Church, não só desobedeciam às ordens de S.M. Britânica ao participarem do rentável comércio negreiro que se fez na Bahia do século XIX, mas também eram proprietários de escravos que utilizavam como mão-de-obra doméstica ou em alguns empreendimentos de caráter manufatureiro que mantinham em Salvador. Em 1835, durante a revolta dos escravos malês, ocorrida em Salvador, dos 160 acusados, 45 eram escravos de ingleses residentes no bairro da Vitória. No sumário do juiz que condenou os líderes da insurreição escrava, fica evidente que as próprias lideranças do movimento eram propriedade de ingleses e se reuniam nos fundos de suas casas:

capturei como cabeças e Chefes de Clubes que se a ajuntavão na casa do Inglez Abraham e de que anteriormente tinha dado parte ao excelentíssimo Presidente da Província os seguintes nagôs-Diogo-Daniel-Jaimes e João escravos de Abraham, cabeças do clube, sahirão e recolherão se pela manhã-Carlos e Thomaz-Cabeças do Clube, sahirão e recolherão se pela manhã ainda com as calças com sangue examinei não tinha ferida alguma no corpo, escravos de Frederico Robelliard, Cornelio escravo Preto rei Inglez apanhou recolhendo se para caza confessou ter hido com os outros era também do Clube, aceitara o evangelho”. Fonte: In. Anais do Arquivo Público do Estado da Bahia.Salvador.1992. Vol.50, p.59.

9 – Os evangélicos ingleses possuíam escravizados como bens ou investimentos.

Compulsando testamentos e inventários de anglicanos que morreram na Bahia na segunda metade do século XIX, também constatou-se a presença de proprietários de escravos, tais como os senhores Eduardo Jones que tinha 6 escravos domésticos; o Sr. George Mumford 17 que possuía 11 escravos que trabalhavam na sua roça no Acupe e Sr. George Blandy, que possuía 4 escravos. Os seus herdeiros, cidadãos britânicos, se recusaram a ficar com os escravos, pois “pela legislação inglesa não pode o suplicante (James P. Mee) possuir escravos, e pedia que reforme a sentença aquinhoando aqueles escravos ao herdeiro João Miranda Pinheiro da Cunha cazado com D. Joaquina Blandy Pinheiro da Cunha.

É interessante destacar que o herdeiro inglês não teve nenhum pejo de tratar os escravos como mais um bem na herança a ser dividida. Ao invés de alforriar os escravos dando-lhes liberdade, solicitou uma barganha financeira com um herdeiro brasileiro, que poderia ser proprietário de escravos. O seu pedido foi atendido pelo Juiz.  Fonte: Testamento n 07/3056/04. Arq. Público do Estado da Bahia;Testamento n 07/3048/02. Arq. Público do Estado da Bahia; Partilha Amigável n 01/114/171/17. Arq. Público do Estado da Bahia.

10 – Os evangélicos lucrava com a escravização de seus próprios filhos.

Com um misto de surpresa e indignação, o Rev. Walsh a descrever episódios que demonstravam a desumanidade da escravidão vivido pelos escravos no Brasil, nada deixou mais chocado o clérigo do que constatar que seus concidadãos ingleses participavam e usufruíam do “nefando comércio,” lucrando com a escravização de mulheres e de seus próprios filhos, como presenciou na estrada da Tijuca, no Rio de Janeiro.

Incrédulo diante do que viu e ouviu, o capelão não podia admitir que aquele homem inglês fosse o mesmo que partiu de sua terra natal, mas tratava-se de uma outra pessoa que, estando:

em um país estrangeiro e entra em contato com a escravidão a sua natureza parece modificar-se, e ele passa a vender não só a mãe de seus filhos como os filhos propriamente ditos, e com tanta indiferença como se tratasse de uma porca com a sua ninhada.” Fonte: WALSH, p. 164.

Imagem: do filme 12 ANOS DE ESCRAVIDÃO que mostra o crente fervoroso, senhor de escravos,  afirmando que todo o sofrimento que os escravizados estavam passando era justificado pela Bíblia. O filme mostra ainda  o assédios  e estupros das escravizadas  pelo escravista e o ciúme doentio de sua esposa. A imagem mostra também a mulher negra escravizada da ilustração de kendy Joseph.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

Referências e Informações:

Visões Protestantes Sobre a Escravidão – Elizete da Silva – Revista de Estudos da Religião Nº 1 / 2003 / pp. 1-26

A Igreja Presbiteriana do Brasil e a escravidão: BREVE ANÁLISE DOCUMENTAL – Hélio de Oliveira Silva – FIDES REFORMATA XV, Nº 2 (2010): 43-66

LÉONARD, Émile G. – Protestantismo Brasileiro – Editora Juerp

O Protestantismo e escravidão no Brasil – Hernani Francisco da Silva

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10 artistas que já sofreram racismo

O racismo existe em todo o Brasil e mundo, é uma realidade que está nas relações de todas as classes, ele não poupam pessoas negras ricas nem pobres, famosos ou celebridades. Todas as pessoas negras tem uma historia de racismo para contar.  O racismo é um mal que precisa sair das pessoas, é perverso é CRIME.  Conheça o depoimento de 10  artistas que já sofreram racismo:

O cantor Thiaguinho foi vítima de preconceito em um restaurante

Em 2012, o cantor Thiaguinho foi vítima de preconceito em um restaurante. “Fui almoçar num restaurante de shorts, camiseta e chinelo. Quando o manobrista trouxe o meu carro e eu fui entrar, ele colocou a mão na frente. Não achou que aquele carro pudesse ser o meu e perguntou: ‘Você é o dono?’ Tem um preconceito velado quando alguém vê um negro com um carrão. Logo perguntam: ‘É jogador ou pagodeiro?’. Ou seja, no Brasil o negro só pode ter dinheiro se tiver uma dessas duas profissões. E vivem me perguntando se sou jogador”, contou ele ao site ‘Ego’.

Adriana Bombom, revela que já sofreu muito preconceito pelo fato de ser negra

“No começo da carreira eu fui muito discriminada, pelo fato de ser mulata grande e bunduda, mas não era só um preconceito profissional não, por não ter o perfil… Os bookers da época falava que eu tava mais para Sargentele, do que para modelo. Não tinha muitos negros nas agências na época e sempre existiu uma panela muito grande. Sem falar que existia a queridinha dos bookers e eu sempre ficava na geladeira”, contou ao site ‘O Fuxico’ a dançarina Adriana Bombom, revelando que já sofreu muito preconceito pelo fato de ser negra.

Taís Araújo: eu sofro muito

Taís Araújo é hoje uma atriz consagrada. Mas, em 2004, quando interpretava a Preta de ‘Da Cor do Pecado’, a atriz, que na época namorava um rapaz branco, desabafou sobre o preconceito ao site ‘Vírgula’: “Eu sofro muito. Qual negro que não sofre com preconceito nesse país?! Meu namorado é branco, e ele fala que não é bem assim, que não há tanto preconceito. Só que eu digo pra ele: Se um dia eu tiver um filho com você, o nosso filho vai ser negro. E aí sim você vai sentir na pele esse preconceito. Só sentindo na pele pra saber. Dizem que, hoje em dia, está melhor, diminuiu bastante o preconceito. Porém, o dia que você nascer negro, ter um filho negro, vai saber como é. É duro, mas estamos aí, batalhando, na luta”, disse ela.

Gloria Maria, foi barrada na porta de um hotel de luxo no Rio de Janeiro

A primeira repórter negra da TV brasileira,Gloria Maria, foi barrada na porta de um hotel de luxo no Rio de Janeiro, no começo de sua carreira. “Fui a primeira repórter negra da televisão. A primeira a apresentar o jornal das sete, a primeira no comando do ‘Fantástico’… Mas tive que enfrentar muitas barreiras e obstáculos para conseguir as coisas. Tudo é mais difícil para um negro. Você tem que provar 100 vezes que você é o melhor. É cansativo, duro, doloroso. Se você não tiver uma força extraordinária, não consegue passar por isso. Mas eu vim ao mundo para lutar. Sou uma guerreira!”, contou a jornalista ao ‘Ego’.

Lázaro Ramos revelou que sofreu bastante com o preconceito

Em entrevista à Marília Gabriela, o ator Lázaro Ramos revelou que sofreu bastante com o preconceito antes de virar um ator famoso. “Sofri diversas vezes. Algumas delas de uma maneira mais explícita e outras de uma maneira que entendi depois. Por exemplo, eu tive a minha primeira namorada aos 17 anos, eu sempre fui o melhor amigo. Eu estudava em colégios particulares que tinham, em sua maioria, pessoas brancas, e eu tinha muita dificuldade em me relacionar”, contou ele.

Thalma de Freitas chegou a ser levada a uma delegacia por ‘engano’

A atriz Thalma de Freitas chegou a ser levada a uma delegacia por ‘engano’ depois de ser abordada saindo da casa de uma amiga. “Fui parada numa dura, saindo da casa da minha amiga Dani no Vidigal. Revistaram minha bolsa, não acharam nada e me trouxeram para a delegacia”, contou ela ao site ‘Quem Online’. Os policiais do caso foram autuados por abuso de autoridade.

Seu Jorge foi muito discriminado durante a temporada que passou na Itália

O cantor e ator Seu Jorge revelou que foi muito discriminado durante a temporada que passou na Itália para filmar o longa ‘A Vida Marinha com Steve Zissou’. “Não volto lá nunca mais. O italiano é racista. Eles têm sérios resquícios da colonização que sofreram: não aprenderam a lidar com outras etnias. Me maltrataram muito. Lá, percebi que, por ser negro, não era brasileiro, era da África, da Somália. No Brasil, isso também é forte ainda, viu?”, contou ele ao jornal ‘Extra’.

Preta Gil irei até o fim contra esse deputado, racista

Em março de 2011, em entrevista ao programa “CQC”, da TV Bandeirantes, o deputado Bolsonaro respondeu que não discutiria “promiscuidade” ao ser questionado por Preta Gil sobre como reagiria caso o filho namorasse uma mulher negra. “Advogado acionado, sou uma mulher negra, forte e irei até o fim contra esse deputado, racista, homofóbico, nojento”, escreveu a cantora no Twitter após a resposta do parlamentar. Sobre o caso do jogador Daniel Alves, Preta desabafou no Facebook: “Fiquei orgulhosa com a atitude do Daniel Alves, ele deu uma banana para o preconceito e mostrou que de macaco não tem nada. Ele foi muito humano. Estou vendo o movimento da banana e respeito quem aderiu, pois, tenho certeza que foi de coração. Mas não sou macaca, eu tenho minha própria opinião, sou negra com muito orgulho! Racismo é crime, cadeia neles!”.

Gaby Amarantos rolou uma parada meio de racismo

“Quando era garota, queria fazer balé e tinha uma escola muito tradicional de balé. A minha mãe foi até lá para tentar me inscrever e rolou uma parada meio de racismo. Não pude participar. Fiquei meio frustrada com isso e triste porque queria muito ser dançarina. Não permitiram que eu me matriculasse por ser negra. Era uma escola mais elitizada e a minha mãe, na inocência, pensou: ‘A minha filha quer e vou lá perguntar como é’. Eu estava junto e fiquei meio frustrada com a dança por causa do preconceito. Era garotinha, tinha uns 4 ou 5 anos. Mas se tivesse me dedicado desde cedo talvez tivesse até um corpo diferente porque também queria fazer ginástica olímpica. Talvez fosse mais preparada para a dança. Depois disso não quis fazer mais nada ligado a dança. Fiquei com aquele trauma”, contou a cantora Gaby Amarantos à revista ‘Raça’.

Jonathan Azevedo foi abordado pelo segurança

O ator Jonathan Azevedo também já sofreu com racismo. Quando estava com a namorada em um shopping do Rio de Janeiro, o ator deixou a garota na fila do cinema para atender ao telefone. Quando voltou, Jonathan foi abordado pelo segurança: “Ele disse que não era para eu pedir dinheiro para a moça. Na hora pedi para ela ficar calma e conversei com ele. Expliquei a situação com educação”, contou o ator ao ‘Diário Grande ABC’.

Informações e imagens do Yahoo.

Do  Afrokut

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Ubuntu uma alternativa ecopolítica

 

A ética do ubuntu se pronuncia contra uma interpretação ideológica capitalista da realidade. Sua filosofia nativa espiritual está em maior consonância com a Terra, suas criaturas e suas formas vivas, afirma a educadora sul-africana Dalene Swanson

Reconhecido como “um sistema de crenças, uma epistemologia, uma ética coletiva e uma filosofia humanista espiritual do sul da África”, o ubuntu é, em suma, “uma forma ética de conhecer e de ser em comunidade”. Essa é a opinião da doutora em Educação nascida na África do Sul e hoje residente no Canadá, Dalene Swanson.

Professora adjunta da University of British Columbia, em Vancouver, e de Alberta, em Edmonton, ambas no Canadá,Dalene encontra no ubuntu uma das formas de “humanismo africano”. Mas, diferentemente da filosofia ocidental derivada do racionalismo iluminista, “o ubuntu não coloca o indivíduo no centro de uma concepção de ser humano”: “A pessoa só é humana – explica – por meio de sua pertença a um coletivo humano; a humanidade de uma pessoa é definida por meio de sua humanidade para com os outros”.

O ubuntu, afirma Dalene, “é uma expressão viva de uma alternativa ecopolítica” e também “a antítese do materialismo capitalista”. Mas hoje, diz, a industrialização, a urbanização e a globalização crescentes ameaçam corromper esse modo de ser africano tradicional, pois o ubuntu se posiciona “contra essa interpretação ideológica da realidade por meio de uma filosofia nativa espiritual que está em maior consonância com a Terra, suas criaturas e suas formas vivas, e isso diz respeito a toda a humanidade em toda parte”.

Dalene Swanson é professora adjunta da Faculdade de Educação das University of British Columbia, em Vancouver, e de Alberta, em Edmonton, Canadá. Nascida na África do Sul, é membro associada do Centre for Culture, Identity and Education da University of British Columbia. É doutora em Educação pela University of British Columbia, com a pesquisa Voices in the Silence: Narratives of disadvantage, social context and school mathematics in post-apartheid South Africa. Sua tese lhe garantiu diversos prêmios de excelência, dentre eles o Canadian Association of Curriculum Studies Award de 2005; o prêmio Ted T. Aoki, do mesmo ano; e o American Educational Research Association Award de 2006. Dentre outras publicações, é autora do capítulo Where have all the fishes gone?: Living ubuntu as an ethics of research and pedagogical engagement, do livro In the Spirit of ubuntu: Stories of Teaching and Research [No espírito do ubuntu: Histórias de ensino e pesquisa] (Sense Publications, 2009).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Fala-se do ubuntu como uma noção filosófica, um conceito abstrato, um fundamento ético ou uma ideologia nacionalista africana. Afinal, o que é ubuntu?

Dalene Swanson – Ubuntu é um sistema de crenças, uma epistemologia, uma ética coletiva e uma filosofia humanista espiritual do sul da África. Dentre as quatro categorias que você menciona na pergunta, o ubuntu é mais um fundamento ético coletivo (ou um sistema de crenças) do que qualquer outra coisa, embora também seja considerado uma forma de filosofia e epistemologia africanas nativas. É uma forma ética de conhecer e de ser em comunidade. Nesse sentido, é uma forma de humanismo africano. É muito menos um conceito abstrato do que uma expressão coletiva cotidiana de experiências vividas, centradas em uma ética comunitária do que significa ser humano.

Em Swanson (2007) , eu o descrevi da seguinte maneira: “Ubuntu é uma abreviação de um provérbio isiXhosa da África do Sul, proveniente de Umuntu ngumuntu ngabantu: uma pessoa é uma pessoa por meio de seu relacionamento com outros. O ubuntu é reconhecido como a filosofia africana do humanismo, ligando o indivíduo ao coletivo através da ‘fraternidade’ ou da ‘sororidade’. Ele dá uma contribuição fundamental às ‘formas nativas de conhecer e ser’. Com ênfases históricas diversificadas e (re) contextualizações ao longo do tempo e do espaço, é considerado uma forma espiritual de ser no contexto sociopolítico mais amplo do sul da África. Essa abordagem não é apenas uma expressão de uma filosofia espiritual em seu sentido teológico e teórico, mas uma expressão da vivência cotidiana. Isto é, uma forma de conhecimento que fomenta uma jornada rumo a ‘tornar-se humano’ (VANIER, 1998)  ou ‘que nos torna humanos’ (TUTU, 1999) , ou, em seu sentido coletivo, uma maior humanidade que transcende a alteridade de todas as formas” (p. 55).

IHU On-Line – Sendo o ubuntu, portanto, uma filosofia do humanismo africano, qual o significado e o valor do ser humano dentro desse contexto?

Dalene Swanson – Diferentemente da filosofia ocidental derivada do racionalismo iluminista, o ubuntu não coloca o indivíduo no centro de uma concepção de ser humano. Este é todo o sentido do ubuntu e do humanismo africano. A pessoa só é humana por meio de sua pertença a um coletivo humano; a humanidade de uma pessoa é definida por meio de sua humanidade para com os outros; uma pessoa existe por meio da existência dos outros em relação inextricável consigo mesma, mas o valor de sua humanidade está diretamente relacionado à forma como ela apoia ativamente a humanidade e a dignidade dos outros; a humanidade de uma pessoa é definida por seu compromisso ético com sua irmã e seu irmão.

IHU On-Line – Quais são as origens culturais e históricas do ubuntu?

Dalene Swanson – O ubuntu tem sido uma expressão vivida de uma filosofia coletiva ética entre os povos sul-africanos há séculos. Ele também tem expressões linguísticas e vividas em outros povos africanos mais ao norte. Nesse sentido, é uma das normas culturais mais poderosas e universais que vinculam as pessoas em todo o continente e transcende línguas, tribos e locais como uma ética humana coletiva.
Em Swanson (2007), afirmei: “Da forma como cheguei a entender o conceito, o ubuntu nasce da filosofia de que a força da comunidade vem do apoio comunitário e de que a dignidade e a identidade são alcançadas por meio do mutualismo, da empatia, da generosidade e do compromisso comunitário. O adágio de que “é preciso uma aldeia inteira para criar uma criança” está alinhado com o espírito e a intenção do ubuntu. Assim como o apartheid ameaçava corroer esse modo de ser africano tradicional – embora, em alguns casos, ele ironicamente o fortaleceu ao galvanizar o apoio coletivo e ao criar solidariedade entre os oprimidos –, da mesma forma a industrialização, a urbanização e a globalização crescentes ameaçam fazer o mesmo (p. 53-54)”.

IHU On-Line – Quais aspectos o ubuntu pode ajudar a aprofundar na ética ocidental? O que ele pode ensinar a outras tradições e culturas?

Dalene Swanson – Este é um ponto crucial. Vivemos em uma era de globalização econômica neoliberal profundamente perturbadora. Nossas pautas de desenvolvimento foram sequestradas por esse modelo econômico que se apresenta como a forma “certa” ou única de promover o desenvolvimento. Moldado por relações capitalistas de produção, esse modelo é subscrito pelo materialismo, pelo individualismo e pela competição, e normaliza uma elite rica sobre os pobres privados de direitos (em que a raça, a classe, a nacionalidade, o gênero, a etnia e o credo estão, na maioria das vezes, envolvidos diferencialmente). Para maximizar os lucros, pensa-se que algo tem de ser explorado. Em termos geopolíticos, isso assume a forma de uma subclasse humana, mas, em termos ecológicos, também inclui a devastação do meio ambiente em sua esteira. O discurso prevalecente apoiaria isso como um direito e uma exigência necessária da segurança econômica nacional.

Uma ética do ubuntu se pronunciaria contra essa interpretação ideológica da realidade por meio de uma filosofia nativa espiritual que está em maior consonância com a Terra, suas criaturas e suas formas vivas, e isso diz respeito a toda a humanidade em toda parte. Visto que o princípio central do ubuntu é o respeito mútuo, ele está em consonância com a epistemologia africana de modo mais geral, que é circular em sua compreensão e, consequentemente, está mais em harmonia ecológica com a Terra do que a epistemologia do racionalismo ocidental, que é linear, exploradora e insustentável. Portanto, o ubuntu tem uma contribuição crítica a dar não só para uma filosofia nativa interconectada globalmente, mas como uma abordagem contra-hegemônica a uma cosmovisão globalizante que exalta a riqueza material às custas da dignidade humana e da sustentabilidade ecológica. 

Discursivamente, a globalização econômica torna as alternativas não existentes. O ubuntu, como contribuição para uma filosofia nativa, é uma expressão viva de uma alternativa ecopolítica. Em um mundo crescentemente movido a vigilância, o futuro dos direitos humanos (e ecológicos), da dignidade humana e da sobrevivência de nosso planeta em termos amplos dependem de noções filosóficas e ideológicas nativas como o ubuntu.

IHU On-Line – Como a ética do ubuntu se relaciona com a noção africana de comunidade, autonomia e descolonização?

Dalene Swanson – O ubuntu é central para uma noção de comunidade, não em um sentido simplista de “comunitarismo primitivo”, mas comunidade em termos de solidariedade com os estão sendo oprimidos e cuidado e preocupação sinceros pelo próximo, independentemente de classe, casta, credo ou circunstância. Essa é uma ética de responsabilidade pelo “Outro” em termos de ubuntu, e testemunhar ou participar da diminuição da humanidade do outro equivale à diminuição de sua própria humanidade.

Você menciona a palavra “autonomia”. Não creio que este seja um critério crucial do ubuntu. A autonomia sugere uma separação de alguma outra coisa. Se nós respeitamos a humanidade do outro, de qualquer outro, não podemos estar separados de sua humanidade. O ubuntu sugere que nós estamos sempre inextricavelmente conectados com outro ser humano – todos os outros seres humanos, que definem a nossa própria humanidade. Suponho que você considere que a “autonomia” entre em jogo no sentido de sugerir solidariedade. Sim, o ubuntu teve certa importância na solidariedade antiapartheid na África do Sul. Ser solidário com outro ser oprimido, nesse sentido, constituiria um envolvimento com o ubuntu. E, como extrapolação disso, ele tem muito a ver com a descolonização. Dessa forma, sua importância para com a descolonização não tem tanto a ver com a resistência a um poder colonial em uma frente nacional, como tem sido o legado da África, mas agora também a novas formas de colonialismo através da globalização econômica neoliberal e uma agenda de desenvolvimento cuja estrutura ideológica é definida dentro dos moldes político-econômicos dos poderes imperiais.

Creio que é preciso ser cuidadoso para não homogeneizar “a sociedade africana” e falar dela inteiramente em termos de “déficit”. Nem toda a sociedade africana é marcada por “violência e pobreza”. Essa terminologia também sugere que as sociedades não africanas talvez não sejam marcadas por violência e pobreza, ou o sejam menos. Há muita violência na América do Norte, por exemplo. A natureza e a extensão podem ser diferentes, mas o capitalismo pode ser uma ideologia muito violenta. Embora uma parte dessa violência talvez seja simbólica, ela é, não obstante, altamente destrutiva e cúmplice na negação da dignidade e dos direitos de muitos.

A África também tem muito a se orgulhar em termos de sua beleza e presença, mas também da beleza, resiliência, compaixão e humanidade de muitos de seus povos. Além disso, há muitas profundas contribuições e inovações epistemológicas históricas e contemporâneas que vieram e que estão vindo da África. Em muitos casos, ela também ostenta sofisticação e criatividade industrial e tecnológica, embora isso raramente seja reconhecido através das lentes dos poderes dominantes e dos discursos hegemônicos.

Não obstante, voltando à sua pergunta, segue-se o que escrevi em Swanson (2007), a respeito do papel do ubuntu na Comissão de Verdade e Reconciliação na África do Sul pós-apartheid: “O ganhador do prêmio Nobel, o arcebispo Desmond Mpilo Tutu , que, em 1995, tornou-se o presidente da Comissão de Verdade e Reconciliação na África do Sul pós-apartheid, era um vigoroso defensor da filosofia e do poder espiritual do ubuntu na recuperação da ‘verdade’ por meio de narrativas das atrocidades da era do apartheid. Ele também o viu como necessário nos processos mais importantes e subsequentes de perdão, reconciliação, transcendência e cura que surgem por meio do processo catártico de dizer a verdade. Nesse sentido, o alcance das noções de ‘verdade’ com relação ao mandato da Comissão de Verdade e Reconciliação superava uma noção forense de ‘descoberta da verdade’ para incluir três outras noções de busca da verdade que abrangiam a verdade pessoal ou narrativa, a verdade social ou dialógica e a verdade curativa ou restauradora (MARX, 2002, p. 51) . Uma percepção da epistemologia africana ressoa por essas postulações da ‘verdade’ em sua formulação e exposição. Como linha filosófica da epistemologia africana, o ubuntu foca as relações humanas, atentando para a consciência moral e espiritual do que significa ser humano e estar em relação com um Outro. Isso se expressa no anúncio da Comissão de que ele ‘desloca o foco primordial do crime, passando da violação das leis ou infrações contra um Estado sem rosto para uma percepção do crime como violações contra seres humanos, como dano ou mal feito a outra pessoa’ (apud Marx, 2002, p. 51). Mais uma vez, o imperativo da busca da verdade por parte da Comissão é sustentado por uma concepção da epistemologia africana e do ubuntu em sua incorporação da verdade pessoal ou narrativa, da verdade social ou dialógica e da verdade curativa ou restauradora (p. 53)”.

IHU On-Line – Em uma sociedade marcada pela violência e pela pobreza como a africana, quais são as contribuições e os limites da ética do ubuntu?

Dalene Swanson –

IHU On-Line – A senhora define o ubuntu como “humble togetherness”, intimidade humilde, estar juntos em humildade. Qual o significado dessa definição para a relação entre o indivíduo e a sociedade em geral?

Dalene Swanson – Cunhei o termo “humble togetherness” para exemplificar como o ubuntu atua não através de relações de poder, em que uma pessoa é superior a outra e mostra compaixão ou oferece ajuda de forma patriarcal ou paternalista, mas através do ato de se tornar humilde diante de outra pessoa, de ver o outro como uma pessoa igual, que contribui e é digna, que tem uma presença na qual nossa própria humanidade se reflete.

Trata-se de uma conexidade abnegada, voltada para fora, para o bem-estar de outra pessoa e o seu reconhecimento como pessoa. É uma forma de mutualismo em que o orgulho de si mesmo depende inteiramente de se sustentar a dignidade do outro ou da comunidade. Falei sobre como o ubuntu sustenta uma metodologia de pesquisa mais reflexiva por meio de um conceito de “estar juntos em humildade” e sobre como ela contribui para uma pedagogia e prática da educação e da vida em alguns de meus artigos e capítulos de livros, particularmente em Swanson (2007), (2009a)  e (2009b) .

IHU On-Line – Em que aspectos o ubuntu ajudou a forjar a sociedade, a política e a economia sul-africanas? Onde ainda é preciso melhorar?

Dalene Swanson – Toquei em algumas dessas questões ao fazer referência à Comissão de Verdade e Reconciliação. O ubuntu também tem sido usado em nível de governo para incentivar a formação da nação, curar as cicatrizes do apartheid e a desconfiança entre as raças que aquele regime engendrou. Embora isso tenha sido até certo ponto bem-sucedido em uma frente, o problema é que foi implementado de cima para baixo, não sendo uma abordagem organizacional crescente que parte das bases. Os limites dessa abordagem podem ser vistos nas poucas semanas de violência xenófoba do ano passado contra refugiados e imigrantes de outros países africanos que vivem e trabalham na África do Sul.

Nesse contexto, o ubuntu parecia se aplicar apenas aos companheiros “sul-africanos” dentro da “nação do arco-íris” e não aos “estrangeiros” – um sinal de uma formação de nação que deu muito errado. Pode-se sustentar que, no primeiro caso, há uma discordância entre as bases filosóficas do ubuntu que promovem a fraternidade e a sororidade universais, extensivas a toda a humanidade, e o conceito de uma “nação” que invoca fronteiras e diferencia as pessoas (e sua humanidade) de acordo com a cidadania, garantindo direitos a alguns e não a outros. Eu discuto esse problema com maior profundidade em Swanson (2007).
Outro aspecto que pode ser destacado é que o ubuntu assinala a antítese do materialismo capitalista. Com o advento contínuo da globalização econômica e mediante a adesão a um modelo de desenvolvimento moldado pelo capitalismo, a África do Sul vem se tornando cada vez mais materialista, de tal modo que o abismo que separa “os que têm” e “os que não têm” aumentou consideravelmente, mesmo que as configurações raciais dessa hierarquia tenham mudado até certo ponto. Isso representa uma ameaça para o ubuntu. Poder-se-ia sustentar que é somente por meio da força do ubuntu e de um conjunto coletivo de valores e de responsabilidades que honrem a humanidade, a dignidade e os direitos igualitários dos outros que o status quo poderia ser superado – talvez uma nova luta pela libertação.

IHU On-Line – Qual a relação entre o ubuntu e a transcendência, em sentido teológico?

Dalene Swanson – Acho que se pode ver isso na forma como o arcebispo Desmond Tutu deu ao ubuntu uma interpretação especificamente teológica quando presidiu a Comissão de Verdade e Reconciliação . Empregado como um fórum espiritual para a recuperação da verdade e para fomentar as condições para o arrependimento e o perdão, o ubuntu foi mesclado com o cristianismo (com o qual estaria estreitamente aliado em termos dos princípios cristãos autossacrificadores do “ama teu próximo como a ti mesmo”) para levar a efeito um ethos para a reconciliação e a transcendência.

Isso não era incomum, pois, em boa parte do contexto africano, a filosofia espiritual africana está integrada ou é compatibilizada com a ética cristã. No fim das contas, entretanto, lealdades e alianças são uma questão de interpretação. O ubuntu continua sendo essencialmente uma filosofia viva que é praticada nas vidas de pessoas comuns em uma miríade de contextos em todo o continente, mostrando ‘humanitariedade’, solidariedade, compaixão e uma sabedoria espiritual coletiva que oferece dignidade, respeito e humanidade em sua expressão.

Por: Por Moisés Sbardelotto | Tradução Luís Marcos Sander

Via Instituto Humanitas Unisinos – IHU

Imagem: Afrokut


https://afrokut.com.br/blog/o-que-e-ubuntu/

“Eu só existo porque nós existimos”: a ética Ubuntu

Para o teólogo congolês e doutor em sociologia Bas’Ilele Malomalo, toda existência é sagrada para os africanos, ou seja, há um pouco do divino em tudo o que existe. Por isso, “o Ubuntu retrata a cosmovisão do mundo negro-africano”

“Sou porque nós somos”: em uma frase, esse seria o resumo da ética ubuntu. Porém, é na construção histórica e cultural dessa ética que nasce na África, que se encontra a sua riqueza. Para o filósofo e teólogo congolês Bas’Ilele Malomalo, toda existência é sagrada para os africanos, ou seja, há um pouco do divino em tudo o que existe. Por isso, “o ubuntu retrata a cosmovisão do mundo negro-africano”.
É por isso que o suposto antropocentrismo que poderia estar por trás do ubuntu é “relativista”, segundo Malomalo, nesta entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. “O ser humano africano sabe que nem tudo depende da sua vontade”, afirma. “Esta depende também da vontade dos ancestrais, dos orixás”, em suma, do sagrado.

Por outro lado, ubuntu e felicidade são conceitos que andam juntos: “Na África, a felicidade é concebida como aquilo que faz bem a toda coletividade ou ao outro”. E quem é o meu “outro”? “São meus orixás, ancestrais, minha família, minha aldeia, os elementos não humanos e não divinos, como a nossa roça, nossos rios, nossas florestas, nossas rochas”. Dessa forma, resume Malomalo, para a filosofia africana, “o ser humano tem uma grande responsabilidade para a manutenção do equilíbrio cósmico”.

Bas’Ilele Malomalo é natural do Congo, África, e possui graduação em Filosofia pelo Grand Seminaire Fraçois Xavier – Filosoficum e em teologia pelo Instituto São Paulo de Estudos Superiores – Itesp. É mestre em ciências da religião pela Universidade Metodista de São Paulo e é doutorando em sociologia pela Universidade Estadual Paulista – Araraquara. Atualmente é pesquisador do Centro dos Estudos das Culturas e Línguas Africanas e da Diáspora Negra da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Cladin-Unesp. 

Confira a entrevista.

IHU On-Line – O que é e quais as origens do ubuntu?

Bas’Ilele Malomalo – Etimologicamente, ubuntu vem de duas línguas do povo banto, zulu e xhona, que habitam o território da República da África do Sul, o país do Mandela . Do ponto de vista filosófico e antropológico, o ubuntu retrata a cosmovisão do mundo negro-africano. É o elemento central da filosofia africana, que concebe o mundo como uma teia de relações entre o divino (Oludumaré/Nzambi/Deus, Ancestrais/Orixás), a comunidade (mundo dos seres humanos) e a natureza (composta de seres animados e inanimados). Esse pensamento é vivenciado por todos os povos da África negra tradicional e é traduzido em todas as suas línguas.
A origem do ubuntu está na nossa constituição antropológica. Pelo fato de a África ser o berço da humanidade e das civilizações, bem cedo nossos ancestrais humanos desenvolveram a consciência ecológica, entendida como pertencimento aos três mundos apontados: dos deuses e antepassados, dos humanos e da natureza.

Com as migrações intercontinentais e a emergência de outras civilizações em outros espaços geográficos, essa mesma noção vai se expressar em outros povos que pertencem às sociedades ditas pré-capitalistas ou pré-modernas. É dessa forma que se pode afirmar que essa forma de conceber o mundo, na sua complexidade, é um patrimônio de todos os povos tradicionais ou pré-modernos. Cada um expressa isso através de suas línguas, mitos, religiões, filosofias e manifestações artísticas.

Como elemento da tradição africana, o ubuntu é reinterpretado ao longo da história política e cultural pelos africanos e suas diásporas. Nos anos que vão de 1910-1960, ele aparece em termos do panafricanismo e da negritude. São esses dois movimentos filosóficos que ajudaram a África a lutar contra o colonialismo e a obter suas independências. Após as independências, estará presente na práxis filosófica do Ujama de Julius Nyerere , na Tanzânia; na filosofia da bisoité ou bisoidade (palavra que vem da língua lingala, e traduzida significa “nós”) de Tshiamalenga Ntumba; nas práticas políticas que apontam para as reconciliações nacionais nos anos de 1990 na África do Sul e outros países africanos em processo da democratização. 

A tradução da ideia filosófica que veicula depende de um contexto cultural a outro, e do contexto da filosofia política de cada agente. Na República Democrática do Congo, aprendi que ubuntu pode ser traduzido nestes termos: “Eu só existo porque nós existimos”. E é a partir dessa tradução que busco estabelecer minhas reflexões filosóficas sobre a existência. Muitos outros intelectuais africanos vêm se servindo da mesma noção para falar da “liderança coletiva” na gestão da política e da vida social.

IHU On-Line – Como um princípio ético nascido na África, que manifestações do ubuntu podemos encontrar na cultura brasileira ou afro-brasileira, tão marcada por raízes africanas?

Bas’Ilele Malomalo – É preciso voltar à história para capturar as manifestações do ubuntu em suas diásporas transatlânticas. No Brasil, a noção do ubuntu chega com os escravizados africanos a partir do século XVI. Estes trouxeram a sua cultura nos seus corpos, e ela foi reinventada a partir do novo contexto da escravidão. Por isso, falar de ubuntu no Brasil é falar de solidariedade e resistência. Como outros registros histórico-antropológicos que expressam o “ubuntu afro-brasileiro”, podemos citar os quilombos, as religiões afro-brasileiras, irmandades negras, movimentos negros, congadas, moçambique, imprensas negras.

IHU On-Line – Como podemos compreender a religião ou o sagrado por meio do ubuntu? De que forma ele tenciona a noção religioso-transcendental?

Bas’Ilele Malomalo – Para os africanos e seus descendentes, toda existência é sagrada, quer dizer, há um pouco do divino em tudo o que existe. A religião, como instituição social e sistema simbólico, apresenta-se como o espaço privilegiado de alimentação da “consciência ubuntuística”. Através de seus ritos, seus sacerdotes e adeptos a reatualizam. Os mitos, as celebrações, os cantos e encantamentos desempenham essa função de nos religar com nossos deuses, antepassados, com a comunidade, conosco mesmos, com o cosmos e a natureza. Além dos ritos sagrados, os profanos também desempenham a mesma função mística. Na África, os ritos de iniciação, de entronização dos reis ou rainhas estão sempre conectados com a ancestralidade.

IHU On-Line – Dentro da ética ubuntu, qual é o papel do ser humano e da comunidade?

Bas’Ilele Malomalo – A concepção africana do mundo é antropocêntrica. Não no sentido absolutista da filosofia iluminista ocidental, que pensa que o ser humano é o centro do mundo e que ele pode tudo e pode fazer tudo o que quiser. O antropocentrismo africano é “relativista”. Quer dizer, o ser humano africano sabe que nem tudo depende da sua vontade. Esta depende também da vontade dos ancestrais, dos orixás. Se estes revelarem, através de um sonho, de um Ifá, de um sacerdote, do seu pai ou da sua mãe, um acontecimento, será preciso prestar atenção.
Por outro lado, o antropocentrismo africano entende que uma boa prática religiosa só existe naquela que traz a felicidade para o ser humano. Como este não pode ser concebido fora das relações sociais, na África, a felicidade é concebida como aquilo que faz bem a toda coletividade ou ao outro. Os outros são meus orixás, ancestrais, minha família, minha aldeia, os elementos não humanos e não divinos, como a nossa roça, nossos rios, nossas florestas, nossas rochas. Dessa forma, para a filosofia africana, o ser humano tem uma grande responsabilidade para a manutenção do equilíbrio cósmico.

IHU On-Line – Em uma época de crise ecológica e ambiental, como o ubuntu pode nos ajudar a desenvolver uma nova relação com os demais seres não humanos?

Bas’Ilele Malomalo – Do ponto de vista filosófico, a crise planetária atual encontra suas raízes na expansão ocidental desde a Idade Média até o surgimento da modernidade. A hegemonia da “razão indolente” (Boaventura de Sousa Santos ) nas suas manifestações através do colonialismo, positivismo, racismo científico, capitalismo selvagem, tem sido o instrumento de aprofundamento dos males da nossa civilização. Esse pensamento absolutizou tanto o homem que este voltou-se contra suas divindades, contra a natureza e contra seus semelhantes. O seu “antropocentrismo absolutista” criou as condições de destruição da sua própria espécie e das espécies não humanas.

Qual é a saída que os pensamentos alternativos têm sugerido? Boaventura de Sousa Santos alega que é preciso acionar a “razão cosmopolita”; Edgar Morin  sugere o uso de uma epistemologia da complexidade; Leonardo Boff  tem sugerido a espiritualidade ecológica. É na busca da união umbilical, afirma Boff, que se encontraria a salvação da humanidade, a superação da crise ecológica atual.
Na filosofia africana, Tshiamalenga Ntumba tem interpretado o ubuntu em termos de Bisoidade. Tal prática se caracterizaria pela abertura ao diferente, encará-lo como parte de nós. Nessa direção, o mundo da fé, das divindades, dos orixás, dos ancestrais deve dialogar com o mundo dos seres humanos e não humanos (natureza/cosmos). Esse conceito vislumbra o encontro ético e político do “Nós”. Trata-se do “nós ecológico”. Para esse filósofo congolês, a existência significa uma interação entre as três dimensões da cosmovisão africana. As crises políticas, econômicas, culturais e sociais que têm afetado o continente africano, para ele, ocorrem porque o ser humano se esqueceu de cuidar do “biso” ou do “nós ecológico”.

Dessa forma, antes dos humanos cuidarem dos não humanos, precisam cuidar da sua casa. Quer dizer, rever suas práticas filosóficas e científicas dentro dos parâmetros éticos. Uma vez feito isso, poderiam ter condições de cuidar do meio em que vivem. Insisto nisso, porque há um certo pensamento ambientalista ligado à razão indolente. Muitos falam do meio ambiente para lucrar. Essa opção leva esses ativistas e cientistas a ocultar as misérias humanas. O ubuntu é uma crítica à visão simplista e interesseira. Pensar o desenvolvimento ambiental nessa perspectiva é perceber, como Boff, que deve se levar as coisas no contexto da dialética da complexidade, na qual o teológico, o antropológico e o cosmológico-ambiental dialogam sabiamente. Somos nós, os humanos, que devemos procurar o estabelecimento desse equilíbrio planetário. As responsabilidades têm que ser apuradas, e evitar o discurso da hipocrisia burguesa.

IHU On-Line – Como interpretar nossa memória, nosso passado, nossa ancestralidade a partir do ubuntu?

Bas’Ilele Malomalo – Na filosofia negro-africana, a ancestralidade é eixo do entendimento da nossa existência. É tudo aquilo que nos proporciona a vivência do nosso presente (sasa, em swahili) e nosso futuro (lobi, em lingala), tendo aqueles que pertencem ao passado (zamani, em swahili), os que nos antecederam, divindades, orixás e antepassados como ponto de leitura das duas primeiras dimensões da existência.
A vontade das divindades, geralmente, concretizam-se pelas vontade dos orixás e ancestrais presentes na sabedoria popular, nos mitos. Os sacerdotes e pessoas mais velhas vivas têm o papel de interpretá-la através dos ritos e práticas do cotidiano.

Desse ponto de vista, os mitos e ritos africanos têm por função pedagógica lembrar aos vivos o seu parentesco com os seres do mundo invisível e visível (seres humanos e seres não humanos). Todos os mitos africanos se pautam nessa lógica. Como os mitos judaicos, os mitos africanos nos informam que os seres humanos têm um pouco de divino; cada um é filho de um orixá; e um pouco da natureza. Conta um mito da criação que Oludumaré (Deus supremo) deu ao orixá Obatalá a missão de criar o ser humano, e este o fez a partir do barro (elemento da natureza). Eis a nossa irmandade planetária. A cosmovisão africana do mundo tem uma importância no sentido de contribuir para o pensamento ecológico contemporâneo.

IHU On-Line – Em uma sociedade embasada em valores ocidentais e modernos como a nossa, que questionamentos políticos, econômicos e sociais o ubuntu pode fomentar?

Bas’Ilele Malomalo – O ubuntu pertence ao pensamento alternativo, que cogita o mundo a partir da complexidade. E é oportuno reafirmar que toda filosofia carrega valores e antivalores. Para a filosofia de ubuntu, não se pode falar de economia e política sem levar em consideração os valores da comunidade cósmica. Os profissionais de todos os campos da teologia, das ciências sociais e da natureza, políticos, o homem e a mulher comuns, todos devem ser ouvidos. O ubuntu luta contra os reducionismos impostos pela razão indolente no fazer política e economia. A democracia participativa em todos os campos é tida como um valor. A economia não se reduz ao crescimento. Este tem a ver também com o social e com o cultural. O valor de solidariedade é também importante.

IHU On-Line – Diante da violência e das desigualdades, que significado têm o perdão, a reconciliação e a compaixão para a ética ubuntu?

Bas’Ilele Malomalo – É preciso dizer, primeiro, que as vítimas da violência e das desigualdades são aquelas que compõem a classe dos excluídos por motivos raciais, de gênero, de opção sexual ou religiosa. Os seres não humanos também pertencem a essa classe dos dominados pelo fato de interagir com as classes dominantes, agentes da razão indolente, de uma forma desigual. Com isso, estou querendo afirmar a historicidade da violência e das desigualdades.

Olhando para a história africana e da sua diáspora brasileira, quero citar alguns casos em que o ubuntu se materializou ou foi tensionado para ser traduzido em termos de perdão, reconciliação e compaixão.
A África do Sul, após a libertação de Mandela e o fim do apartheid, colocou-se como o exemplo histórico da tradução do ubuntu no projeto político multicultural. Esse país, através de suas lideranças políticas, religiosas e sociais, soube fazer uso dos princípios éticos dessa filosofia através do estabelecimento da Comissão da Verdade e Reconciliação. Tratava-se da recriação de um espaço de diálogo da comunidade de inspiração nos “palabres africanos”. Palabre é uma palavra francesa, que se refere aos espaços de mediação de conflitos da comunidade, que contam com a habilidade do uso da palavra por parte dos mais velhos ou sábios. Não se tratava de um espaço de condenação dos torturadores ou racistas, mas sim de um encontro do povo sul-africano consigo mesmo, com seus problemas do passado, com o seu presente e com o seu futuro a ser construído. Um encontro com a sua memória de dor, sofrimento e de esperança. Após esse processo, esse país se define hoje como uma Nova África do Sul, que se reconhece como um país multicultural, onde brancos e negros podem conviver juntos. Dessa forma, o zamani [passado] de sofrimento se transformou num sasa-lobi [presente-futuro] de esperança.

Em 2001, com a Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância Correlata (31 de agosto a 8 de setembro de 2001), em Durban, na África do Sul, as vítimas do escravismo colonial europeu, africanos e seus descendentes, exigiram aos Estados europeus, americanos e africanos um pedido de perdão pelos atos cometidos. Os Estados africanos através do representante da União Africana o fizeram, mas da parte dos dirigentes dos outros Estados houve resistência. Pois muitos não queriam assumir a sua responsabilidade histórica. Afinal de contas, a conferência condenou a escravidão como crime contra a humanidade.

Esses dois exemplos devem inspirar todas as sociedades multiculturais que pretendem propiciar um destino melhor para todos os seus cidadãos. Os países africanos que ainda brigam por causa da hegemonia política ou da gestão dos recursos naturais; os países da América Latina, como o caso do Brasil, onde as sequelas do escravismo e do racismo dividem, proporcionando aos seus cidadãos o acesso aos direitos políticos, econômicos, sociais e culturais de forma diferenciada, devem se servir dos exemplos citados, para que o ubuntu se torne uma profecia da esperança cumprida.
No caso dos países africanos em situação das ditaduras militares, da democracia de fachada ou da democracia fraca e do pós-conflito, cabe apelar ao ubuntu como uma nova forma de se pensar e fazer política. Governar, nesse sentido, significa ouvir os opositores, presentes em outros partidos políticos, nas organizações da sociedade civil, nas aldeias para a elaboração de um projeto nacional coletivo. Perdoar significa também fazer justiça em relação às mulheres vítimas de estupros, de genocídios, de matanças por razões de egoísmo dos senhores de guerras africanas. Reconciliação, nesse contexto, significa esclarecimento perante a comunidade dos problemas que afetam as nações, e a partilha das responsabilidades. É uma volta à memória ancestral, aos valores africanos do passado, mas atualizados no presente, e o seu uso no exercício de fazer a política na modernidade. Nesse aspecto, a legitimidade dos dirigentes se fundamenta na prática da lealdade, na busca do bem-estar do povo, e não o contrário.

IHU On-Line – Em um contexto social como o brasileiro, como a ética ubuntu pode contribuir na situação contemporânea?

Bas’Ilele Malomalo – Uma coisa que o ubuntu tem para nos ensinar, nesse momento histórico de experimentação de políticas públicas de ações afirmativas e cotas, é a consideração dos elementos de perdão, reconciliação e compaixão. Para mim, perdoar significa antes de tudo a identificação das causas de nossos males. Os males, que justificam a situação do subdesenvolvimento da população negra quando comparada com a branca, têm nomes: o nosso passado escravista e o racismo contemporâneo. Há outros fatores, mas esses dois são suficientes. Para a teologia afro-brasileira, eles são identificados aos pecados.
As instituições e as pessoas reprodutoras dessas práticas têm que assumir suas responsabilidades perante Deus e a humanidade. Num país de maioria cristã como o Brasil, exercer a compaixão significa colocar-se no lugar do outro. As Igrejas cristãs como parte da sociedade civil brasileira devem exercer o seu papel profético ao lado das igrejas, comunidades, pastorais negras, em vez de ficar “em cima do muro”. A Igreja latino-americana dos anos 1970 precisa voltar. O grito de Maranata aqui significa que as comunidades religiosas têm o dever ético de fazer ouvir a sua voz e interagir no debate atual sobre as políticas públicas para negros e indígenas.

Reconciliação na perspectiva do ubuntu, no Brasil atual, é um encontro entre nós mesmos, com o nosso passado de dor, resistência e esperança. É um encontro entre nós mesmos como povo brasileiro. Um povo marcado pela miscigenação emancipatória e não um falso discurso de miscigenação colonialista. A diferença é que o primeiro discurso assume a pluralidade como valor, já o segundo o nega e o encara como uma ameaça.

Por Moisés Sbardelotto

Via Instituto Humanitas Unisinos – IHU

Imagem: Afrokut


https://afrokut.com.br/blog/o-que-e-ubuntu/

Cinco evidências que Jesus não era branco

Jesus era Negro?

A questão da cor de Jesus sempre foi um tema polêmico, evocando fortes paixões tanto a favor como contra a negritude e branquitude de Cristo. Tem uma brincadeira que os negros norte-americanos costumam dizer sobre três maneiras que prova que Jesus era Negro:

  • Ele chamou todos de  irmãos,
  • Gostava do Evangelho, e
  • Ele não poderia ter um julgamento justo.

Brincadeira  à parte, o fato é que existe fortes evidencias bíblicas que Jesus não era branco. Vejamos 5 delas:

 1 .   Jesus nasceu em Africa.

Os Evangelhos dizem de maneira explícita que Jesus nasceu em “Belém de Judá, no tempo do rei Herodes” (Mt 2,1 cfr. 2, 5.6.8.16), (Lc 2, 4.15), (Jo 7, 40-43). Nos tempos antigos, incluindo o tempo de Jesus, Belém de Judá era considerado parte de  África. Até a construção do Canal de Suez, Israel fazia parte da África. Esta visão haveria de perdurar até 1859, quando o engenheiro francês Ferdinand de Lesseps pôs-se a construir o Canal de Suez. A partir daí, foi a África separada não somente geográfica, mas sobretudo histórica, cultural e antropologicamente do que hoje chamamos Oriente Médio. Aquela milenar extensão da África passa a figurar nos mapas como se fora Ásia.

 2 .  Jesus tinha presença negra na linhagem familiar

A genealogia de Jesus foi misturada com a linha de Cam desde os tempos passados em cativeiro no Egito e na Babilônia. Nos antepassados de Jesus através de Cam, lado feminino desta mistura, há cinco mulheres mencionadas na genealogia de Jesus Cristo ( Tamar, Raabe, Rute, Bateseba e Maria) (Mateus 1:1-16). As primeiras senhoras mencionadas eram de descendência de Cam. Assim, Jesus pode ser aclamado etnicamente pelos povos semitas e descendentes de Cam.

 3 .  Jesus era da tribo de Judá, uma das tribos Africanas de Israel.

Ancestrais masculinos de Jesus vêm da linha de Sem (miscigenados). No entanto, a genealogia de Jesus foi misturada com a linha de Cam desde os tempos passados em cativeiro no Egito e na Babilônia. O antepassado de Jesus através de Cam é narrado em Gênesis 38: então Tamar, a mulher Cananéia (Negra) fica grávida de Judá, e dá à luz aos gêmeos Zerá e Perez, formando a Tribo de Judá, antepassados do rei Davi e de José e Maria, os pais terreno de Jesus.

 4 .  Jesus se escondeu entre os Negros.

Não foi por acaso que Deus enviou a Maria e José para o Egito com o propósito de esconder o menino Jesus do rei Herodes (Mateus 2:13). Ele não poderia ter sido escondidos no norte da África se fosse um menino branco. Não por proteção militar já que nessa época o Egito era uma província romana sob o controle romano, mas porque o Egito ainda era um país habitado por pessoas negras. Assim, José, Maria e Jesus teriam sido apenas mais uma família negra entre os negros, que tinham fugido para o Egito com a finalidade de esconder Jesus de Herodes, que estava tentando matar o menino. Se Jesus fosse branco, loiro de olhos azuis, teria sido difícil para ele e sua família se esconder entre os egípcios negros sem ser notado. O povo hebreus era muito parecido com povo egípcios, caso contrario  teria sido difícil reconhecer uma família hebraica entre os egípcios Negros. Foi no Egito que o povo de  Israel  teve seu auge da negritude, Setenta israelitas entraram no Egito e lá ficaram  durante 430 anos, trinta anos os israelitas foram hóspedes, e 400 anos  cativos no Egito, eles e seus descendentes se casaram com não-israelitas, chegando a mais de 600.000 homens, mulheres e crianças. Saíram do Egito uma multidão misturada. Etnicamente, os seus antepassados eram uma combinação de afro-asiáticos.

 5 .  Jesus era semelhante pedra de jaspe e de sardônio.

Em apocalipse a Bíblia continua mostrando a negritude de Jesus. Ele é chamado o Cordeiro de Deus segundo as Escritura Sagrada, com seu cabelo lanoso, sendo comparado a lã de cordeiro, e os pés com a cor de bronze queimado (Apocalipse 1:15), com uma aparência semelhante pedra de jaspe e de sardônio (Apocalipse 4:3), que são geralmente pedras amarronzadas. As cores de jaspe e sardônio não são únicas e absolutas, são diversas cores.

Sei que para a experiência de fé de muitos cristãos a cor de Jesus não é relevante, também sei que muitos “cristãos” dizem que se Jesus não fosse branco eles não seriam cristãos. O importante da revelação dessas evidencias é que elas não são percebidas pelos leitores da Bíblia. A fim de que a nossa visão do Jesus histórico se torne mais negra, é mister que comecemos por derrubar alguns mitos tidos como dogmas. Acredito que existam outras evidencias que poderia citar neste texto, mais ficamos por enquanto com essas cincos. O texto continua aberto para receber outras evidencias e questionamentos dessas. Sinta-se à vontade para colaborar e enriquecer esse artigo.

Por Hernani Francisco da Silva – do Afrokut

10 frases da Consciência Negra de ativistas negros e negras

O dia da CONSCIÊNCIA NEGRA   é para conscientização de todas as pessoas de que as culturas africanas são partes integrantes e imprescindíveis da formação do povo brasileiro. Esse dia deve ajudar a nós brasileiros a nos conscientizarmos de que somos um povo formado de muitos povos e de muitas culturas.

Para a nossa reflexão segue 10 frases da Consciência Negra de ativistas negros e negras brasileiros

1 – Consciência Negra é educação do olhar

2- Assim alcançaremos a HUMANITUDE

3 – O 20 de novembro é este momento de fazer isto em relação ao racismo

4 – O racismo é um crime perfeito no Brasil

5 – Pela consciência da riqueza da diversidade racial

6 – A sociedade brasileira é que tem problema

7 – Um protesto que denuncia a falsa abolição da escravatura

8 – Zumbi se espraia

9 – Continuidade à grande luta de Zumbi dos Palmares

10- Zumbi como algo mais representativo que 13 de maio

Fonte:  Afrokut


Consciência Negra

18 pessoas negras agraciadas com o Prêmio Nobel

O Prêmio Nobel foi instituído por Alfred Nobel, químico e industrial sueco, inventor da dinamite, o Prêmio Nobel foi concedido pela primeira vez em 1901. Os prêmios são entregues anualmente, no dia 10 de Dezembro, aniversário da morte do seu criador, as pessoas que fizeram pesquisas importantes, criaram técnicas pioneiras ou deram contribuições destacadas à sociedade. Os prêmios Nobel foram concedidos a mais de 800 pessoas, dos quais 18 foram pessoas negras.

Os negros têm sido os destinatários de três dos seis prêmios: Literatura, Paz e Economia. O primeiro ganhador negro, Ralph Bunche, foi agraciado com o Prêmio Nobel da Paz em 1950. O mais recente, o romancista Abdulrazak Gurnah, da Tanzânia, recebeu o Prêmio Nobel de Literatura de 2021.

Três laureados negros:- Anwar Sadat , Barack Obama e Ellen Johnson Sirleaf – foram presidentes de seus países quando foram agraciados com o prêmio.


Segue lista de negras e negros ganhadores do Nobel:

 


Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut


 

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