Religião e educação: o posicionamento das igrejas cristãs protestantes em relação às questões dos negros no brasil

As igrejas cristãs protestantes, popularmente denominadas de igrejas evangélicas, desde que foram introduzidas na sociedade brasileira, têm se mostrado incessíveis, omissas e silenciosas no que se refere às questões das relações étnico-raciais no país, isto é, no que diz respeito ao lugar marginal em que a população negra se encontra na sociedade brasileira desde o período escravista. Segundo argumenta Alcântara (2011, p.87), essas igrejas, “tanto históricas quanto pentecostais, contribuíram para que a situação de discriminação e marginalização dos negros no Brasil fosse por tanto tempo perpetuadas”.

Nessa perspectiva, o presente artigo tem como objetivo tecer uma análise teórico-crítica acerca do posicionamento das Igrejas Cristãs Protestantes em relação às questões do negro no país e como a escola pode contribuir com a desconstrução de uma sociedade racista. O texto toma como base, para tal análise, os estudos teóricos de autores como: Branchini (2008), Alcântara (2011), Frizotti (1998), Silva (2011) e CICM (1998), os quais discorrem sobre como as igrejas cristãs protestantes têm se posicionado, ao longo da história, aceca das questões étnico-raciais; Santos (2012a, 2012b) e Martins (2008) que abordam a questão educacional neste contexto, entre outros autores que corroboram com a discussão em questão.

Parte-se da compreensão que se trata de uma discussão que, devido à problemática em torno das culturas de matrizes africanas, tecidas e resistidas nos terreiros de candomblé, reflete a dificuldade e resistência dos cristãos em lidar com as questões étnico-raciais nos espaços de educação, não apenas nas escolas confessionais, mas também nas escolas não confessionais e em todos os espaços que estes se façam presentes. Também da premissa de que lidar com a história e cultura africana e afro-brasileira no currículo e cotidiano escolar tem sido cada vez mais difícil devido à problemática questão religiosa presente no espaço educacional. Dificuldade e resistência que tem se constituído em um empecilho para a inclusão, valorização e respeito à História e Cultura Africana, Afro-Brasileira e Indígenas no currículo e no cotidiano das salas de aulas das escolas brasileiras, como orienta a Lei 10.639/033 e a Lei 11.645/084.

Cabe destacar, no entanto, que não é a nossa intenção aqui apontar culpados pelos estigmas e as situações desiguais em que se encontra a população negra no país desde o período escravista. A nossa pretensão é trazer novas reflexões críticas que ampliem o debate sobre como as igrejas evangélicas têm se posicionado diante a situação marginal do negro no Brasil ao longo da história. Como sinalizado no primeiro parágrafo e veremos no decorrer deste estudo, tais igrejas, desde a sua implantação na sociedade brasileira, têm contribuído para a discriminação e marginalização da população negra no país. É nossa pretensão também discutir criticamente acerca da resistência dos cristãos evangélicos em lidar com a história e cultura africana e afro-brasileira dentro dos espaços educacionais, sejam eles confessionais ou não confessionais.

Contudo, antes de adentrarmos a discussão central deste estudo, é importante ressaltar que, desde a década de 1970, militantes negros/as evangélicos/as têm se movimentado em grupos organizados para discutir sobre as desigualdades étnico-raciais no Brasil. Preocupados com o lugar marginal que a população negra se encontra na sociedade brasileira, em particular com o silenciamento e omissão das igrejas cristãs para com as questões dos negros no país, têm cobrado que estas se posicionem a respeito de questões como racismo, escravidão, segregação, preconceito, discriminação racial, entre outras.

No seu movimentar, os/as militantes negros/as evangélicos/as também reivindicam que as igrejas cristãs protestantes adotem medidas de ações afirmativas dentro dos seus templos, escolas e faculdades, a exemplo de bolsas de estudos para estudantes negros/as. Promovendo, dessa forma, a igualdade de direitos e de oportunidades, pois só assim a igualdade cristã efetivar-se-á de fato dentro das igrejas cristãs protestantes e nas suas instituições de ensino. Movimentar esse que se constitui, hoje, num Movimento Negro Evangélico consolidado no país. E, assim como o Movimento Negro tradicional, busca a desconstrução do Mito da Democracia Racial na sociedade brasileira e, em particular, dentro das igrejas evangélicas.

Autores: Jurandir de Almeida AraújoDeyse Luciano de Jesus Santos

Imagem: The Atlantic


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https://periodicos.ufsc.br/index.php/interthesis/article/view/1807-1384.2017v14n3p50

Ser negro evangélico não é ser capitão do mato

Ser negra, negro e evangélico tem sido uma conjugação muito difícil! Somos a maioria dos evangélicos, e a maioria de nós é evangélica, numa Igreja liderada, ainda, por brancos.

Aí há quem ache que somos os negros errados, que negro certo é de matriz afro.

Por 4 séculos os brancos impuseram o lugar dos negros! Com todo respeito e solidariedade aos de confissão afro, nosso lugar é nossa escolha: somos evangélicos!

Aí aparecem negros evangélicos apoiando fascistas e racistas, passando a idéia de que ser negro evangélico é ser capitão do mato. Mentira!

Irmão irmã, negra e negro como eu, fiquemos firmes  na fé e na luta contra o racismo e fascismo; e na luta para ocupar nosso lugar na liderança evangélica; sempre houve capitães do mato, nós, em nome de Jesus, os venceremos, como já o fizemos na história.


Por Ariovaldo 

Ariovaldo Ramos é pastor e professor. Foi membro do Conselho de Segurança Alimentar da Presidência da República, que representou na 32ª Conferência da FAO, realizada em Roma, Itália, em 2006. É um conhecido defensor da teologia da Missão Integral, como alternativa para a igreja evangélica brasileira. Em seus ensinos estão sempre presentes valores como justiça, igualdade e equidade, valorização e oportunidades para os pobres.

Manifesto 2020 – Rede de Mulheres Negras Evangélicas do Brasil

Nós, mulheres negras cristãs, jovens e adultas oriundas de distintas tradições do protestantismo brasileiro (metodistas, assembleianas, batistas, anglicanas, pentecostais), de diferentes regiões brasileiras, levantamos nossas vozes em favor da vida de todas as mulheres negras e da população negra do Brasil.

É sob o amor, a esperança e o doce sussurro de Ruah (1) que nos movemos e somos unidade.

Somos nós, mulheres negras que mais sofremos com as reverberações de uma política pública racista e misógina. A pandemia do novo coronavírus escancarou nosso sofrimento histórico, psíquico e social e revelou a profundidade do cinismo dos que trabalham a serviço da morte e se mantém afastados do Evangelho. Como disse o Bom Mestre, “pelos frutos reconhecereis a árvore” (Mateus 7.16).

Nesse momento de medos e perdas, testemunhamos nossas irmãs, irmãos, nossas crianças e nossos velhos terem suas vidas negligenciadas pela vaidade de governantes incompetentes e perversos. Sofremos com a falta de renda e alimento. Sofremos com a violência institucional armada e assassina que adentra nossas comunidades e invade nossas casas ceifando vidas inocentes. Sofremos com ausência de saneamento, de água potável e materiais de proteção no combate às doenças endêmicas. Sofremos com a violência doméstica. Violências físicas e psíquicas que nos atingem de modo interseccional, cujas opressões raciais, de gênero, de classe, dentre outras formas de discriminações, nos atingem a nível individual e coletivo, consolidando ainda mais os processos de subalternização que são direcionados aos nossos corpos.

Desta maneira, nos agregamos em oração e denúncia e unimos nossas vozes ao movimento de luta em prol das nossas vidas e das dos nossos. Reivindicamos:

  • A ordenação aos mesmos cargos que os homens;
  • A inclusão de mulheres da Bíblia como tema das ministrações, realçando o antigo e novo testamentos;
  • A escalação de mulheres para ministrarem em cultos públicos, seminários, congressos, assembleias, reuniões etc., possibilitando também a inclusão daquelas que não têm cargos na igreja ou parentescos específicos com os líderes, dando vez e lugar para as diversas vozes presentes na congregação.
  • O enfrentamento ao machismo, misoginia e sexismo, discriminação, preconceito e racismo serem temáticas a serem incluídas nas ministrações dos cultos.
  • A intensificação e popularização da educação política.
  • Adoção pelas igrejas evangélicas de educação antirracista e antimisógina nos cultos e também nas escolas bíblicas dominicais;
  • Adoção da cultura de paz, do respeito à diversidade religiosa e do combate às práticas de intolerância.

Repudiamos as ações políticas e policiais que põem em risco de morte e/ou mortificam nossa população e aqueles que coadunam com tais práticas anticristãs.

Posicionamo-nos em defesa da vida de todas as mulheres, com atenção particular para as mulheres negras e indígenas, grupos profundamente vulnerabilizados. Colocamo-nos a disposição das igrejas protestantes para um diálogo baseado na verdade e na reconciliação mediante a realidade do racismo estrutural que nos afeta.

_________________

(1) No relato da Criação, “a Ruah de Deus (em hebraico, Ruah é feminino) pairava sobre as águas”: trata-se de uma bela imagem da matriz ou útero originário fecundo de tudo quanto existe; tudo é amorosamente acolhido, fecundado, gestado, carregado neste grande ventre cósmico que podemos chamar divino: “Deus”. Alento, sopro, vento, respiração, força, fogo… Com nome feminino que fala de maternidade e de ternura, de vitalidade e carícia. Seu calor gera harmonia no caos, realça a beleza e originalidade de cada criatura, dando a cada uma seu lugar, o espaço que necessita para potencializar seu ser. Nessa relação adequada, cada erva, cada montanha, cada ser que vive, tem seu lugar e seu sentido.- Fonte: https://catequesehoje.org.br/raizes/espiritualidade/723-ruah-santo-o-sopro-que-nos-une

Via Novos Diálogos.


Manifesto de negras e negros evangélicos

Manifesto de negras e negros evangélicos

Precisamos de uma igreja antirracista, que construa e promova a justiça

“Ai dos que promulgam leis iníquas, os que elaboram escritos de opressão, para suprimir os direitos dos fracos, e privar de justiça os pobres do meu povo.” Isaías 10:1-2.

Nós, negras e negros evangélicos brasileiros, nos manifestamos para clamar a urgência de a igreja se posicionar a denunciar o racismo como pecado, e pecado estrutural.

Quantas irmãs de nossas igrejas já perderam os filhos assassinados? Quantos jovens de nossas igrejas já foram mortos? Quantas irmãs oram por seus filhos presos? Queremos vida, mas as oportunidades são negadas, as portas de empregos cada vez mais são fechadas, o acesso à educação e ao sonho da universidade ainda não é para todos. Na maioria das vezes, nos falta o básico, nos faltam casa, alimento e água.

Quantos irmãos e irmãs estão morrendo nas filas dos hospitais e tantos outros nem conseguiram ter atendimento quando foram buscar a cura? É hora de reconhecer que muitas destas tragédias não são respondidas e explicadas pela “desigualdade” pura e simplesmente. Elas revelam o racismo da sociedade e o legado do descaso com vidas negras desde a era colonial do Brasil.

João Pedro e George Floyd eram negros e evangélicos. Aqui e nos Estados Unidos, estes irmãos foram vítimas de um sistema racista legislado por um Estado impregnado pelo racismo estrutural que sufoca, fuzila, desumaniza e silencia negros e negras. O caso de Miguel Otávio, menino negro de cinco anos —de família evangélica— que caiu do nono andar de um prédio em Recife, também denuncia as condições de trabalho do povo negro nesse sistema que violenta diretamente as famílias negras brasileiras. Em especial as mulheres negras, que desde a escravidão são submetidas a posições de servidão, negação de direitos e da própria humanidade.

Diante de estruturas de morte como estas, é necessária uma igreja que se levante e denuncie. Precisamos de uma igreja antirracista, que persegue, constrói e promove a justiça para todas e todos, e que olha em especial para os órfãos e viúvas de nossa época.

Infelizmente, parte dos líderes evangélicos de grandes igrejas —que possuem todo tipo de mídia nas mãos— estão comprometidos com o interesse dos poderosos e só pensam em armas e em tramar nossas mortes. Eles colocam o dinheiro e o poder acima da vida. Uma outra parte das lideranças decidiu ficar em silêncio, e isso também é escolher o lado do opressor.

Precisamos de uma igreja antirracista, que persegue, que constrói e que promove a justiça. Sabemos que todos os que odeiam e se levantam contra as obras de justiça que trazem vida ao povo negro amam a morte, amam o sistema racista e tudo que nele existe. No entanto, acreditamos no que o nosso irmão Martin Luther King Jr. afirma:

“A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça à justiça em todo lugar”.

Na crença e no clamor, convocamos irmãs e irmãos em oração para agir. O racismo é um projeto do inimigo, um projeto de morte, assim como a política de Herodes, que exterminava crianças, que colonizava territórios e que usava da religião para controlar os povos. Por isso, cabe a nós lutar pela libertação do nosso povo enquanto não houver igualdade, levantar nossa voz profética e denunciar o racismo. Pois sem justiça e sem vida plena e abundante para a favela, não é possível falar de paz.

Jackson Augusto é um jovem batista que integra a Coordenação Nacional do Movimento Negro Evangélico do Brasil. É membro do Colegiado Nacional do Miqueias Brasil, articulador social no Usina de Valores, produtor de conteúdo no projeto Afrocrente e ativista da teologia negra no Brasil.

Luciana Petersen é uma jovem batista estudante de jornalismo, feminista negra, editora e podcaster no Projeto Redomas.

Wesley Teixeira é um jovem negro membro da Igreja Evangélica Projeto Além do Nosso Olhar, militante da Frente de Evangélicos Pelo Estado Democrático de Direitos e do Coletivo Esperançar. Filiado ao MNU (Movimento Negro Unificado), que compõe a Coalizão Negra por Direitos.

Ronilso Pacheco é teólogo pela PUC-Rio, negro e nascido em São Gonçalo, no Rio de Janeiro. É ativista, escritor e mestrando em teologia no Union Theological Seminary (Columbia University), em Nova York.

PerifaConnection

PerifaConnection é uma plataforma de disputa de narrativa das periferias, feito por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Nina da Hora, Salvino Oliveira e Jefferson Barbosa.

Fonte: Folha de São Paulo


Manifesto 2020 – Rede de Mulheres Negras Evangélicas do Brasil

Manifesto de apoio à Yalorixá e ativista pelos direitos humanos Mãe Beth de O’xum

O Movimento Negro Evangélico em Pernambuco, manifesta apoio à Yalorixá e ativista pelos direitos humanos Mãe Beth de O’xum, mulher íntegra, comprometida com a promoção da justiça social para a população negra.

No último dia 17 de Novembro, após expressar sua indignação (que para nós não é apenas individual, mas coletiva), diante das sistemáticas práticas racistas perpetradas contra o povo de terreiro, e protagonizada por alguns pastores evangélicos, Mãe Beth de O’xum está sendo processada por membro (ou membros) da banca evangélica estadual que alega se sentir ofendido com as palavras da sacerdotisa.

Reconhecemos na manifestação da Mãe Beth de O’xum uma expressão da condição de injustiça social em perseguição e intolerância religiosa sofrida pelos povos de religiões matrizes afro-brasileiras. Pois sabemos que, segundo dados do Dique 100 (2018), as religiões de matrizes africanas, umbanda e candomblé são as principais vítimas do racismo religioso habitualmente cometido por pessoas ou grupos ditos cristãos no Brasil. Diante disso, e até o presente momento, desconhecemos projetos e ações propostas ou criadas pelos acusadores de Mãe Beth, e das bancadas evangélicas de modo geral, para eliminar esse tipo prática criminosa que é recorrente no segmento de seus adeptos religiosos.

Sublinhamos ainda, que defendemos o princípio de laicidade do Estado Democrático, a liberdade de expressão, o respeito à diversidade religiosa em todas as suas manifestações e expressões, e o combate veemente a qualquer prática racista e sexista, seja ela originada de um único líder religioso ou de um grupo deles. Nós do Movimento Negro Evangélico em Pernambuco somos população negra, respeitamos a trajetória da religiosidade e fé de matriz afro-brasileira para a resistência e sobrevivência do povo negro até os dias atuais e na construção de sociedade brasileira.

Recife, 23 de Novembro de 2019.
Colegiado do Movimento Negro Evangélico em Pernambuco.

508 anos da Reforma Protestante e a Escravidão Negra

 

Em 31 de outubro de 2025, a reforma protestante completará 508 anos,  data oportuna para a reflexão histórica do protestantismo e a escravidão negra no mundo. Nestes artigos vamos pincelar alguns fatos da relação do protestantismo com a escravidão negra nas igrejas protestantes.

Eu fico com a Revolução Protestante

  Reforma protestante, movimento europeu, pensado a partir da política, do estado e da religião. Movimento que começa com Lutero inspirado em parte na igreja da Etiópia, porém a partir…

Reforma Protestante Negra

O movimento religioso liderado por Agostinho José Pereira foi diferente de todos os movimentos ligados ao protestantismo europeu e norte americano. O pastor negro Agostinho não tinha nenhum vinculo com  missionários ou grupos protestantes….

Racismo na Igreja Batista brasileira

O RACISMO À BRASILEIRA DA CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA DE 1871 à 2019

(Nota de repúdio do Movimento negro evangélico do Brasil)

A primeira igreja Batista do Brasil, surgiu em 1871, na cidade de Santa Bárbara do Oeste. Ela foi fundada por pastores do Sul dos EUA, que eram escravagistas, não só trouxeram escravizados como tem relatos oficiais de cartas de pastores Batistas recomendando seus colegas a plantarem igrejas no Brasil. Por ser um país em que tinha um sistema escravagista, muito próximo com o Sul dos EUA.

Nunca houve carta da CBB pedindo perdão as irmãs e irmãos negros brasileiros, A CBB deve perdão pela sua omissão durante o processo da escravidão no país. A CBB nega o racismo institucional vigente na estrutura da organização atualmente. A mais poderosa instituição batista do país tem como seu principal evento para a juventude, o congresso Despertar, ele ocorre bienalmente. Pela primeira vez na história da denominação uma edição do evento trataria do tema “decolonizando o olhar: O racismo atinge a igreja?”. Com a presença de Marco Davi e Fabíola Oliveira. Até que um pastor branco que reside na Flórida começou a perseguir os convidados. Então a CBB, entrou em contato com a coordenação da juventude Batista brasileira, ordenando desconvidar o Marco e a Fabíola.

O evento contava com 35 mesas de debate e a ÚNICA em que os preletores foram desconvidados foi a que tratava sobre racismo. Na tentativa de amenizar a situação, transformaram a mesa de debate, em uma roda de diálogo. Agora, analisem seriamente a situação. Houve uma roda de diálogo sobre racismo, dentro de um ato/processo de racismo institucional. Após toda a exposição dos convidados, ainda assim, houve uma conversa sobre o tema.

O Movimento Negro Evangélico do Brasil entende o ato, como uma violação principalmente aos convidados que foram expostos e humilhados institucionalmente. Convidados estes, que são referência como ativistas dentro do movimento negro, de fé evangélica. Entendemos que as pessoas negras que participaram do processo de construção também foram violadas ao ter que obedecer uma atitude racista da instituição. Se querem nos colocar uns contra os outros, estaremos em posição de repreensão e exortação em amor. Porém, também com muita indignação, pois onde o ódio está sendo servido devemos nos levantar da mesa e ir comer com os que foram odiados.

O movimento negro evangélico entende que o racismo institucional se configura explicitamente como uma violação dos direitos humanos e um pecado estrutural, além de que, em nossa constituição Racismo se configura crime. A reconciliação só é possível através do arrependimento. Rogamos ao Eterno que o espírito de justiça caia sobre toda injustiça praticada. Entendemos que todos que têm sede e fome de justiça, se levantam profeticamente para denunciar e combater o Racismo nesse país.

Movimento Negro Evangélico do Brasil

O racismo atinge a Igreja quando a instituição religiosa opera o racismo

CANCELAMENTO DA JORNADA DE CONTEÚDO “DECOLONIZANDO O OLHAR: O RACISMO ATINGE A IGREJA?”

Hoje recebi uma ligação me comunicando sobre o cancelamento da mesa onde eu e o pastor Marco Davi Oliveira falaríamos sobre o pecado do racismo.
Não foi uma ligação diretamente da coordenação da Juventude Batista Brasileira, mas foi uma ligação autorizada pela instituição, em consonância com decisão tomada pela Convenção Batista Brasileira.

Depois de uma semana de difamações e maledicências envolvendo meu nome e minha caminhada na direção do debate interreligioso pela promoção do respeito com adeptos das religiões de cosmovisão africana e da dignidade de mulheres e homens pretos que são alvo do racismo religioso praticado pela instituição evangélica brasileira, foi deliberado o silenciamento de nossa fala.

Foi uma cruzada covarde: isso precisa ficar marcado!
Um ataque orquestrado por membros de um setor extremamente conservador que usou de de falas minhas isoladas e retiradas de seu contexto original para desqualificar a minha pessoa e minha jornada enquanto mulher preta cristã.
Temos tudo documentado. Textos em diversos grupos de Whatsapp, no brasil inteiro, com único e exclusivo objetivo do meu silenciamento.

Mas a jornada segue, minhas irmãs e irmãos!
Um debate que era pra durar uma hora e meia em um congresso, está durando mais de 100 horas.
Um debate que se dá, ainda tímido, nas igrejas locais, toma o brasil todo.
O Pecado do Racismo, que tem sido algoz, silencioso e violento algoz, de servos e servas de Deus dentro das denominações, hoje é desmascarado.

A pergunta foi respondida.
O racismo atinge a Igreja quando a instituição religiosa opera o racismo.

Mas… que tempo bom vivemos hoje!
Tempo em que Jesus torna nítido e público que o interesse de retomar o dom profético da Sua Igreja é Dele.
Então, toda e qualquer perseguição passa a fazer sentido para nós que acreditamos no Cristo da Cruz.

Aos que tem me sustentado em oração, gratidão profunda.
Seguimos em fé e em Amor sendo Igreja de Jesus, para além da violência e omissão da instituição.

Seguimos em Amor.
Não no que é vrívolo e dependente dos nossos arroubos sentimentais.
Mas no Amor que é decisão diária na direção do nosso próximo.
NO AMOR QUE LANÇA FORA TODO O MEDO

Por Fabíola Oliveira

Só Jesus Expulsa o Racismo da Igreja Evangélica brasileira

CARTA ABERTA AO BRASIL BATISTA

Em decorrência da minha participação no Despertar 2019 (evento promovido pela Juventude Batista Brasileira, onde teremos, eu e o querido pastor Marco Davi Oliveira, a rica oportunidade de falar com jovens de todo o país sobre a prática do racismo na ambiência eclesiástica), venho sofrendo ataques difamatórios via redes sociais de pessoas que eu nem sequer conheço e que, consequentemente, também não me conhecem, não conhecem minha caminhada, não vivenciam a jornada da vida ao meu lado, não comeram nem uma colher de sal comigo.

Por essa razão, eu, Fabíola Oliveira, filha de Dona Maria da Penha, nossa ancestral, serva de Jesus Cristo, o Favelado de Nazaré, venho por meio desta carta dizer que Só Jesus Expulsa o Racismo da Igreja Evangélica brasileira.

Mas, antes de expulsá-lo, Jesus o revela.
Ele faz com que o seu nome seja conhecido: racismo.

Ele faz a comunidade perceber que há uma perseguição específica aos corpos pretos que denunciam o pecado do racismo dentro das instituições.

Ele, o Cristo da Cruz, faz saltar aos olhos dos que ainda não vêem, que há um incômodo direcionado àquilo que vozes pretas podem dizer. E dirão!

Basta de silêncio.
Porque nossas vozes anunciam o Reino de Deus. E onde o Reino de Deus é anunciado, há profecia. E onde há profecia, há quebra do jugo do silenciamento. E onde o jugo do silenciamento é desmantelado, há libertação.

Quem fala aqui é uma serva de Deus, liberta da opressão do racismo. Em franco processo de cura dos anos de perversidade contra a minha existência e contra a existência dos meus ancestres.

Quem fala aqui é uma mulher livre, que conheceu verdadeiramente a Jesus na vida adulta, e ao ser convidada para trilhar o caminho que é o próprio Cristo, foi também convidada à liberdade.

Não me incomodo com as ofensas.
Já me chamaram de vagabunda, de prostituta. (Peço perdão pelos termos fortes, mas é para que os irmãos e irmãs vejam como o fanático religioso evangélico pode ser raivoso.) Já me disseram que eu era motivo de vergonha pra comunidade evangélica brasileira.
Motivo de vergonha porque falo do Cristo que Ama e não odeia; do Cristo que não é proselitista, mas é respeitador e incentivador da agência e da autonomia humana; do Cristo que não demoniza a experiência de fé dos nossos irmãos e irmãs do candomblé.

Ainda assim, não me incomodei.
Segui, compreendendo que o que dizem a meu respeito é de responsabilidade de quem diz. E o que sou não pode ser forjado pelo outro.

Mas me incomodo enormemente com calúnias e inverdades em relação à caminhada que tenho feito unicamente inspirada pelo autor da minha fé.

            Ser chamada de “cristã do ecumenismo entre o evangelho e a macumba” pelo pastor Eduardo Baldaci denuncia duas coisas, nitidamente:

1) o desconhecimento do conceito de ecumenismo, que é a ideia de unidade entre as expressões de fé cristã. Por isso, por si só, o ecumenismo entre evangelho e candomblé é impossível!!!! E pensá-lo possível já demonstra a fragilidade do conhecimento do autor da ofensa mentirosa e maldosa acerca do tema;

2) o racismo religioso.
Tema extremamente caro para mim!
Porque diz respeito à práticas que atravessam séculos: prática de animalização e coisificação do corpo de pessoas pretas. Prática de desqualificação do modo de se relacionar com o Sagrado de pessoas pretas. Prática de demonização de tudo aquilo que vem ou se refere à África. Prática de generalização despudorada em relação a todos os elementos da cultura africana e afrobrasileira, fazendo com que se chame pelo nome de um instrumento musical toda uma prática religiosa com seus dogmas, performances e elementos cúlticos específicos.

Eu, enquanto mulher preta cristã na resistência e na re-existência me utilizo das propostas do debate interreligioso para promover dignidade e direitos entre o meu povo. Povo que crê em Jesus Cristo. Povo que crê nos Orixás. Povo que, para além das conexões espirituais, têm uma conexão ancestral com África.

Uso da interreligiosidade para promover o respeito, para denunciar o racismo, para estabelecer pontes de diálogo que construirão entre nós elos de justiça e unidade.

Uso da interreligiosidade para a reconciliação.
Porque o meu povo que está nos terreiros e o meu povo que está nas igrejas evangélicas se vêem como inimigos!
Familiares do candomblé estão há anos sem falar com parentes que estão na igreja.
Amigos que se conheceram na umbanda rompem o vínculo afetivo e fraternal quando um deles vai pra Jesus.
Amores são destruídos porque o pastor afirma que o ogã é do diabo e que esse casamento não pode dar certo.

Em Cristo eu reconheço a Justiça e a Reconciliação.
Em Cristo eu reconheço o conceito revolucionário do respeito.
Vejam que eu não disse tolerância – eu disse respeito! Porque eu não quero tolerar meus irmãos e irmãs do candomblé: eu quero amá-los, em toda a potência do Amor.

Não aceito o desmerecimento, o desprestígio e a demonização.

São dois caminhos que se lançam diante de mim.

Um é estar em consonância com o cenário de omissão que se abateu sobre a instituição evangélica brasileira e ser omissa, e me calar diante da opressão.

O outro é crer no dom profético da Igreja de Jesus, denunciando o pecado do racismo pra glória de Deus.

Em nome de Jesus eu escolho escandalizar o brasil batista e anunciar o reino de paz, alegria e Justiça que me resgatou da morte e me deu vida, vida em abundância.

Sigo em oração permanente e diária pelas instituições, para que haja arrependimento e perdão.

Que o Amor de Deus, esse que lança fora todo o medo, preencha o coração de todos e todas que foram enrijecidos pelo sistema e pela omissão.

Por Fabíola Oliveira

Qual a cor da sua fé?

Diálogo entre os pastores Ariovaldo RamosMônica Francisco Marco Davi Oliveira sobre evangélicos, negritude e racismo

O auditório do Sindicato dos Bancários no centro do Rio de Janeiro foi o ponto de encontro para mais de cem pessoas na noite da última sexta (15), apesar da chuva que insistia em cair na cidade. A maior parte do público: evangélicos negros das mais diversas igrejas e denominações, e de diversas regiões do Rio. O evento promovido pela Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito com apoio do Movimento Negro Evangélico, dentro dos 21 Dias de Combate ao Racismo foi uma referência para ampliar as diversas iniciativas que acontecem entre os evangélicos para debater a presença dos negros dentro das igrejas protestantes e o combate ao racismo – até mesmo dentro das próprias instituições religiosas.

O encontro reuniu os pastores Ariovaldo Ramos, um dos coordenadores da Frente de Evangélicos, a pastora Mônica Francisco, deputada estadual pelo PSOL no Rio de Janeiro e o pastor Marco Davi de Oliveira, um dos fundadores do Movimento Negro Evangélico e pastor da Nossa Igreja Brasileira – uma igreja batista que existe há um ano no Rio tendo como proposta construir uma liturgia a partir dos elementos culturais do Brasil.

Além do ministério pastoral, os três tem em comum o viver na pele a realidade racial. Três negros, com trajetórias que possuem similaridades e divergências. Ariovaldo se converte quase adolescente. Mônica quase adulta. Marco Davi nasceu em família evangélica, com pais que se converteram na juventude.

Para nenhum dos três a vida foi fácil. Como – ainda – não é fácil para nenhum negro brasileiro. Mônica Francisco, que está no primeiro mandato na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, começou seu ativismo político quando as chuvas destruíram parte da Morro do Borel, e ela se envolveu na luta por moradia. A conversão veio depois, na Igreja Universal do Reino de Deus. Chegou a estudar na Escola de Obreiros, de onde saiu para a igreja batista. De batista, foi para uma igreja pentecostal, onde é pastora há três anos. Nesse caminho, a militância a levou para a Faculdade de Ciências Sociais.

Filho de pai operário e mãe costureira, Ariovaldo Ramos viveu a infância e a adolescência na periferia, em São Paulo e em Guarulhos. É de sua história pessoal, como ter morado em cortiço, que carrega o compromisso com os pobres. A conversão foi na Igreja Metodista Livre. Pastor de formação e estudioso de filosofia, está envolvido com o ministério religioso desde 1974.

Quando as chuvas causaram um estrago sem tamanho no estado do Rio em 1966, deixando 250 mortos e mais de 50 mil desabrigados, os pais de Marco Davi – que perderam a casa na tragédia – foram residir num espaço da Primeira Igreja Batista em Teresópolis. Quando conseguiram ter um lugar para morar, as dificuldades eram extremas, incluindo fome. Aos 15 anos decidiu que seria pastor. Aos 20 anos foi para o Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. É no exercício do ministério pastoral que surge o incomodo com a questão racial e os posicionamentos das igrejas sobre a identidade negra e o racismo.

Identidade negra – Durante o encontro da Frente, Ariovaldo destacou a importância de demarcar a identidade negra e cristã, enfatizando que o racismo no Brasil é produto de uma falha na compreensão do sentido da vida cristã: “As igrejas protestantes produziram e mantiveram o racismo no país”.

Mônica fez uma caminhada pela história recente das igrejas evangélicas pentecostais e suas omissões diante do racismo. A deputada apontou os problemas da igreja, a opressão sobre as mulheres e a juventude: “Cresce o número de desigrejados por causa da postura da igreja. É preciso pedir perdão”.

Marco Davi propôs o equilíbrio entre os pontos negativos e positivos da igreja, e o quanto a igreja foi fundamental para a promoção da população negra: “Há sentimento de pertencimento, a sociedade brasileira vê o corpo negro com suspeição, e a igreja – que é um espaço sagrado – acolhe esses corpos, onde nos se tornam sujeitos”.

As abordagens diferentes na forma, idênticas na denúncia do racismo, deram o tom do debate, suscitando a participação do público. As perguntas revelaram o quanto esse assunto precisa ser abordado nos estudos bíblicos, em congressos, seminários, simpósios e nos púlpitos das igrejas. Os evangélicos brasileiros, segundo dados do Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE) mapeados no Censo 2010, são em maioria negros e pobres, que vivem com renda per capita inferior a um salário mínimo por mês.

Por Nilza Valeria Zacarias Nascimento, jornalista. Coordenadora da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito

Assista o vídeo com o diálogo Qual a cor da sua fé?