Manifesto de apoio à Yalorixá e ativista pelos direitos humanos Mãe Beth de O’xum

O Movimento Negro Evangélico em Pernambuco, manifesta apoio à Yalorixá e ativista pelos direitos humanos Mãe Beth de O’xum, mulher íntegra, comprometida com a promoção da justiça social para a população negra.

No último dia 17 de Novembro, após expressar sua indignação (que para nós não é apenas individual, mas coletiva), diante das sistemáticas práticas racistas perpetradas contra o povo de terreiro, e protagonizada por alguns pastores evangélicos, Mãe Beth de O’xum está sendo processada por membro (ou membros) da banca evangélica estadual que alega se sentir ofendido com as palavras da sacerdotisa.

Reconhecemos na manifestação da Mãe Beth de O’xum uma expressão da condição de injustiça social em perseguição e intolerância religiosa sofrida pelos povos de religiões matrizes afro-brasileiras. Pois sabemos que, segundo dados do Dique 100 (2018), as religiões de matrizes africanas, umbanda e candomblé são as principais vítimas do racismo religioso habitualmente cometido por pessoas ou grupos ditos cristãos no Brasil. Diante disso, e até o presente momento, desconhecemos projetos e ações propostas ou criadas pelos acusadores de Mãe Beth, e das bancadas evangélicas de modo geral, para eliminar esse tipo prática criminosa que é recorrente no segmento de seus adeptos religiosos.

Sublinhamos ainda, que defendemos o princípio de laicidade do Estado Democrático, a liberdade de expressão, o respeito à diversidade religiosa em todas as suas manifestações e expressões, e o combate veemente a qualquer prática racista e sexista, seja ela originada de um único líder religioso ou de um grupo deles. Nós do Movimento Negro Evangélico em Pernambuco somos população negra, respeitamos a trajetória da religiosidade e fé de matriz afro-brasileira para a resistência e sobrevivência do povo negro até os dias atuais e na construção de sociedade brasileira.

Recife, 23 de Novembro de 2019.
Colegiado do Movimento Negro Evangélico em Pernambuco.

Racismo na Igreja Batista brasileira

O RACISMO À BRASILEIRA DA CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA DE 1871 à 2019

(Nota de repúdio do Movimento negro evangélico do Brasil)

A primeira igreja Batista do Brasil, surgiu em 1871, na cidade de Santa Bárbara do Oeste. Ela foi fundada por pastores do Sul dos EUA, que eram escravagistas, não só trouxeram escravizados como tem relatos oficiais de cartas de pastores Batistas recomendando seus colegas a plantarem igrejas no Brasil. Por ser um país em que tinha um sistema escravagista, muito próximo com o Sul dos EUA.

Nunca houve carta da CBB pedindo perdão as irmãs e irmãos negros brasileiros, A CBB deve perdão pela sua omissão durante o processo da escravidão no país. A CBB nega o racismo institucional vigente na estrutura da organização atualmente. A mais poderosa instituição batista do país tem como seu principal evento para a juventude, o congresso Despertar, ele ocorre bienalmente. Pela primeira vez na história da denominação uma edição do evento trataria do tema “decolonizando o olhar: O racismo atinge a igreja?”. Com a presença de Marco Davi e Fabíola Oliveira. Até que um pastor branco que reside na Flórida começou a perseguir os convidados. Então a CBB, entrou em contato com a coordenação da juventude Batista brasileira, ordenando desconvidar o Marco e a Fabíola.

O evento contava com 35 mesas de debate e a ÚNICA em que os preletores foram desconvidados foi a que tratava sobre racismo. Na tentativa de amenizar a situação, transformaram a mesa de debate, em uma roda de diálogo. Agora, analisem seriamente a situação. Houve uma roda de diálogo sobre racismo, dentro de um ato/processo de racismo institucional. Após toda a exposição dos convidados, ainda assim, houve uma conversa sobre o tema.

O Movimento Negro Evangélico do Brasil entende o ato, como uma violação principalmente aos convidados que foram expostos e humilhados institucionalmente. Convidados estes, que são referência como ativistas dentro do movimento negro, de fé evangélica. Entendemos que as pessoas negras que participaram do processo de construção também foram violadas ao ter que obedecer uma atitude racista da instituição. Se querem nos colocar uns contra os outros, estaremos em posição de repreensão e exortação em amor. Porém, também com muita indignação, pois onde o ódio está sendo servido devemos nos levantar da mesa e ir comer com os que foram odiados.

O movimento negro evangélico entende que o racismo institucional se configura explicitamente como uma violação dos direitos humanos e um pecado estrutural, além de que, em nossa constituição Racismo se configura crime. A reconciliação só é possível através do arrependimento. Rogamos ao Eterno que o espírito de justiça caia sobre toda injustiça praticada. Entendemos que todos que têm sede e fome de justiça, se levantam profeticamente para denunciar e combater o Racismo nesse país.

Movimento Negro Evangélico do Brasil

Qual a cor da sua fé?

Diálogo entre os pastores Ariovaldo RamosMônica Francisco Marco Davi Oliveira sobre evangélicos, negritude e racismo

O auditório do Sindicato dos Bancários no centro do Rio de Janeiro foi o ponto de encontro para mais de cem pessoas na noite da última sexta (15), apesar da chuva que insistia em cair na cidade. A maior parte do público: evangélicos negros das mais diversas igrejas e denominações, e de diversas regiões do Rio. O evento promovido pela Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito com apoio do Movimento Negro Evangélico, dentro dos 21 Dias de Combate ao Racismo foi uma referência para ampliar as diversas iniciativas que acontecem entre os evangélicos para debater a presença dos negros dentro das igrejas protestantes e o combate ao racismo – até mesmo dentro das próprias instituições religiosas.

O encontro reuniu os pastores Ariovaldo Ramos, um dos coordenadores da Frente de Evangélicos, a pastora Mônica Francisco, deputada estadual pelo PSOL no Rio de Janeiro e o pastor Marco Davi de Oliveira, um dos fundadores do Movimento Negro Evangélico e pastor da Nossa Igreja Brasileira – uma igreja batista que existe há um ano no Rio tendo como proposta construir uma liturgia a partir dos elementos culturais do Brasil.

Além do ministério pastoral, os três tem em comum o viver na pele a realidade racial. Três negros, com trajetórias que possuem similaridades e divergências. Ariovaldo se converte quase adolescente. Mônica quase adulta. Marco Davi nasceu em família evangélica, com pais que se converteram na juventude.

Para nenhum dos três a vida foi fácil. Como – ainda – não é fácil para nenhum negro brasileiro. Mônica Francisco, que está no primeiro mandato na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, começou seu ativismo político quando as chuvas destruíram parte da Morro do Borel, e ela se envolveu na luta por moradia. A conversão veio depois, na Igreja Universal do Reino de Deus. Chegou a estudar na Escola de Obreiros, de onde saiu para a igreja batista. De batista, foi para uma igreja pentecostal, onde é pastora há três anos. Nesse caminho, a militância a levou para a Faculdade de Ciências Sociais.

Filho de pai operário e mãe costureira, Ariovaldo Ramos viveu a infância e a adolescência na periferia, em São Paulo e em Guarulhos. É de sua história pessoal, como ter morado em cortiço, que carrega o compromisso com os pobres. A conversão foi na Igreja Metodista Livre. Pastor de formação e estudioso de filosofia, está envolvido com o ministério religioso desde 1974.

Quando as chuvas causaram um estrago sem tamanho no estado do Rio em 1966, deixando 250 mortos e mais de 50 mil desabrigados, os pais de Marco Davi – que perderam a casa na tragédia – foram residir num espaço da Primeira Igreja Batista em Teresópolis. Quando conseguiram ter um lugar para morar, as dificuldades eram extremas, incluindo fome. Aos 15 anos decidiu que seria pastor. Aos 20 anos foi para o Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. É no exercício do ministério pastoral que surge o incomodo com a questão racial e os posicionamentos das igrejas sobre a identidade negra e o racismo.

Identidade negra – Durante o encontro da Frente, Ariovaldo destacou a importância de demarcar a identidade negra e cristã, enfatizando que o racismo no Brasil é produto de uma falha na compreensão do sentido da vida cristã: “As igrejas protestantes produziram e mantiveram o racismo no país”.

Mônica fez uma caminhada pela história recente das igrejas evangélicas pentecostais e suas omissões diante do racismo. A deputada apontou os problemas da igreja, a opressão sobre as mulheres e a juventude: “Cresce o número de desigrejados por causa da postura da igreja. É preciso pedir perdão”.

Marco Davi propôs o equilíbrio entre os pontos negativos e positivos da igreja, e o quanto a igreja foi fundamental para a promoção da população negra: “Há sentimento de pertencimento, a sociedade brasileira vê o corpo negro com suspeição, e a igreja – que é um espaço sagrado – acolhe esses corpos, onde nos se tornam sujeitos”.

As abordagens diferentes na forma, idênticas na denúncia do racismo, deram o tom do debate, suscitando a participação do público. As perguntas revelaram o quanto esse assunto precisa ser abordado nos estudos bíblicos, em congressos, seminários, simpósios e nos púlpitos das igrejas. Os evangélicos brasileiros, segundo dados do Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE) mapeados no Censo 2010, são em maioria negros e pobres, que vivem com renda per capita inferior a um salário mínimo por mês.

Por Nilza Valeria Zacarias Nascimento, jornalista. Coordenadora da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito

Assista o vídeo com o diálogo Qual a cor da sua fé?

13 de maio, uma data que nos jogou ao léu

Por mais de três séculos, o negro escravizado impulsionou a economia e serviu de base à pirâmide social brasileira; durante esse período, reações individuais e coletivas – os levantes – representaram a outra face das relações entre senhores e escravos no Brasil. Humilhação ou revolta – a dominação teve limites preciosos durante praticamente todo o período colonial.

Só no final do século XVIII, quando as idéias dos liberais europeus passaram a ser difundidas entre nós, é que se começou efetivamente a considerar a possibilidade da extinção do cativeiro.Tornaram-se comuns as grandes manifestações de rua. Repetiam-se as passeatas e comícios onde a palavra de ordem era a frase de José do Patrocínio: “A propriedade do escravo é um roubo” Finalmente, em 1888, os antiescravistas conquistaram a maioria no Parlamento.

Refletindo a nova correlação de forças, a 7 de maio de 1888 o Congresso aprovava, por imensa maioria, um projeto de lei com o seguinte texto: “Artigo 1 ° . É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil. Artigo 2° . Revogam-se as disposições em contrário”.

Assinado a 13 de maio pela regente do trono, Princesa Isabel, o projeto transformou-se na Lei Áurea. Entretanto, ao contrário do que se esperava, a abolição não significou a emancipação efetiva da população escravizada.

Sem medidas institucionais que promovessem sua integração à sociedade, os negros foram entregues à própria sorte. Desprotegidos e discriminados, acabaram engrossando os contingentes marginalizados que se aglomeravam na periferia das grandes cidades.

Por  Luiz de Jesus