
Retrato artístico de um caçador-coletor do sudeste europeu da cultura gravetiana, que data de 33.000 a 26.000 anos atrás, foi inspirado em evidências genéticas recentemente analisadas e em achados arqueológicos anteriores. Credito: Tom Bjoerklund
Estudos recentes sobre o DNA antigo de 348 indivíduos que viveram na Europa entre 3.000 e 8.000 anos atrás revelaram uma descoberta fascinante: a pele clara, hoje associada aos europeus modernos, pode ter se tornado predominante há menos de 3.000 anos. O estudo foi liderado por Guido Barbujani, da Universidade de Ferrara, na Itália, e revela informações surpreendentes e revolucionárias sobre as raízes genéticas dos antigos europeus. Analisando o DNA de indivíduos que viveram na Europa entre 45.000 e 1.700 anos atrás, os resultados sugerem que a maioria dos europeus tinha pele escura até cerca de 3.000 anos atrás. Essa descoberta é um chamado importante para repensar e revalorizar a presença africana na construção da história europeia.
Essa descoberta desafia a versão tradicional que situa a pele clara como uma característica ancestral e imutável dos povos europeus, apontando que, por milênios, a maioria dos habitantes da Europa teve pele escura. Outro aspecto interessante do estudo é que ele desmentiu a ideia de que os humanos modernos herdaram a pele clara dos neandertais, que ocuparam a Europa por milhares de anos antes da chegada dos humanos modernos. Embora haja evidências de que os dois grupos se cruzaram, a pesquisa genética indica que a pele clara se desenvolveu de forma independente nos humanos modernos.
Essa revelação nos convida a refletir sobre a centralidade da África e das populações de pele escura na história da humanidade, sob a luz da Afrohumanitude que nos lembra que a humanidade nasceu na África, berço da diversidade genética, cultural e fenotípica. A pele escura, característica marcante dos primeiros seres humanos, foi uma adaptação evolutiva crucial para a sobrevivência sob o intenso sol africano. Quando os primeiros humanos migraram para outras regiões do planeta, incluindo a Europa, levaram consigo essa herança biológica e cultural. A pesquisa genética recente reforça essa ideia, mostrando que a pele clara não é uma característica “original” dos europeus, mas sim uma adaptação posterior, possivelmente ligada à necessidade de síntese de vitamina D em ambientes com menor incidência solar.
Essa descoberta também nos convida a questionar as versões históricas e científicas que, durante séculos, privilegiaram a pele clara como padrão de beleza, normalidade e até superioridade. A Afrohumanitude nos desafia a desconstruir essas hierarquias, lembrando que a diversidade humana é um reflexo de nossa capacidade de adaptação e resiliência. A pele escura, longe de ser uma “exceção” ou uma “marca de diferença”, é uma das expressões mais antigas e fundamentais da humanidade.
Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut
Imagem: Science News
Referências
REICH, David; MATHIESON, Iain et al. The genetic history of Europeans over the last 10,000 years”* (Estudos genéticos sobre a história da população europeia). Disponível em: https://www.nature.com
ORIGENS AFRICANAS DA HUMANIDADE – STRINGER, Chris. “Lone Survivors: How We Came to Be the Only Humans on Earth”. Livro que aborda as origens africanas da humanidade e as migrações que levaram à ocupação do planeta. – DIAMOND, Jared. “Guns, Germs, and Steel”. Discute a evolução humana e a adaptação a diferentes ambientes.
PELE ESCURA E ADAPTAÇÃO EVOLUTIVA – JABLONSKI, Nina G. “Living Color: The Biological and Social Meaning of Skin Color”. Explora a evolução da pele humana e a importância da melanina na adaptação ao sol. Artigo: “The Evolution of Human Skin Color” (publicado na Scientific American).
CRÍTICAS ÀS NARRATIVAS EUROCÊNTRICAS
– MBEMBE, Achille. “Crítica da Razão Negra”. Analisa as estruturas de poder que marginalizam as narrativas africanas.
– FANON, Frantz. “Pele Negra, Máscaras Brancas”. Explora a construção racial e a descolonização do pensamento.
AFROHUMANITUDE – Conceito desenvolvido por Hernani Francisco da Silva, que valoriza a centralidade da África na construção da humanidade. África onde a humanidade surgiu e Humanitude o vínculo universal que liga toda a humanidade. Disponível em: https://afrokut.com.br/afro-humanitude/