O Movimento da Parditude: Surgimento e Controvérsias

Nas últimas décadas, o Brasil tem observado uma mudança significativa em seu cenário racial. A população que se identifica como negra, composta por pessoas de cor parda e preta, agora constitui a maioria estatística do país. Leia o artigo: Os pardos são a maioria dos brasileiros, o que isso muda na Parditude e na Negritude? Este fenômeno tem gerado debates intensos, especialmente nas redes sociais, sobre identidade racial e as políticas públicas voltadas para essa população. No centro dessas discussões, emerge o movimento da Parditude. Este movimento visa reconhecer e celebrar a identidade das pessoas pardas como uma categoria distinta dentro da população negra. No entanto, esta iniciativa tem provocado reações mistas, especialmente entre os militantes do Movimento Negro. Alguns membros do Movimento Negro acusam a Parditude de tentar dividir o movimento e de ser uma ferramenta utilizada pela direita para enfraquecer a luta pelos direitos dos negros. Eles argumentam que a fragmentação da identidade negra pode diluir a força política e social conquistada ao longo de décadas de luta.

A discussão sobre a identidade dos mestiços é vista como necessária e há muito aguardada dentro do Movimento Negro. No entanto, o debate tem se mostrado divisivo, com trocas de acusações entre alguns membros da Parditude e militantes do Movimento Negro. Alguns argumentam que “ser negro está na moda” e que os pardos estão se apropriando das políticas voltadas para os negros, com uso de adjetivos pejorativos direcionados às pessoas pardas. Esta visão desconsidera o fato de que muitas dessas políticas foram formuladas com base no quantitativo da soma das populações parda e preta. Recentemente, o Mestre em Antropologia Social Mauro Baracho, da página @afroestima2 no Instagram, ofereceu uma análise crítica ao conceito de “parditude”. Em sua análise, Baracho expressa desconforto com a comparação dos movimentos negros aos eugenistas, uma comparação feita por alguns membros do movimento da Parditude. Ele reafirma a reivindicação do Movimento Negro de incluir os pardos na categoria negro, destacando a importância da união na luta contra o racismo.

Vale lembrar que o Movimento Negro, especialmente nas décadas de 70, 80 e 90, desempenhou um papel crucial na formulação da identidade negra como categoria política. A campanha do Censo de 1990, promovida por várias organizações civis com o slogan “Não deixe sua cor passar em branco – use o bom c/senso“, exemplifica esse esforço. Na época, houve discussões sobre a eliminação da categoria parda em favor da categoria negro, argumentando que se não havia diferentes categorias de cor para a raça branca, o mesmo deveria valer para a raça negra. Uma reportagem no site #Colabora, do jornalista Igor Soares, aborda uma fala do Frei David, diretor da Educafro, onde afirma que é preciso tratar da questão da Parditude com ‘seriedade”.

O Brasil sempre fugiu do debate racial”, afirma o diretor da ONG, que ressalta que o país precisa fazer reparações pelos danos da escravatura. Para ele, o termo usado pelo IBGE é, de fato, questionável, uma vez que é preciso saber que pardos são esses. “Nos anos 1970, a comunidade lutou para abandonar o uso do termo ‘pardo’. Entendemos que há o ‘pardo-preto’, que sofre racismo constantemente, o ‘pardo-pardo’, que pode sofrer racismo, e ‘pardo-branco’, que nunca sofre racismo”, afirma, ressaltando que é uma interpretação do atual ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, adotada pela EducAfro. (#Colabora 2025)

A fala de Frei Davi, diretor da Educafro, traz à tona questões fundamentais sobre a complexidade da identidade racial no Brasil. Ao identificar diferentes categorias de “pardos” — ‘pardo-preto‘, ‘pardo-pardo‘ e ‘pardo-branco‘ — ele destaca como a experiência do racismo varia significativamente entre essas categorias. Além disso, ele aponta preocupações sobre a possibilidade de fraudes em ações afirmativas, caso pessoas brancas se passem como pardas. A distinção feita por Frei Davi entre ‘pardo-preto’, ‘pardo-pardo’ e ‘pardo-branco’ ilustra a diversidade de experiências dentro da categoria “pardo”. Conforme ele menciona, ‘pardo-preto’ refere-se àqueles que sofrem racismo constantemente, enquanto ‘pardo-pardo’ pode ou não sofrer racismo, e ‘pardo-branco’ não sofre racismo. Essa diferenciação reconhece que a vivência do racismo não é homogênea e que a cor da pele influencia diretamente essas experiências.

O debate sobre a identidade racial no Brasil é complexo e multifacetado. Embora a discussão sobre a identidade parda seja válida e necessária, é crucial que essa conversa não leve à fragmentação do movimento negro. O objetivo deve ser a união e o fortalecimento da luta contra o racismo, reconhecendo a diversidade dentro da população negra e trabalhando juntos por um futuro mais justo e igualitário. A unificação da luta do Movimento Negro e da Parditude é essencial para enfrentar os desafios e injustiças que ainda persistem na sociedade brasileira. Por meio do diálogo respeitoso, reconhecimento da diversidade, educação, fortalecimento de políticas públicas, parcerias estratégicas e celebração das conquistas, é possível construir um movimento mais coeso e forte, capaz de promover mudanças significativas e duradouras. A crescente presença das redes sociais como palco para discussões sobre questões raciais evidencia a importância de abordagens inovadoras para promover a compreensão e a justiça. Nesse contexto, a AfroHumanitude surge como uma abordagem que pode enriquecer o debate e contribuir para a resolução de controvérsias relacionadas à Parditude e ao Movimento Negro. Baseada nos princípios de respeito, empatia e reconhecimento da humanidade compartilhada, a AfroHumanitude propõe um novo paradigma para tratar de questões raciais de maneira mais inclusiva e construtiva.

A AfroHumanitude é uma filosofia que valoriza a dignidade e a humanidade de todas as pessoas. Ao promover uma compreensão mais profunda das realidades vividas pelas pessoas negras, a AfroHumanitude busca construir pontes de empatia e solidariedade entre diferentes grupos raciais. Esse conceito se fundamenta na ideia de que o reconhecimento mútuo e o respeito pelas diferenças são essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Nas redes sociais, onde as discussões sobre questões raciais frequentemente se tornam acaloradas e polarizadas, a AfroHumanitude pode desempenhar um papel crucial. Ao incentivar o respeito e a empatia nas interações online, essa abordagem ajuda a criar um ambiente mais saudável para o diálogo. Em vez de perpetuar divisões e preconceitos, os princípios da AfroHumanitude promovem a compreensão mútua e a cooperação. Conforme destacado por Frei David, diretor da Educafro, a questão racial no Brasil é frequentemente evitada, e é necessário abordar esse tema com seriedade. A Parditude, como conceito discutido atualmente, traz à tona preocupações sobre a identificação racial e as implicações para ações afirmativas. A AfroHumanitude pode contribuir para esse debate ao fornecer uma estrutura que reconheça as nuances e complexidades da identidade racial, evitando generalizações e estereótipos prejudiciais.

Ao integrar a AfroHumanitude em iniciativas educacionais e políticas de justiça social, podemos criar uma base mais sólida para a promoção da equidade racial. Isso inclui o fortalecimento de programas que visem à reparação histórica e a implementação de ações afirmativas de maneira justa e eficaz. A AfroHumanitude oferece uma abordagem promissora para enfrentar as controvérsias raciais observadas nas redes sociais e além. Ao promover o respeito, a empatia e o reconhecimento da humanidade compartilhada, essa filosofia pode ajudar a transformar o debate racial em uma oportunidade para a construção de uma sociedade mais justa e harmoniosa. Adotar os princípios da AfroHumanitude é um passo importante na jornada rumo à verdadeira equidade racial e ao fortalecimento do Movimento Negro no Brasil.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

A importância de reconhecer a Parditude

A Parditude é um conceito que busca reconhecer e valorizar a identidade e a cultura das pessoas pardas ou mestiças no Brasil. Em um país marcado pela miscigenação, os pardos são a maioria dos brasileiros, a parditude destaca as experiências únicas e os desafios enfrentados por aqueles que possuem uma herança racial mista, geralmente envolvendo ancestrais indígenas, africanos e europeus. Assim, a Parditude é uma forma de afirmar a identidade mestiça, reconhecendo a riqueza cultural e a diversidade que essa mistura representa. Ela se posiciona contra o racismo e o apagamento histórico que muitas vezes invisibiliza as pessoas pardas, forçando-as a se enquadrarem em categorias raciais binárias.

As pessoas pardas, no Brasil, frequentemente enfrentam uma série de desafios, incluindo: a sensação de não pertencimento a um grupo racial específico, o que pode levar a um sentimento de exclusão social e apagamento de ancestralidade; a falta de reconhecimento e representação nas políticas públicas e na sociedade em geral, o que pode resultar em consequências psicológicas graves;  o constante questionamento sobre a própria “raça” e a pressão para se autodeclarar de uma forma específica.

A importância de reconhecer a  Parditude é essencial para entender a complexidade das relações étnico-raciais no Brasil. Ela permite que as pessoas pardas afirmem sua identidade e lutem por seus direitos, contribuindo para uma sociedade mais inclusiva e justa.  A Parditude, assim como a Negritude, é uma forma de resistência e afirmação cultural, mostrando que a diversidade é uma força e não uma fraqueza. Ao valorizar a Parditude, celebramos a riqueza da diversidade e promovemos a igualdade racial. Isso inclui a aceitação e o orgulho de suas origens múltiplas, bem como a luta contra o racismo e o apagamento histórico que muitas vezes enfrentam. Além disso, é uma forma de afirmar a cidadania e os direitos dos pardos na sociedade brasileira. Nessa perspectiva, é fundamental compreender que a Parditude não é separada da NegritudeIndigenitude e da Branquitude, pois compõe a essência da Afro-humanitude que mostra que a humanidade é uma só, mas com múltiplas expressões.

Lembrando que a  AfroHumanitude propõe que todos os seres humanos pertencem a uma única espécie, o Homo sapiens, e que as diferenças entre nós são superficiais e não devem ser usadas para justificar discriminação ou hierarquias sociais. A ciência moderna, especialmente a genética, tem mostrado que a variação genética dentro de qualquer grupo racial é maior do que a variação entre grupos diferentes. Isso significa que as categorias raciais tradicionais não têm uma base biológica sólida.

Entretanto, as categorias raciais binárias, como “branco” e “negro”, foram historicamente usadas para classificar e hierarquizar pessoas com base em características físicas visíveis, como a cor da pele. Essas classificações foram amplamente utilizadas durante o colonialismo e a escravidão para justificar a exploração e a opressão de pessoas. No entanto, essas categorias são simplificações que não capturam a complexidade da diversidade humana. A aceitação da AfroHumanitude e a rejeição das categorias raciais binárias são passos importantes para reconhecer e valorizar a Parditude.

No entanto, é crucial continuar a refletir e agir sobre como a AfroHumanitude pode desempenhar um papel vital na valorização da Parditude e na promoção de uma sociedade mais inclusiva e equitativa, respeitando a diversidade e promovendo a inclusão.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut