Protestantismo, Escravidão e os Negros No Brasil. Metodismo de Imigração e Afro-Brasileiros

Este livro é resultado de uma dissertação de mestrado do autor José Roberto Alves Loiola que escolheu como objeto de estudo as relações dos metodistas, imigrantes ou missionários, com a população afro-brasileira da região de Piracicaba, entre 1867 a 1930.

A data inicial se deve à organização da primeira Igreja Metodista entre os imigrantes confederados no Brasil. A segunda se refere à data do início do processo de autonomia administrativa dos metodistas brasileiros da Igreja norte-americana.

Nesse texto, o autor procura mapear as diversas representações que foram construídas a partir da interação entre brancos norte-americanos, sulistas, protestantes, com católicos e negros, e levaram a criação de uma Igreja Metodista típica no país.

Nem escravocrata, nem abolicionista, mas onde os negros, no dizer do historiador José Carlos Barbosa, se reuniam separadamente dos brancos, pois “negro não entra na igreja, mas espia da banda de fora”.

Eu fico com a Revolução Protestante

 

Reforma protestante, movimento europeu, pensado a partir da política, do estado e da religião. Movimento que começa com Lutero inspirado em parte na igreja da Etiópia, porém a partir de um pensamento supremacista, onde existia só uma verdade. A reforma começou com uma inconformidade da igreja estar junto ao poder do império, da igreja fazer política a partir dos opressores, da igreja ser instrumento que impedia o pobre, o órfão a viúva e o estrangeiro de ter acesso a teologia, de produzir teologia ou até de falar com legitimidade da sua experiência com Deus.

Dentro da reforma existia os movimentos mais radicais, porém esses movimentos mais populares formado por camponeses, pobres e gente da periferia europeia foi silenciado, foi colocado como “Quase reformados”. A reforma se conformou, por isso para muitos ela começou com Lutero e terminou em Calvino. Pois a reforma, e aqui não falo mais do momento histórico e restritamente europeu, coloco aqui a reforma como um processo na verdade revolucionário dos seguidores de cristo na história, processo que rompe com os supremacistas, com os acumuladores, com o poder religioso que matou e silenciou os que subvertiam a ideia de poder, o poder da partilha, o poder concreto de amor, que nos leva a sermos vistos como perigosos para o império. O poder da denúncia diante de um Estado que violenta o povo em nome de Deus.

A igreja de Cristo não pode reformar uma construção humana que em suas bases de fé não estão todos os povos e nações, não podemos “dar um jeitinho”, pois sabemos o motivo pelo qual os Negros não contribuíram na reforma protestante e muito menos na contra reforma católica romana, sabemos que uma torre de babel foi construída na história da igreja, querendo que todos tivessem um só rosto, uma só cultura, e essa cultura que foi escolhida ela é dita como civilizada ou como cultura santa e de Deus, existe um corpo que foi construído nessa torre e esse corpo que é mais santo, ele tem um cabelo que não é a aparência do mal e que é aceito por Deus, não podemos cantar em Iorubá, pois se não estaremos invocando demônios, pois nessa torre que foi construída existem idiomas “cultos” e ricos. Essa é a construção da torre de babel não podemos continuar essa construção ou simplesmente reformá-la.

Eu recuso a reforma protestante, eu a recuso não por ignorar a sua importância diante da história da igreja, eu não a recuso por não me achar produto do protestantismo, mas a recusa é porque na história da igreja de Cristo e da relação com Deus. A diversidade ela é a única que nos traz harmonia, ela é fruto do pentecostes, ela é fruto do mover do Espírito. Eu fico com a revolução protestante, ela não começa com Lutero e muito menos depende do calvinismo, pois na revolução Deus derruba a torre de babel. O Deus da trindade, que é um mas também são três, que são diversos, que são equivalentes, esse Deus ele se levanta contra a uniformidade, ele se levanta contra a supremacia, o seu Espírito derrama sobre nós o sentido da diversidade, ele nos incentiva a descentralizar nossos poderes, a partilhar nossas experiências e a partir disso termos uma unidade. Eu recuso a reforma protestante, porque nela as vozes femininas, LGBTs, Pobres e Negras não tiveram vez. Eu não me reconheço nessa história, porém Martin Luther King, James Cone, Jacquelyn Grant, Rosa Parks, Nelson Mandela, Desmond Tutu, Agostinho José Pereira, William Seymour e tantas outras vozes ecoaram revoluções de protestos contra essa hegemonia, contra essa torre de babel, contra as construções humanas de supremacia dentro da fé cristã. Pois existe só uma tradição, a nossa tradição está em Cristo, na encarnação de sua missão, de sua caminhada e de seus valores.

Somente a justiça! Somente a liberdade!

Somente o amor! Somente a equidade! Somente a diversidade!

Por Jackson Augusto –  Coordenador do Movimento Negro Evangélico do Estado de Pernambuco. Estuda Ciência da computação em Universidade Federal Rural de Pernambuco (Ufrpe Oficial).

Veja a série de artigos sobre a Reforma Protestante Negra 

508 anos da Reforma Protestante e a Escravidão Negra

 

Em 31 de outubro de 2025, a reforma protestante completará 508 anos,  data oportuna para a reflexão histórica do protestantismo e a escravidão negra no mundo. Nestes artigos vamos pincelar alguns fatos da relação do protestantismo com a escravidão negra nas igrejas protestantes.

Reforma Protestante Negra

O movimento religioso liderado por Agostinho José Pereira foi diferente de todos os movimentos ligados ao protestantismo europeu e norte americano. O pastor negro Agostinho não tinha nenhum vinculo com  missionários ou grupos protestantes….

Eu fico com a Revolução Protestante

  Reforma protestante, movimento europeu, pensado a partir da política, do estado e da religião. Movimento que começa com Lutero inspirado em parte na igreja da Etiópia, porém a partir…

Reforma Protestante Negra

O movimento religioso liderado por Agostinho José Pereira foi diferente de todos os movimentos ligados ao protestantismo europeu e norte americano. O pastor negro Agostinho não tinha nenhum vinculo com  missionários ou grupos protestantes. As pregações do mesmo tinham muitas diferenças com relação as pregações oficiais das denominações estrangeiras no Brasil.

Eu fico com a Revolução Protestante

  Reforma protestante, movimento europeu, pensado a partir da política, do estado e da religião. Movimento que começa com Lutero inspirado em parte na igreja da Etiópia, porém a partir…

O Lutero Negro

A primeira Igreja Protestante Brasileira foi Negra A primeira tentativa de estabelecer uma igreja protestante no Brasil foi em 1555, que pretendia dar refúgio aos protestantes calvinistas franceses, perseguidos pela…

A Igreja do Divino Mestre

A Igreja do Divino Mestre,  era original, com elementos  de uma reforma religiosa, diferentes das igrejas europeias e americanas. Era uma Igreja Negra no sentido de reunião de pessoas “negras”…

Reforma Protestante Negra

O movimento religioso liderado por Agostinho José Pereira foi diferente de todos os movimentos ligados ao protestantismo europeu e norte americano. O pastor negro Agostinho não tinha nenhum vinculo com  missionários ou grupos protestantes….

O Divino Mestre

Agostinho José Pereira, não se denominava “Divino Mestre“. Mesmo com seu trabalho de alfabetização vinculado ao ensino das Escrituras, Agostinho não se deixava ver como um divino mestre. O Diário de…

508 anos do Protestantismo e escravidão no Brasil

Os principais agentes da imigração norte-americana para o Brasil foram pastores protestantes do Sul dos EUA. O aceno de encontrar terras em abundância com mão-de-obra escrava certamente foi decisivo para que famílias inteiras, acostumadas a um estilo de vida escravista, se deslocassem do sul dos EUA para o sudeste brasileiro. A exemplo do Rev. B. Dunn, que via no Brasil uma nova Canaã, a terra prometida onde os confederados derrotados na Guerra de Secessão poderiam reconstruir suas vidas, seus lares e suas propriedades incluindo a mão-de-obra escrava. Pelo menos cerca de 2000 a 3000 sulistas se deslocaram para São Paulo.

O fundamentalismo das denominações protestantes dos EUA se transformou em terreno fértil para justificativas da escravidão, que buscavam embasamento doutrinário para apaziguar a consciência dos escravocratas do sul. Citando a história de Noé, identificavam a maldição de Cam, por ter surpreendido o patriarca nu e embriagado, como a maldição dos negros.

De uma maneira geral os protestantes no Brasil só tomaram uma posição contra a escravidão quando à abolição já era unanimidade na sociedade brasileira. Mesmo os poucos protestantes que se posicionaram favoráveis à abolição o faziam como uma questão moral e religiosa. Eram incapazes de atitudes mais concretas, que de fato propiciassem soluções ao problema do escravismo, que até os nossos dias tem gerado grandes conseqüências, onde grande parte da população negra vive a margem da sociedade. Os negros se viram largados no interior de uma sociedade fundada em bases racistas. Libertos foram preteridos do mercado formal de trabalho em nome de um projeto elitista de branqueamento do país. Tiveram que disputar com o imigrante europeu até mesmo as mais modestas oportunidades de trabalho livre, como a de engraxate, jornaleiro ou vendedor de frutas e verduras, transportadores de peixe e carregadores de sacas de café, etc. As mulheres garantiram a sobrevivência da família trabalhando, tanto ontem como hoje, como domésticas, faxineiras, babás, doceiras, cozinheiras, lavadeiras e outras atividades similares. E a igreja ainda no seu silêncio.

Mas para compreendermos melhor a relação do protestantismo brasileiro com a escravidão negra devemos fazer algumas considerações históricas sobre quem são essas igrejas e qual era a suas posições perante a escravidão.

Luteranos:

As primeiras comunidades luteranas de imigrantes alemães se estabelecem no Brasil a partir de 1824. Das correntes luteranas, a maior e mais antiga no país é a Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil. Posteriormente surgem outras correntes luteranas, como a Igreja Evangélica Luterana do Brasil, vinda dos Estados Unidos (EUA) no início do século XX.

Dos luteranos sabemos que os primeiros escravos negros da Colônia Alemã Protestante de Três Forquilhas entraram por volta de 1846, por iniciativa do pastor Carlos Leopoldo Voges. Outros colonos protestantes copiaram seu exemplo (Mittmann, Hoffmann, König, Grassmann, Kellermann, Jacoby, Schmitt e outros).

Metodistas:

Primeiro grupo de missionários protestantes a chegar ao Brasil, os metodistas tentam fixar-se no Rio de Janeiro em 1835. A missão fracassa, mas é retomada por Junnius Newman em 1867, que começa a pregar no oeste do estado de São Paulo. A primeira igreja metodista brasileira é fundada em 1876, por John James Ranson, no Rio. Entre outros ramos, destacam-se a Igreja Metodista Livre, introduzida com a imigração japonesa, e a Igreja Metodista Wesleyana, de influência pentecostal, estabelecida no Brasil em 1967.

Os metodistas, defensores dos direitos humanos e da abolição do escravismo na Inglaterra e nos EUA, no Brasil acomodaram-se ao ambiente escravista e quase nada fizeram com repercussão pública, em favor dos escravos. Conforme um estudo sobre o metodismo brasileiro durante o período que antecedeu, ou mesmo depois da “libertação dos escravos,” a Igreja Metodista jamais chegou a defender oficialmente sua posição em relação à escravidão no Brasil.

Presbiterianos:

A Igreja Presbiteriana do Brasil é fundada em 1863, no Rio de Janeiro, pelo missionário norte-americano Ashbel Simonton. Em 1903 surge a Igreja Presbiteriana Independente. Há ainda outros grupos presbiterianos, como a Igreja Presbiteriana Conservadora (1940) e a Igreja Presbiteriana Unida do Brasil (1966).

Os primeiros Presbiterianos, também sulistas, conservaram-se por muito tempo fiéis à lembrança de sua causa nacional, um destes missionários presbiteriano sulista se havia conservado tão firme em suas convicções que, quando em 1886 o presbiteriano Eduardo Carlos Pereira publicou uma brochura em favor da abolição da escravatura, ele escreveu um verdadeiro tratado anti-abolicionista.

O pastor presbiteriano Eduardo Carlos Pereira em 1886 publicou um folheto de 46 páginas denominado “A Religião Cristã em sua Relação com a Escravidão”. Nas páginas finais do folheto ele pede aos crentes para libertarem os seus escravos. Hoje, mais de um século da publicação do folheto profético do pastor Pereira, as igrejas continuam no seu silêncio.

Batistas:

Os batistas chegam ao país após a Guerra Civil Americana e se estabelecem no interior de São Paulo. Um dos grupos instala-se em Santa Bárbara d’Oeste e funda, em 1871, a Igreja Batista de Santa Bárbara, de língua inglesa. Os primeiros missionários desembarcam no Brasil em 1881 e criam no ano seguinte, em Salvador, a primeira igreja batista brasileira. Em 1907 lançam a Convenção Batista Brasileira. Em meados do século, surgem os batistas nacionais, os batistas bíblicos e os batistas regulares.

Os primeiros colonos batistas eram favoráveis e foram proprietários de escravos. Em Santa Bárbara D’Oeste, primeiro núcleo batista, o trabalho escravo existiu como mão-de-obra usada na agricultura e em tarefas domésticas. Os colonos batistas eram senhores de escravos, a exemplo da Senhora Ellis, dona de um sítio e que providenciara hospedagem nos primeiros meses ao casal de missionários W. Bagby, fundador da Primeira Igreja Batista do Brasil.

Anglicanos:

A Igreja Anglicana, de origem inglesa, chega ao Rio de Janeiro em 1818. A vinda de missionários norte-americanos de denominação episcopal (nome da igreja nos Estados Unidos) impulsiona a fundação, em 1890, em Porto Alegre (RS), da Igreja Anglicana Episcopal do Brasil, que une as igrejas de origem inglesa e norte-americana. Porto Alegre, Pelotas e Rio Grande tornam-se os centros do anglicanismo no país. Em São Paulo ganha espaço entre os imigrantes japoneses. Com pequena representação no Brasil, conta hoje com cerca de 10 mil fiéis e sete dioceses.

A Igreja Anglicana no Brasil foi conivente com o comércio de escravos em que a Inglaterra esteve envolvida desde o século XVI. Houve uma espécie de anuência ou acomodação diante do fato, isto é, por parte de comerciantes anglicanos, sua participação como membros, ao comercializar e possuir escravos. No seu relato sobre o Brasil, o Rev. Robert Walsh, capelão anglicano que acompanhou a missão inglesa do Lord Strangford, entre 1828 e 1829, descreve e opina a respeito da escravidão no Brasil, nada deixou mais chocado o clérigo do que constatar que seus concidadãos ingleses participavam e usufruíam do “nefando comércio”, lucrando com a escravização de mulheres e de seus próprios filhos, como presenciou na estrada da Tijuca, no Rio de Janeiro, relata: “ele passa a vender não só a mãe de seus filhos como os filhos propriamente ditos, e com tanta indiferença como se tratasse de uma porca com a sua ninhada”.

Os anglicanos da Christ Church, situada no Rio de Janeiro, não só eram donos de escravos, como fizeram batizar nos ritos da Igreja Anglicana os pequenos escravos nascidos em seu poder. Seguindo uma prática dos senhores de escravos brasileiros que batizavam suas peças aos montes, dando-lhes nomes cristãos, os anglicanos também buscaram cristianizar seus escravos. No livro de registros de batismo da Christ Church em 24 de janeiro de 1820, está assentado o batismo de “Thereza, filha de Louisa -escrava negra, nativa de Manjoula, África- propriedade de James Thonton”, um comerciante inglês. Em 11 de maio de 1820 foram batizados 11 escravos do fazendeiro Robert Parkere. Há registros de batismos de escravos domésticos de John Alexander em 1830 e do Coronel Skerit em 1833.

Em 1835, durante a revolta dos escravos malês, ocorrida em Salvador, dos 160 acusados, 45 eram escravos de ingleses anglicanos residentes no bairro da Vitória. Em testamentos e inventários de anglicanos que morreram na Bahia na segunda metade do século XIX, constatou-se também a presença de proprietários de escravos, tais como os senhores Eduardo Jones que tinha 6 escravos domésticos; o Sr. George Mumford que possuía 11 escravos que trabalhavam na sua roça no Acupe e Sr. George Blandy, que possuía 4 escravos.

Congregacionais:

A origem dos congregacionais no Brasil está no trabalho missionário realizado pelo casal Robert Reid Kalley e Sarah Poulton Kalley, que chegaram à cidade do Rio de Janeiro. O Dr. Robert Kalley, escocês veio para o Brasil como missionário, criando no dia 10 de maio de 1855 a primeira Igreja Evangélica de estilo congregacionalista e de fala portuguesa no Brasil: A Igreja Fluminense. Existe hoje no Brasil dois grupos de igrejas congregacionais: a União das Igrejas Evangélicas Congregacionais do Brasil e a Aliança das Igrejas Congregacionais do Brasil.

O congregacional Robert Kalley expulsou um membro da sua igreja por não ter libertado os seus escravos.

Desde sua chegada ao Brasil, em 10 de maio de 1855, Kalley não fazia distinção racial na proclamação do evangelho. O início da missão kalleyana demonstra fato pouco divulgado sobre sua estratégia da missão: uma semana após Sarah iniciar o projeto de escola dominical junto a crianças de Petrópolis, em 26 de agosto de 1855, Kalley começou a lecionar em classe bíblica de negros. A proposta de missão do casal era no mínimo atípica – evangelizar crianças e negros – atingir os que eram negligenciados pela igreja oficial e pela igreja de imigração.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

500 anos da Reforma Protestante e outros 500 do primeiro carregamento de negros africanos na América.

Em 1517, Carlos V, Rei da Espanha, a pedido de Las Casas um padre dominicano,  autorizou a exportação de quinze mil escravos para São Domingos. Assim em 1517, o padre e o Rei iniciaram, no mundo, o comércio americano de negros e a escravidão. Também em 1517 o Padre Martinho Lutero publica as suas 95 teses, que deram início à Reforma Protestante. Infelizmente as 95 teses de Lutero só  foram Contra o Comércio das indulgências e não contra o comércio de seres humanos, que era também um grande mal impregnado na Igreja Católica.

escravidão negra começou com o tráfico africano no século XV, na mesma época do inicio da Reforma Protestante, por iniciativa dos portugueses, com a exploração da costa da África e a colonização das Américas. Os demais impérios coloniais rapidamente aderiram à prática da compra e venda de seres humanos, no célebre “comércio triangular” entre a África, a América, e a Europa.

No entanto, o tipo de escravidão que se deu nas Américas, logo após seu descobrimento por Cristóvão Colombo, em 1492, era praticamente inédita, baseada no subjugamento de uma raça, em razão da cor da pele.

O “despovoamento” das Américas e, conseqüentemente, a escassez de escravos, fez surgir o primeiro carregamento de negros africanos para suprir a falta de escravos nativos, que viria a ser conhecido como o comércio transatlântico de escravos, foi iniciado a pedido do bispo Las Casas e autorizado por Carlos Vem 1517. Las Casas teria depois rejeitado todas as formas de escravidão e tornou-se um grande protetor dos direitos indígenas. Nenhuma condenação papal ou protestante, sobre o tráfico de escravos transatlântico foi feito na época.

Os missionários católicos, como os jesuítas, que também possuíam escravos, trabalharam para aliviar o sofrimento dos escravos americanos nativos do Novo Mundo. Debate sobre a moralidade da escravidão continuou por todo este período.

Apesar de uma forte condenação da escravidão pelo Papa Gregório XVI, em sua bula emitida em 1839, condenando e proibindo a escravidão de negros. Alguns bispos norte-americanos continuaram a apoiar os interesses escravistas até a abolição da escravatura.

A questão do cristianismo e escravidão tem vivido um intenso conflito. No protestantismo enquanto os abolicionistas cristãos eram uma força principal na abolição da escravatura. Escravistas cristãos usavam passagens da Bíblia para justificá-la e manter o sistema escravocrata. A Bíblia era utilizada por ambos os defensores pró-escravidão e abolicionistas para apoiar as respectivas posições.

A cristandade na Idade Média viu a escravidão tradicional desaparecer na Europa e sendo substituídos pelo feudalismo. Mas este consenso foi quebrado nos estados escravistas dos Estados Unidos, onde as justificativas mudaram de religião (os escravos são pagãos) a raça (os africanos são os descendentes de Cam ), em 1667, a assembléia da Virgínia aprovou uma lei que declarava que o batismo não concedia a liberdade aos escravos.

Depois que os Estados Unidos haviam vencido sua batalha pela independência, os europeus continuaram a chegar de vários países, cada grupo trazendo sua própria inclinação teológica e patrimônio cultural. Enquanto os europeus estavam imigrando para o novo país, os africanos estavam sendo sequestrados de suas aldeias, transportados em condições terríveis para as Américas, vendidos como mercadorias e usados como escravos no plantio e propriedades.

Durante o mesmo período, os povos nativos da América do Norte encontraram-se forçados a deixar suas terras tribais. A maioria das nações indígenas foi dizimada. Milhões de pessoas morreram de doenças e guerras. Os sobreviventes foram confinados em “reservas” sobre as piores terras.

Os cristãos protestantes usaram a Bíblia para defender e justificar estas realidades. A escravidão foi racionalizada, porque os africanos não eram cristãos, portanto, rotulados como “pagãos” e considerado sub-humano. A Terra Prometida do livro de Josué com o seu modelo de conquista militar foi usado para justificar as guerras contra os povos indígenas, os “cananeus” do Novo Mundo. Os Protestantes que vieram para o Novo Mundo se viam como eleitos de Deus, chamados a estabelecer o Novo Israel. Uma interpretação bíblica que estimulou uma atitude de superioridade moral e econômica dos cristãos brancos sobre todas as outras culturas.

Para justificar a escravidão negra os clérigos do Sul dos Estados Unidos baseavam seus argumentos nas Escrituras. Eles apontaram que a escravidão era instituída por Deus e fundamentada na Bíblia:

“E disse: Maldito seja Canaã; servo dos servos seja aos seus irmãos”. (Gn 9:25).

“E quanto aos escravos ou às escravas que chegares a possuir, das nações que estiverem ao redor de vós, delas é que os comprareis.
Também os comprareis dentre os filhos dos estrangeiros que peregrinarem entre vós, tanto dentre esses como dentre as suas famílias que estiverem convosco, que tiverem eles gerado na vossa terra; e vos serão por possessão.E deixá-los-eis por herança aos vossos filhos depois de vós, para os herdarem como possessão; desses tomareis os vossos escravos para sempre; mas sobre vossos irmãos, os filhos de Israel, não dominareis com rigor, uns sobre os outros. (Levítico 25:44-46).

Assim, eles argumentaram que a Bíblia confirmava a compra, venda e posse de escravos, desde que eles não fossem cristãos e de uma raça diferente. Em vão o argumento dos cristãos do Norte: afirmando que a passagem bíblica só se aplicava ao povo judeu em sua condição particular. Os sulistas responderam “que Jesus não condenou a escravidão, nem nunca falou uma palavra contra ela. Paulo chegou a enviar um escravo para o seu mestre. Se a escravidão era um mal ou pecado, não teria Jesus ou Paulo que condená-la?”

Outros cristãos alegaram que a base de toda a vida cristã era amar a Deus com todo seu coração, mente e alma, e amar o próximo como a ti mesmo. Como alguém poderia amar o próximo como a si mesmo e mantê-lo como escravo?

Isso não impediu os sulistas argumentarem que o amor total ao próximo como a si mesmo não foi possível nesta vida. Por causa do pecado havia escravidão, que era apenas uma das formas necessárias de desigualdades. Que a escravidão não era uma injustiça, mas benéfica para os negros, a fim de “civilizá-los” e “cristianizá-los”.

Além disso, os cristãos eram instruídos a batizar os negros, a fim de torná-los cristãos. Era dever dos senhores que seus escravos se tornassem e permanecesse cristão. “O negro foi criado para servir nas fileiras da escravidão. Esse tipo de vida foi aprovado pela Bíblia”, argumentavam os eclesiásticos do sul.

Então os pastores e educadores do sul acreditavam na inferioridade do negro: “Ele não tem a capacidade ou o talento possível do homem branco. Ele não era capaz de pensar por meio de qualquer problema complexo, ou de serem treinados para executar tarefas difíceis. Não foi por acaso que o Negro estava nessa condição – ele era assim por natureza, pela criação. Ele era uma criatura inferior feito para servir seus superiores”. Qualquer tentativa de desacreditar esses pensamento estava fora da revelação bíblica e da ciência.

Pena que Martinho Lutero não incluiu nas suas 95 teses o pecado da escravidão. Talvez, se tivesse colocado, os protestantes no mundo não teria a mancha da escravidão negra nos seus 500 anos de história.

Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

507 anos do Protestantismo e a escravidão negra nos Estados Unidos

Em 31 de outubro de 2017, a reforma protestante completou 500 anos, foi uma data oportuna para a reflexão histórica do protestantismo e a escravidão negra no mundo. Neste artigo vamos pincelar alguns fatos da relação do protestantismo com a escravidão negra nas igrejas protestantes nos Estados Unidos. Primeiramente é importante frisar que as igrejas  não saíram ilesas pela controvérsia da escravidão. Quase todas as Igrejas protestantes nos Estados Unidos sofreram consequências como a divisão e o cisma. As grandes denominações chegaram até a se racharem, resultando em Igrejas “do Norte” e “do Sul”.

Vejamos alguns fatos dessa  divisão nas igrejas  norte-americanas pelo pecado da escravidão.

Os Metodistas e a escravidão:

O movimento metodista na América era conhecido como a Igreja Metodista Episcopal. John Wesley, precursor do movimento Metodista, condenava a escravidão como uma “vilania execrável”. Ele não admitia, sob hipótese alguma, que um ser humano fosse dono de outro; daí escreveu contra a escravidão e encorajava Wilberforce na sua luta no parlamento inglês contra o mal. Mas nas colônias americanas, quem trabalhava nas fazendas de arroz eram os negros e, apesar da Declaração da Independência (1776) afirmando como uma “verdade auto-evidente” que todos foram dotados pelo Criador do Direito da Liberdade, no novo país (EUA) a escravidão não foi abolida na época!

Os membros da denominação poderiam ter escravos, o clero não podia. Em 1832 James Andrew Osgood da Geórgia foi consagrado bispo, ele não tinha escravos, porém, Andrew casou com uma mulher que possuía um escravo, tornando-se um proprietário de escravo. Em 1844, Andrew viajou a Nova Iorque para a Conferência Geral Anual da Igreja Episcopal Metodista. Alguns bispos do norte levantaram a questão de Andrew ser um proprietário de escravos. Essa questão foi o estopim para a divisão da Igreja Metodista. A questão foi decidida pelo voto: 136 votaram a favor da separação, quinze votaram contra. Os sulistas criaram a Igreja Metodista Episcopal do Sul e no Norte, os metodistas continuaram com o nome Igreja Metodista Episcopal.

As poucas vozes de protesto ao sistema não foram suficientes para levantar a consciência da Igreja de modo geral; e, com o tremendo aumento da produção do algodão, para a qual pensava-se indispensável o labor negro, criou-se um argumento tanto filosófico como bíblico que apresentava a escravidão não como um mal, senão como bem positivo! Foi só de 1830 em diante que o movimento de abolição começou a crescer; e nesta luta muitos metodistas participaram plenamente.

Os Batistas e a escravidão:

Os Batistas foram à segunda das grandes denominações protestantes divididas sobre a questão da escravidão. Nas igrejas batistas do Norte, vários pastores e um grande número de leigos Batistas tornaram-se convencidos da necessidade de arrependimento imediato do pecado da escravidão.

Em 1836, os Batistas do Norte declararam a escravidão como pecado e questionaram se deveriam manter relações com os donos de escravos. Os Batistas do Sul, por outro lado, defenderam a instituição da escravidão e atacaram os abolicionistas do Norte. Os oficiais das missões batistas queriam evitar qualquer controvérsia, evitando que os trabalhos missionários das igrejas batistas não fossem prejudicados.

Os batistas da Geórgia recomendaram que James E. Reeve, um proprietário de escravos, tornar-se um missionário. Os batistas do Norte rejeitaram a ideia de um missionário escravista e se recusou a nomeá-lo. Batistas do Sul se reuniram, na Geórgia, em 1845 e formaram a Convenção Batista do Sul. Foi mais um sinal das tensões graves transversal que se desenvolveu no país antes da eclosão da guerra civil.

Rev. Basil Manly, Sr., então presidente da Universidade do Alabama (1838-1855), elaborou uma resolução defendendo a escravidão. Manly dono de uma plantação e 40 escravos, defendia a “humanidade dos escravos”, acreditava que a instituição era parte do esquema adequado de estruturas sociais do homem, e que a religião batista poderia ajudar no tratamento humano aos escravos.

Os Presbiterianos e a escravidão:

Diferente dos metodistas e batistas, os presbiterianos a separação não foi centrada em um indivíduo, mas pela ideia  da própria escravidão. Já em 1787, o Sínodo de Nova York e Filadélfia havia sugerido que os escravos fosse libertados. A questão da escravidão se alargou ainda mais a divisão entre os presbiterianos liberais (nova escola) e conservadores (velha escola). A nova escola (igrejas presbiterianas do Norte) aprovou várias resoluções condenando a escravidão. Nas igrejas presbiterianas do Sul, velha escola, se defendia a escravidão nas escrituras e considerava infiéis os abolicionistas.

O pastor presbiteriano da velha escola Robert Lewis Dabney reconhecia a escravidão permitida biblicamente e o comércio de escravos licito. Ele documentou que os nortistas, que atacava a escravidão, eram os que tinham iniciado o comércio de escravos e enriqueceram com isso. Ele também pediu a reforma da escravidão do Sul para eliminar os abusos que eram incompatíveis com a instituição da escravidão como biblicamente definido.

Os Anglicanos e a escravidão:

A relação da Igreja Anglicana no tráfico de escravos se deu através da Sociedade para a Propagação do Evangelho, em especial nas ilhas Barbados. A Igreja Anglicana, através de sua filial missionária, foi dona de uma plantação em Barbados. Os escravos do local eram marcados como gados no peito com a palavra “Sociedade”, referente à Sociedade para a Propagação do Evangelho no Estrangeiro. Os donos da plantação recebiam uma indenização por libertar os escravos, o bispo de Exeter recebeu centenas de libras por este motivo. Apesar dos esforços dos reformadores anglicanos como William Wilberforce, a Igreja era parte do problema, bem como parte da solução.

William Wilberforce, nasceu em 24 de Agosto de 1759 e morreu em 29 de Julho de 1833, foi um político britânico, filantrópico e líder do movimento abolicionista do tráfico negreiro. Nativo de Kingston upon Hull, Yorkshire, começou sua carreira política em 1780 como candidato independente, sendo deputado do condado de Yorkshire entre 1784 e 1812. Em 1785 converteu-se ao evangelicalismo, mudando completamente o seu estilo de vida e se preocupando ao longo de toda sua vida com a reforma evangélica. Em 1787, William Wilberforce conheceu Thomas Clarkson (abolicionista britânico) e um grupo abolicionista ao tráfico negreiro que incluía Granville Sharp, Hannah More e Charles Middleton, importantes nomes da época e que juntos persuadiram Wilberforce a entrar também na causa. Assim, Wilberforce  logo se destacou tornando-se líder do grupo britânico abolicionista. E liderando uma campanha no parlamento inglês contra o tráfico negreiro até a então assinatura do Ato contra o Comércio de Escravos de 1807William Wilberforce foi influente para a libertação dos negros.

Os Luteranos e a escravidão:

A Igreja Luterana foi amargamente dividida por assuntos teológicos e políticos, os mesmos problemas que dividiu a nação em uma guerra civil. A questão da escravidão foi debatida muito antes dos Estados Unidos se dividido pela Guerra Civil. “Na verdade, muito antes da criação da Confederação e o estabelecimento de uma igreja luterana do Sul, as instituições da escravidão e um crescente sentimento de distinção entre Norte e Sul tinham preparado o terreno para essa evolução.” Foi surpreendente, contudo, que a Igreja Luterana entrou no debate sobre a escravidão relativamente tardia, quando comparado a outras denominações. Os metodistas, presbiterianos, batistas ja vinha discutindo a questão da escravidão desde o final de 1700. Dentro da Igreja Luterana, um dos primeiros adversário da escravidão foi o Sínodo Franckean do Estado de Nova York.

Pregadores Luteranos do Norte denunciou o longo silêncio de suas próprias igrejas e outros sobre a questão da escravidão, e confessou que, ao tentar preservar uma falsa paz que tinham, provavelmente, contribuíram para a calamidade da guerra. (Paul A. Baglyos, Luterana Historical Society do-Newsletter Mid Atlantic, Inverno 1999)

Os luteranos do sul retiraram os seus homólogos do Norte, e em 1863 formaram uma nova organização, conhecida como o Sínodo Geral do sul. Embora muitas outras questões podem ter contribuído para a guerra, a disputa principal na Guerra Civil Americana foi a escravidão e, especialmente, a sua expansão para novos territórios ocidentais. Embora alguns luteranos no Norte eram abolicionistas radicais (o Sínodo Franckean sendo uma exceção).  A maior parte dos luteranos do sul eventualmente, apoiavam  o sistema de escravidão e a questão da escravidão havia complicado as suas relações com os seus homólogos do Norte.

Os Congregacionais e a escravidão:

O nome “congregacional” geralmente descreve o seu estilo  organizacional, que promove a autonomia da igreja local e de propriedade, enquanto que promovem companheirismo e responsabilidade entre as Igrejas a nível Nacional.

A Igreja Congregacional foi a primeira igreja da América a se levantar contra o racismo e a escravidão. Também fundou a American Missionary Society(1849) para ajudar na liberdade dos escravos.

Em 1785, a Igreja Congregacional ordenou Lemuel Haynes, o primeiro Afro-americano a ministrar na América.

Entre as denominações protestantes, os congregacionais foram os mais abertamente contra a escravidão.

Nas igrejas congregacionais não aconteceu a divisão entre igrejas do norte e igrejas do sul, acreditamos que divido o seu sistema onde cada congregação local é autônoma e independente.

Em resumo, o protestantismo nos Estados Unidos sofreu grandes consequências, como a divisão e o cisma, com o pecado da escravidão. Nas denominações metodista, batista e presbiterianos, outras questões contribuíram para o racha, mas a escravidão foi a de maior gravidade, em cada caso.  No caso dos anglicanos, luteranos e congregacionais a questão escravista tem suas particularidades, como: sua relação com a escravidão te acontecido fora dos Estados Unidos em outras colônias e até mesmo na Inglaterra que é o caso dos anglicanos; os luteranos apesar de também terem se dividido entre a questão da escravidão, entrou no debate sobre a escravidão já bem mais tarde; Entre as denominações protestantes os congregacionais foram os mais abertamente contra a escravidão, os primeiros da América a se levantar contra o racismo e a escravidão.

Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut