Simeão o Niger e Simão de Cirene são a mesma pessoa?

As interpretações eurocêntricas da Bíblia, tem escondido muitas histórias dos povos africanos no livro sagrado. Contudo, a Sankofa está brilhando sobre a antiguidade bíblica, e camadas de preconceitos estão sendo eliminados. No seu lugar temos uma base com o surgimento de estudos críticos e investigativos sobre a presença negra na Bíblia e a recuperação de pessoas negras nas histórias bíblicas. Consequentemente, as pessoas de ascendência africana têm agora a oportunidade de redescobrir menções consistentes e favoráveis aos seus antepassados nas páginas da Bíblia.

Nesta direção trazemos a história de Simão de Cirene e Simeão o Niger, que conforme evidências, são a mesma pessoa. Também para responder as diversas indagações dos nossos leitores que depois de lerem o artigo: “A Paixão de Cristo e do Negro Simão”, sempre perguntam: Simeão o Niger e Simão de Cirene são a mesma pessoa?

Então, vamos aos fatos:

Simão de Cirene, mencionado nos Evangelhos: Mateus (27:32), Marcos (15:21) e Lucas (23:26). Cada um desses relatos bíblicos nos conta algo diferente sobre Simão de Cirene. Um homem de origem africana, que vivia em Cirene, uma cidade no norte da África. Ele foi forçado a carregar a cruz de Jesus, mas acabou se tornando um seguidor do Cristo. Conforme lemos em Marcos 15:21:

No caminho, os soldados encontraram um homem chamado Simão, que vinha do campo para a cidade. Esse Simão, o pai de Alexandre e Rufo, era da cidade de Cirene. Os soldados obrigaram Simão a carregar a cruz de Jesus.”

Simeão o Niger (niger” significa “negro” em latim) foi um líder da igreja primitiva em Jerusalém. Ele é mencionado no livro de Atos dos Apóstolos, identificado com um dos profetas e doutores de Antioquia citado em Atos 13:1:

Na igreja de Antioquia, havia profetas e mestres: Barnabé; Simeão, chamado Níger; Lúcio, de Cirene; Manaém, que fora criado com Herodes, o tetrarca; e Saulo.”

Lúcio de Cirene e Simão o Negro, estavam juntos em Antioquia, orando e jejuando e participando da missão do Espírito de enviar navios escolhidos para a primeira viagem missionária. Note-se que este núcleo africano de missionários precedeu Paulo no testemunho do evangelho, eles ordenaram Paulo (Atos 13:3). Relato que reflete especificamente a importância influência da diáspora africana no cristianismo primitivo.

Evidências que podemos afirmar que Simeão o Niger e Simão de Cirene são a mesma pessoa:

  • Com relação a diferença nos nomes: Simão e Simeão, são grafias alternativas do mesmo nome.
  • Cirene é uma cidade na costa africana, um lugar onde as pessoas tem a pele escura: Simão e Simeão, eram negros.
  • Se verificarmos Atos 11:19-21, descobrimos que a igreja em Antioquia, onde reaparece como Simeão o Niger, foi fundada por homens de Chipre e Cirene. Então aqui está outra Evidência. Não se diz que Simeão Níger seja de Cirene em Atos 13, nem de outro lugar, então Cirene é uma possibilidade, considerando que ele era líder de uma igreja fundada por cireneus.
  • Marcos 15:21 menciona os filhos de Simão, Alexandre e Rufo. Sabemos pela tradição e por várias palavras latinas no texto grego que Marcos estava escrevendo seu Evangelho para um público predominantemente romano. Então isso pode ajudar a conectar Rufo com o Rufos mencionado por Paulo em Romanos 16:13. Sabemos por Romanos 16:13 que Paulo aparentemente conhecia a mãe de Rufo.

Então com essas evidências, podemos afirmar, Simão de Cirene e Simeão o Niger, são a mesma pessoa:

Simão de Cirene tornou-se um seguidor de Jesus e seus filhos eram bem conhecidos na igreja primitiva. Mais tarde, ele viajou para Antioquia e ajudou a iniciar a igreja lá. Sua esposa e filhos estavam com ele. Em Antioquia recebeu o apelido de Simão o Negro. Anos mais tarde, após a morte de Simão/Níger, sua esposa e filho Rufos estavam morando em Roma. Eles eram proeminentes na igreja local, em parte por causa do papel único que Simão desempenhou na história do Evangelho. Escrevendo para um público romano, Marcos menciona Rufo e Alexandre, porque ele e a igreja romana os conheciam pessoalmente. Paulo, escrevendo aos romanos, cumprimenta Rufo e sua mãe pelo mesmo motivo.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

Imagem: Fotor IA

No Mapa de Estrabão o Oriente Médio fazia parte da África

A divisão do mundo em continentes, na atualidade, divide o mundo em seis continentes: África, América, Ásia, Europa, Oceania e Antártida. De acordo com essa divisão, o Oriente Médio faz parte da Ásia. Portanto, antigamente, a região era conhecida como “Crescente Fértil” devido ao seu solo rico e abundância de agricultura. O termo “Oriente Médio” foi cunhado pela primeira vez pelos britânicos no início do século XX para se referir à área entre o Mediterrâneo oriental e o subcontinente indiano. Geograficamente e antropologicamente o Oriente Médio está à parte da África, geopoliticamente é a Ásia. Além disso, antropologicamente, a maioria, senão todas as populações, nem sequer são populações indígenas.

O mapa, que foi escrito no primeiro século dC, divide o mundo em três continentes: Europa, Ásia e África. O Oriente Médio está localizado na parte sul da Ásia, mas Estrabão o incluiu na ÁfricaEstrabão era um geógrafo grego que viajou extensivamente pelo mundo antigo. Ele era fascinado pela geografia e pela cultura de diferentes lugares. Estrabão é considerado um dos fundadores da geografia moderna. Ele foi o primeiro a tentar descrever o mundo de forma sistemática e abrangente. Sua obra teve uma grande influência nos geógrafos posteriores, incluindo Ptolomeu e Mercator. A Geografia é a obra mais importante de Estrabão. Ela é dividida em 17 livros, cada um dos quais trata de uma região específica do mundo. A obra é uma fonte valiosa de informações sobre a geografia, a história e a cultura do mundo antigo.

Seu mapa é um dos mais importantes documentos da geografia antiga:

A inclusão do Oriente Médio na África por Estrabão pode ser explicada por vários fatores. Em primeiro lugar, o Oriente Médio está localizado na mesma massa continental da África. Em segundo lugar, as culturas do Oriente Médio e da África têm muitas semelhanças. Em terceiro lugar, Estrabão pode ter visto o Oriente Médio como uma extensão da civilização egípcia, que ele considerava parte da África.

Entretanto, não deve-se olvidar de uma reflexão sobre o contexto bíblico do primeiro século: na região de Israel e o Mapa de Estrabão. Na perspectiva do Mapa de Estrabão, Oriente Médio, incluindo Israel, estava localizado na África. Como vimos, o mapa divide o mundo em três continentes: Europa, Ásia e África. Portanto, se Jesus nasceu em Belém de Judá, como diz a bíblia, que era parte de Israel, então Jesus nasceu na África. Sabemos que a visão de Estrabão sobre o Oriente Médio como parte da África foi contestado por alguns estudiosos modernos. No entanto, seu mapa ainda é uma fonte importante de informações sobre a geografia e a cultura do mundo antigo.

Estrabão nasceu na cidade de Amasia, antiga capital do reino do Ponto, por volta do ano 60 a.C., e morreu aproximadamente no ano 24 da nossa Era. Ele estudou filosofia e geografia em Atenas, e viajou extensivamente pelo mundo antigo. Suas viagens o levaram a Roma, onde ele conheceu o imperador Augusto.

Alguns dos principais pontos de vista de Estrabão:

  • Ele acreditava que a geografia era uma ciência importante, pois poderia ajudar as pessoas a entender o mundo ao seu redor.
  • Ele argumentou que a geografia deveria ser baseada em observações e evidências empíricas, em vez de especulações.
  • Ele acreditava que a geografia deveria ser uma ciência holística, que levasse em consideração a história, a cultura e a economia dos lugares que ela descreve.

A Geografia de Estrabão é uma obra seminal que continua a ser importante até hoje. É uma fonte valiosa de informações sobre o mundo antigo e sobre a evolução da geografia como ciência.

Por Hernani Francisco da Silva  – Do Afrokut

No mês da Consciência Negra Praia Grande vai instalar o cabo submarino Firmina, do Google

O Google vai instalar cabos submarinos na costa de Praia Grande, no litoral de São Paulo. Esses cabos fazem parte do projeto chamado de Firmina, em homenagem à escritora negra Firmina dos Reis, autora de Úrsula e primeira romancista mulher do país. Em Praia Grande a previsão é que o projeto  seja concluído ainda no mês de novembro, Mês da Consciência Negra.

Este cabo fará a conexão de Myrtle Beach (EUA) à Las Toninas (Argentina).  O cabo Firmina tem dois pontos de aterragem no Brasil: Praia Grande, no litoral de São Paulo, e Fortaleza, no Ceará.

O cabo submarino Firmina do Google é uma infraestrutura de rede que está em desenvolvimento há mais de dois anos e entrará em funcionamento ainda em 2023. A instalação é realizada por seis embarcações, além dos mergulhadores, máquinas e operários em terra, na faixa de areia.

Sua finalidade é transportar dados entre a América do Norte e a América do Sul, proporcionando acesso rápido e de baixa latência aos serviços do Google, como busca, Gmail, YouTube e Google Cloud.

A homenagem a Firmina é um importante reconhecimento de sua contribuição para a cultura brasileira. Ela foi uma mulher pioneira e sua obra continua a ser relevante até hoje. O Google explicou que a homenagem a Firmina foi uma forma de reconhecer sua importância como escritora, abolicionista e defensora dos direitos das mulheres. A empresa também disse que espera que a homenagem inspire outras pessoas a aprender sobre a história e a obra de Firmina.

Maria Firmina dos Reis foi uma escritora, professora, abolicionista e defensora dos direitos das mulheres brasileira. Ela nasceu em São Luís, no Maranhão, em 1822, e morreu em 1917. Firmina foi a primeira mulher a publicar um romance no Brasil, Úrsula, em 1859. O romance conta a história de uma jovem negra que é escravizada e depois se liberta. Úrsula é um importante documento histórico da escravidão no Brasil e também é considerado uma obra literária significativa.

Além de Úrsula, Firmina também escreveu outros romances, contos, poemas e peças de teatro. Ela também foi uma importante educadora e lutou pelos direitos das mulheres.

O cabo submarino Firmina é uma importante infraestrutura de comunicação que deve beneficiar a população do Brasil e da América Latina. Ele deve ajudar a promover o desenvolvimento econômico e social da região.

Aqui estão alguns dos benefícios específicos que o cabo Firmina deve trazer para o Brasil:

● Melhoria da qualidade da internet: o cabo Firmina deve aumentar a capacidade de tráfego de dados, o que deve melhorar a qualidade da internet no Brasil. Isso significa que os usuários devem experimentar velocidades de conexão mais rápidas e tempos de resposta mais curtos.

● Redução da latência: o cabo Firmina deve reduzir a latência, o tempo de resposta da internet. Isso significa que os usuários devem experimentar uma conexão mais responsiva, o que é importante para atividades que exigem tempo real, como jogos online e videoconferências.

● Maior acesso à internet: o cabo Firmina deve ajudar a aumentar o acesso à internet no Brasil. Isso é importante para o desenvolvimento econômico e social do país, pois a internet é uma ferramenta essencial para a educação, a saúde e a comunicação.

● Crescimento do mercado de tecnologia: o cabo Firmina deve ajudar a impulsionar o
crescimento do mercado de tecnologia no Brasil. Isso é importante para a criação de
empregos e o desenvolvimento econômico do país.

Em geral, o cabo submarino  Firmina é uma importante infraestrutura que deve trazer diversos  benefícios.  Para Praia Grande, além desses benefícios, trás uma importante celebração na conclusão do projeto Firmina no Mês da Consciência Negra.

Por Hernani Francisco da Silva
Do Afrokut

A População Negra Evangélica

Em comparação com o caso dos Estados Unidos, em que existem igrejas pentecostais “exclusivamente negras”, nas quais se constituiu um importante espaço para a tomada da consciência racial, reivindicação e luta pelos direitos civis, aqui no Brasil por muito tempo as instituições cristãs foram agentes perpetuadores e legitimadores do racismo na sociedade brasileira. Essa realidade se dá por vários fatores. Segundo Vagner Gonçalves da Silva (2017), as especificidades do racismo brasileiro, o tipo de missão evangelizadora das igrejas protestantes “que enfatizam a universalidade do acesso aos dons do Espírito Santo e da prática de sua fé”, e a demonização das práticas religiosas não cristãs seriam fatores fulcrais para se entender a realidade negra e evangélica brasileira. Outro ponto de discordância nessa narrativa se refere ao lugar atribuído às heranças culturais negras e africanas na cultura brasileira, sobretudo as relativas às religiões afro-brasileiras, em que a intolerância religiosa é um entrave para o diálogo entre esses dois setores na construção de uma agenda do movimento negro evangélico.

Uma diferença importante entre os negros protestantes estadunidense e os brasileiros é que desde as suas origens o pentecostalismo dos Estado Unidos sempre esteve atrelado à espiritualidade dos povos negros escravizados que ali residiam, que com isso desenvolveram “um estilo diferenciado de culto baseado em cantos efusivos e experiências de avivamento com alegria e dança”. A expressão dessa musicalidade derivou em ritmos e estilos musicais tais como rock, blues, soul, spiritual, jazz, rap, funk entre outros, todas oriundas da ancestralidade e religiosidades africanas (SILVA, 2017).

Na realidade brasileira contemporânea de crescente intolerância religiosa e aumento do conservadorismo, formou-se nas últimas décadas uma agitação entre os fiéis evangélicos negros e com consequência houve um princípio de mobilização, o que posteriormente foi chamado de Movimento Negro Evangélico (MNE). Em sua tese de doutorado intitulada “A cor da fé: ‘identidade negra’ e religião”, Rosenildo Silva de Oliveira (2017), na sessão destinada aos evangélicos negros, argumenta que o recente processo de formação de um movimento negro antirracista dentro das igrejas evangélicas brasileiras deve ser encarado como em constante processo de construção e não como um projeto consolidado, diferentemente do caso católico que já possui grupos institucionalizados (OLIVEIRA, 2017).

Devido à sua grande pluralidade de denominações, a própria mobilização negra dentro do protestantismo é dificultada, inviabilizando o estabelecimento de organismos centralizados do MNE, visto que a sua principal característica é a descentralização de suas ações. Diferentemente do catolicismo, que conta com três grandes grupos que pautam as questões raciais dentro da mesma instituição religiosa, são eles a Pastoral Afro-Brasileira, o Instituto Mariama (organização que reúne diáconos, padres e bispos negros) e o Grupo de Religiosos e Religiosas Negros e Indígenas (GRENI), possuindo políticas coordenadas e estreita relações de cooperação, já que parte significativa dos seus integrantes pertencem às três organizações, desenvolvendo ações em conjunto. No caso evangélico, as iniciativas observáveis são de caráter independente, em sua grande maioria por meio de plataformas digitais e redes sociais (OLIVEIRA, 2017).

As primeiras iniciativas foram fóruns em redes sociais como o MSN em 2002, como o Fórum de Afrodescendentes Evangélicos, que foram se expandindo em outras plataformas como o Orkut, Twitter e Facebook reunindo evangélicos de várias denominações. Na onda deste movimento, Hernani Silva cria em 2008 o Afrokut, rede social exclusiva para a interação, criação e propagação de conteúdo produzido por negros evangélicos. Ainda nessa empreitada, o trabalho de Hernani Silva nos mostra uma tentativa de “resgate da presença negra nas raízes do cristianismo”, ao mesmo tempo que critica o que ele chama de “teologia evangélica racista”. Essas ideias foram compiladas na publicação do livro “O Movimento Negro Evangélico” (2011). Nessa obra, o autor tenta retratar a história do negro evangélico brasileiro a partir da reformulação da narrativa hegemônica que invisibiliza esses indivíduos. Isso é feito através da reinterpretação da história da presença evangélica no Brasil, por exemplo, a descoberta do pregador negro Agostinho José Pereira, apelidado de “Lutero Negro”, considerado o primeiro pregador brasileiro e fundador da Igreja do Divino Mestre em 1841 na cidade de Recife (OLIVEIRA, 2017 e SILVA, 2011).

Outra iniciativa nesse movimento tem como objetivo demonstrar a influência africana no cristianismo por meio de um resgate das heranças africanas para essa religião, colocando em evidências os personagens bíblicos negros e elementos que legitimam a luta pelos seus direitos, como a luta do povo de Deus em nome da libertação de toda forma de opressão. Esses preceitos têm ligação com a chamada “Teologia Negra”, uma variante da Teologia da Libertação, surgida nos anos de 1960 nas igrejas negras e protestantes dos Estados Unidos em um contexto de luta pelos direitos civis. A libertação da escravidão do povo hebreu no Egito é uma das passagens mais citadas dessa experiência de libertação ocorrida em terras africanas (SILVA, 2017).

Hernani Silva (2011) ainda desenvolve a ideia de que a formação do Movimento Negro Evangélico Contemporâneo teve um momento de guinada nas décadas de 1970 e 80, pois, neste recorte temporal houve diversas iniciativas institucionais e tomadas de consciência para com sua negritude. A relativa consolidação do MNE na atualidade, pós ascensão das redes sociais, transformou esse movimento em umas “das mais novas forças de combate ao racismo e de consciência negra no Brasil”, sendo a missão do MNEpromover a reflexão e o debate bíblico/teológico e em uma perspectiva negra e combater toda forma de racismo” (OLIVEIRA, 2017, p. 138 e SILVA, 2011, p. 16).

Apesar disso, o MNE também tem suas cisões internas e divergências de pautas, sobretudo no que tange à visão que cada um tem de como se dialoga com a herança africana do Brasil. Existem duas correntes que defendem abordagens distintas quanto a essa pauta. Por um lado temos os que defendem uma visão pan-africanista/afrocentrista da questão e outros com uma visão mais voltada à negritude cristã brasileira. Ambas as perspectivas têm em comum a visão de que existe uma origem africana no cristianismo, porém, se pode distinguir o pan-africanismo/afrocentrismo por defenderem uma herança exclusivamente africana, abdicando da formação miscigenada brasileira. E foi justamente essa postura defendida pelo Conselho Nacional de Negras e Negros Cristão (CNNC), durante o 1º Encontro Nacional de Negras e Negros Evangélicos, que aconteceu em Salvador em abril de 2007 (OLIVEIRA, 2017).

Por fim, Oliveira (2017) salienta que independente das visões ideológicas, dois fatores se tornaram consenso, são eles: “a tentativa de se criar uma igreja evangélica negra e o investimento na formulação intelectual de uma teologia da negritude, inclusive com a perspectiva de publicação de uma bíblia da negritude” (p.142). O autor também chama a atenção para o fato da maioria das iniciativas em torno dessa causa está nas igrejas protestantes históricas, e não nas pentecostais ou neopentecostais, das quais detêm o maior número de fiéis negros. Isso seria devido à abordagem adotada historicamente pelas igrejas pentecostais e neopentecostais, já que contra a exclusão social sofrida pelos negros historicamente “foram os pentecostais quem ofereceram acolhimento e espaços em que eles seriam valorizados, independentes de suas origens, e ofereceram a possibilidade de prosperarem materialmente” (p.144), muito embora que para isso fosse necessária uma conversão plena e rejeição de qualquer herança cultural afro-brasileira (OLIVEIRA, 2017).

De acordo com o livro “A religião mais negra do Brasil” (2015), do pastor Marco Davi de Oliveira, embasado por dados do Censo demográfico, a maioria dos brasileiros pretos e pardos (que nos parâmetros do IBGE juntos formam o grupo dos negros) que professam uma religião, ou seja, são praticantes assíduos da religião, encontra-se no segmento evangélico, mais concentrado nos protestantes pentecostal. Seu argumento é sustentado a partir da análise de que “embora cerca de 61 milhões de negros se declarem católicos contra aproximadamente 15 milhões de evangélicos pentecostais a maioria dos negros que professam o catolicismo não frequenta ativamente a igreja, ao contrário do que acontece com os negros pertencentes às igrejas evangélicas, que participam de forma efetiva de suas comunidades locais” (OLIVEIRA, 2017 e SILVA, 2017)

A despeito da afirmativa “a maioria dos negros brasileiros são evangélicos”, e considerando as tabelas 1 e 2, podemos abstrair algumas inferencias dessa análise. Primeiramente é correto afirmar que “as igrejas evangélicas de origem pentecostal detém o maior percentual de membros negros em relação ao número total de fiéis no seu segmento” (14.545.768, ou seja, 57,33%), na frente se compararmos com as igrejas evangélicas tradicionais (3.393.957 ou 46,75%)”. Dentro da Assembleia de Deus é ainda maior o percentual (cerca de 12.314.410 do total de 42.275.440 adeptos ou 29% dos evangélicos), desses 61% (7.547.959) se autodeclaram negros. Se ainda compararmos com o candomblé, teremos outra interpretação, veremos que 68% dos candomblecistas se auto declaram negros (cerca de 114.629 adeptos), portanto, em termos proporcionais o candomblé é “a religião mais negra do Brasil”, enquanto em termos absolutos o catolicismo (com 61 milhões de adeptos) também pode ser considerada “a religião mais negra do Brasil” com mais adeptos (OLIVEIRA, 2017 e SILVA, 2017).

Autor: Bruno Alcântara Conde da Silva (UFRGS) – Texto Artigo: A ascensão evangélica na política brasileira: a presença dos negros no movimento evangélico

Artigo apresentado no 45º Encontro Anual da Anpocs no SPG09. Democracia, Laicidade e Neoconservadorismos, bem como o artigo publicado nos anais, é uma versão final da pesquisa apresentada como requisito para a aprovação na disciplina “Competição Partidária e Base Eleitoral dos Partidos”, do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGCP-UFRGS)

Para ler o artigo completo: A ascensão evangélica na política brasileira: a presença dos negros no movimento evangélico.docx

Imagem: Criador de imagens do Bing

5 Santos Negros e Negras da Igreja Católica

Os Santos Negros e Santas Negras são figuras importantes na história do catolicismo. A Igreja Católica tem alguns santos e santas negros reconhecidos ao longo de sua história, mas que são uma ínfima minoria se comparados às figuras retratadas como brancas.

Para conquistar os povos colonizados, os europeus canonizaram figuras negras que pudessem ser uma forma de representação para eles. Porém a expansão foi limitada: com a escravidão no século 19, o culto às entidades negras ficou restrito e a reforma da Igreja Católica na mesma época enfatizou as celebrações de santos brancos.

Alguns exemplos de santos negros incluem:

1 – Santa Josefina Bakhita

É uma das poucas santas negras católicas. O nome “Bakhita”, que significa “afortunada”, “sortuda” ou “bem-aventurada”, não lhe foi dado ao nascer mas lhe foi atribuído pelos raptores. Foi capturada e vendida por mercadores de escravos negros no mercado de El Obeid e de Cartum  ao cônsul da Itália no Sudão, D. Calixto Legnani, que logo lhe deu uma carta de liberdade. No período de escravidão, Bakhita sofreu as humilhações, sofrimento físico, psicológico e moral dos escravizados.

Na casa do cônsul Legnani, Bakhita trabalhava como mulher livre e isto lhe deu momentos de serenidade. Quando Legnani teve de regressar ao país, Bakhita decidiu acompanhá-lo, e chegando a Gênova  é transferida para a localidade de Zianigo, ao serviço da família Michieli como “ama-seca”, e posteriormente, passou à Congregação das Filhas da Caridade de Santa Madalena de Canossa (Canossianas) de Veneza, onde recebeu os primeiros sacramentos do catecumenato, em 9 de janeiro  de 1890, foi batizada com o nome de Josefina e em 8 de dezembro de 1896 tomou o habito e ingressou na ordem das Irmãs Canossianas, com o nome religioso de Irmã Josefina.

Josefina Bakhita se destacou pela piedade e amor a Cristo e à Eucaristia, também pelo serviço social pelos demais pobres e desamparados, o que fez com que ficasse conhecida como o apelido em vêneto de “Madre Morèta” (Mãe Moreninha).

Faleceu no convento canosiano de Schio, em 1947, com a idade de 78 anos; foi enterrada no começo na capela de uma família de Schio, os Gasparella, provavelmente na espera de um sepultamento definitvo no Templo da Sagrada família. E assim foi em 1969, quando o corpo encontrado incorrupto de Bakhita foi sepultados sob o altar da Igreja do mesmo convento.

Foi beatificada em 1992 e canonizada em Roma, pelo Papa João Paulo II, em outubro de 2000.

2 – Santo Antônio de Categeró

É uma figura importante para a comunidade negra. Nasceu na cidade de Barca, Cirenaica, na África e, no início de sua vida religiosa, professava a fé em Maomé.

Por ocasião de um aprisionamento foi  escravizado,  e  levado à Sicília, para trabalhar em galeras. Vendido como trabalhador escravo a João Landavula (camponês dos arredores de Noto), transformou-se em pastor. Detentor de alma sincera, grande retidão de caráter e agudeza de espírito, aproximou-se da fé em Cristo. Muito disciplinado, sabia controlar seu corpo a ponto de vencer as fraquezas. O que se pode perceber da descrição do caráter do bem-aventurado Santo Antônio de Categeró é que o seu ascetismo foi responsável pela superação das condições sociais adversas. Quando conquistou liberdade, dedicou-se totalmente ao trabalho em hospitais (cuidar dos doentes) e à vida religiosa (homem de orações) o que o levou a ingressar para a Ordem Terceira de São Francisco e, por fim, optou por uma vida contemplativa como grande eremita no deserto. Sua morte deu-se no dia 14  de março de 1549.

O estudo do padre italiano Salvatore Guastella sobre a vida do santo – Santo Antônio de Categeró: sinal profético do empenho pelos pobres – repisa as qualidades aqui expostas, além de traçar uma possível rota do estabelecimento da fé no bem-aventurado Santo no Novo Mundo e pontuar os principais locais de sua veneração no Brasil.

3 – Nossa Senhora Aparecida

Nossa Senhora da Conceição Aparecida, popularmente chamada de Nossa Senhora Aparecida, é uma das invocações de Maria, mãe de Jesus. É a padroeira do Brasil.

O título, sempre evocado na Ladainha Lauretana, faz relação com o dogma da Imaculada Conceição. Com efeito, no dia 08 de dezembro a Igreja Católica celebra a solenidade de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, esta data lembra o dia 08/12/1854 na qual o Papa Pio IX proclama o dogma da Imaculada Conceição, porém a festa já tinha longa tradição. Esta devoção tem profunda relação com Portugal e consequentemente com o Brasil, pois desde 08 de dezembro de 1147, Portugal consagrou seu país à Imaculada Conceição.

Venerada na Igreja Católica, Nossa Senhora Aparecida é representada de pele negra por uma pequena imagem de terracota de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, atualmente alojada na Catedral Basílica de Nossa Senhora Aparecida, localizada na cidade de Aparecida, em São Paulo.

Sua festa litúrgica é celebrada em 12 de outubro, um feriado nacional no Brasil desde 1980, quando o Papa João Paulo II consagrou a basílica, que é o quarto santuário mariano mais visitado do mundo, capaz de abrigar até 30 mil fiéis.

4 – Santo Elesbão

Elesbão de Axum, também conhecido como Santo ElesbãoEla Asbá (Ella Asbeha/Atsbeha) ou Elasboas (em grego: Ελεσβόας; m. 555)  foi um rei do Império de Axum que reinou entre  os anos 493 a 531dc. É um santo da Igreja Católica, venerado no dia 27 de outubro. Representado como um rei negro da Etiópia, a veneração de Elesbão teve muita difusão no Brasil colonial entre os escravizados africanos e seus descendentes.  Seu título real era bisi lazen.

5 – São Benedito

São Benedito, o Negro, conhecido também como São Benedito, o Mouro (cor escura da pele); Benedito, o AfricanoBenedito de Palermo, é um santo católico, que possui duas versões históricas: na primeira delas, teria sido um italiano descendente de africanos escravizados na Etiópia; em outra, teria sido um mouro islâmico escravizado ao norte da África, acontecimento comum no sul da Itália na época.

Aos 18 anos de idade, decidiu consagrar-se ao serviço religioso, e aos 21, um monge dos irmãos eremitas de São Francisco de Assis chamou-o para viver entre eles. Benedito aceitou, fazendo votos de pobreza, obediência e castidade. Assim caminhava descalço pelas ruas e dormia no chão sem cobertas. Sendo muito procurado pelo povo, que desejava ouvir conselhos e pedir-lhe orações.

Cumprindo seu voto de obediência, depois de 17 anos entre os eremitas, foi designado para ser cozinheiro no Convento dos Capuchinhos.

Sua piedade, sabedoria e santidade levaram seus irmãos de comunidade a elegê-lo Superior do Mosteiro, apesar de analfabeto e leigo (sem ordenação de sacerdote). Seus irmãos o consideravam iluminado pelo Espírito Santo, pois fazia muitas profecias. Ao terminar o tempo determinado como Superior, reassumiu as atividades na cozinha do convento.

São Benedito morreu aos 65 anos, no dia 4 de abril de 1589, em Palermo (Itália). Na porta de sua cela, no Convento de Santa Maria de Jesus de Palermo, encontra-se uma placa com a inscrição em italiano indicando que era a Cela de São Benedito e, embaixo, as datas 1524-1589, indicando o nascimento e falecimento. Alguns autores indicam 1526 como o ano de seu nascimento, mas os Frades do Convento de Santa Maria de Jesus consideram que a data certa é 1524.

Em Portugal, é venerado desde o sé­culo XVI como parte das Devoções Negras.

A Igreja Católica  tem outros santos e santas considerados negros e negras, abordamos apenas esses cincos.  A celebração deles, muitas vezes é restrita a grupos específicos de devotos. Também tiveram  grande influência para trazer os povos conquistados ao catolicismo.

Do Afrokut

Branquitude e Branquidade Por Edith Piza

Embora até então os termos branquitude e branquidade tenham sido utilizados para falar da situação de privilégio que o branco detém nas sociedades estruturadas pelas hierarquias raciais, em 2005 a autora Edith Piza propõe uma nova forma de pensar as nomenclaturas. No texto publicado no Simpósio Internacional do Adolescente a autora utiliza o termo branquidade, como foi utilizada na publicação da coletânea de Vron Ware, e estabelece a seguinte definição:

Ainda que necessite amadurecer em muito esta proposta, sugere-se aqui que branquitude seja pensada como uma identidade branca negativa, ou seja, um movimento de negação da supremacia branca enquanto expressão de humanidade. Em oposição à branquidade (termo que está ligado também a negridade, no que se refere aos negros), branquitude é um movimento de reflexão a partir e para fora de nossa própria experiência enquanto brancos. É o questionamento consciente do preconceito e da discriminação que pode levar a uma ação política antirracista (PIZA, 2005, p. 07).

A autora sugere que, diferente da forma como vem sendo trabalhada até então, a branquitude seja trabalhada como uma fase de superação da branquidade. Ou seja, a branquitude não representaria uma situação em que os brancos julguem todos iguais independente da cor da pele, muito pelo contrário. Significa que este indivíduo branco reconhece a situação de vantagem estrutural baseado na brancura e nega estes privilégios através de práticas antirracistas, também, no interior do “universo” branco.

É primeiramente o esforço de compreender os processos de constituição da branquidade para estabelecer uma ação consciente para fora do comportamento hegemônico e para o interior de uma postura política anti-racista e, a partir daí, uma ação que se expressa em discursos sobre as desigualdades e sobre os privilégios de ser branco, em espaços brancos e para brancos; e em ações de apoio à plena igualdade (PIZA, 2005, 07-08).

Edith Piza chama ainda atenção para o esforço que o branco precisa realizar no sentido de negar a posição de superioridade para alcançar uma branquitude e compara esta situação com o período da adolescência em questionamentos como “o que sou e o que não sou” são frequentes. “Este movimento exige que nos questionemos em termos não apenas de relação, mas de interação, pois só na interação, não mediada pelos mecanismos institucionais e pela racionalização em torno dos nossos processos conscientes e inconscientes” (PIZA, 2005, p. 08).

A autora Ruth Frankenberg (2004) em Branquidade já chamava atenção para o esforço contínuo e diário que o branco precisa ter para se tornar vigilante e contrário a atitudes que vão de encontro a manutenção da superioridade.

O trabalho do pesquisador Lourenço Cardoso (2010) estabelece uma diferenciação que se aproxima do conceito sugerido por Edith Piza. Cardoso desenvolve duas categorias para situar a branquitude no quadro social: branquitude crítica e branquitude acrítica. Segundo ele, “a branquitude crítica refere-se ao indivíduo que desaprova publicamente o racismo”.

branquitude acrítica refere-se ao indivíduo ou coletividade que luta pela manutenção do status de superioridade racial branca. “Apesar do apoio as práticas racistas ou da inação diante delas, a branquitude acrítica pode não se considerar racista porque, segundo sua concepção, a superioridade racial branca seria uma realidade inquestionável” (CARDOSO, 2010, p. 63).

Segundo Cardoso, uma das razões para distinguir a branquitude em crítica e acrítica, se sustenta pelo fato de que os principais estudiosos estabelecem uma diferenciação ao tratar as diversas formas de racismos, mas ao definir a branquitude o fazem de maneira genérica o que não é suficiente para compreender como se configura o conflito racial que tem se perpetuado.

“Ao observar o grupo branco de longe, de repente, pode surgir a impressão de que a branquitude é homogênea, porém, com a aproximação percebe-se o quanto os brancos são diversos” (IBIDEM). Dito isto, o autor atesta a necessidade de se pensar a branquitude nos seus aspectos mais específicos e mutáveis.

Texto do artigo de Camila Moreira de Jesus:

BRANQUITUDE X BRANQUIDADE: UMA ANÁLISE CONCEITUAL DO SER BRANCO

7 valores defendidos pela filosofia Ubuntu

A filosofia Ubuntu defende uma série de valores que são fundamentais para a vida em comunidade e para a interação harmoniosa entre as pessoas.

Aqui estão 7 dos principais valores defendidos pela filosofia Ubuntu:

1. Humanidade para com os outros:

A essência de Ubuntu é “ser humano” e valorizar a importância do “eu” na busca de sentido através do encontro com o outro, numa relação de interdependência construtiva.

2. Respeito:

Este fundamento tradicional africano articula um respeito básico pelos outros. Ele pode ser interpretado tanto como uma regra de conduta ou ética social.

3. Compartilhamento e Cooperação:

Os princípios de partilha, preocupação e cuidado mútuos, além de solidariedade, são elementos constitutivos da filosofia Ubuntu.

4. Empatia:

A natureza humana implica compaixão, partilha, respeito, empatia.

5. Interdependência:

Ubuntu está intimamente ligado à relação entre as pessoas e à sua interdependência.

6. Comunidade:

Ubuntu enfatiza a importância do acordo ou consenso na cultura tradicional africana.

7. Ética do Cuidado:

Cuidar de mim, cuidar do outro e cuidar do planeta leva ao sentido e ao propósito.

Portanto, a filosofia Ubuntu é uma filosofia de vida que se baseia nos princípios da lealdade, humildade, empatia e o respeito.

Do Afrokut

o que é Afropassadismo?

O conceito de Afropassadismo  aqui proposto é a Sankofa, que nos incentiva a olhar para nosso passado ancestral para reunir sabedoria e compreensão que podem nos ajudar a moldar nosso presente e futuro.  Em essência: Afropassadismo se inicia  em África na origem da humanidade e é a Sankofa, que enfatiza a importância de reconhecer e aprender com o nosso passado à medida que vivemos o nosso presente e navegamos em direção ao futuro. Tendo em conta que os fósseis de Homo Sapiens mais antigos foram encontrados em África, no rio Omo, na Etiópia. A  África é amplamente reconhecida como o berço da humanidade. A história da nossa espécie, o Homo sapiens, se baseia nos vestígios deixados pelos nossos antepassados. É neste contexto que começa nosso Afropassadismo.

A Paleoantropologia, uma ramificação da Arqueologia que nos ensina sobre evolução das espécies pré-humanas,  descobriu uma série de evidências fósseis que  demonstra a origem africana da linhagem humana, também temos atualmente  várias outras evidências que se complementam para detalhar  mais essa  nossa história, principalmente no que diz respeito à origem de nossa espécie e como ela povoou todos os continentes. A maioria dos cientistas concorda que há 150 mil anos a África Oriental estava povoada por sapiens. Assim, evidências de arqueologia, genética e linguística se somam aos dados de antropologia física (morfologia e paleoantropologia) para a reconstrução histórica dos nossos antepassados. Os cientistas também concordam que há cerca de 70 mil anos, sapiens da África Oriental se espalharam na península Arábica e de lá rapidamente tomaram o território da Eurásia

Entendemos que  Afropassadismo é a Sankofa: San (voltar, retornar), Ko (ir), Fa (olhar, buscar, pegar).  É um símbolo poderoso da sabedoria que pode ser adquirida olhando para trás, para as nossas raízes, e usando esse conhecimento para seguir em frente. Sankofa é um conceito do povo Akan de Gana. A Sankofa está profundamente enraizado na filosofia e cultura africanas. Enfatiza a importância de aprender com o passado para obter progressos positivos no presente e no futuro. O símbolo da Sankofa é um pássaro que parece avançar enquanto olha para trás, significando a ideia de incorporar aspectos do passado ao presente para construir o futuro. 

Nas sociedades africanas, o conhecimento, a história e a ciência são produzidos, experimentados e ensinados em comunidade. A relação entre tecnologia e ancestralidade é sobre transformação. A tecnologia ancestral refere-se ao estudo de técnicas, processos e meios pelos quais são promovidas transformações no mundo a partir de atividades já vivenciadas que nos ajudam a transformar as realidades atuais. Nesta perspectiva criamos a  tecnologia ancestralCiclo Sankofa que está inserido na dimensão do tempo que olha para o Passado (Afropassadismo), ressignifica o presente (Afropresentismo) e cria o futuro desejado (Afrofuturismo).

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

Imagem: Mapa das migrações humanas mostrando a origem do homem na África há 200 mil anos – credito Revista da UFMG
 

A diferença entre Parditude e Negritude

A Parditude surgiu na inspiração do conceito de Negritude, de Senghor e de Césaire. A Negritude foi um movimento literário e político que teve origem nas décadas de 1930 e 1940, no contexto do colonialismo e da escravidão, que deixaram marcas profundas na história e na identidade dos povos africanos e afrodescendentes. A palavra “Negritude” é uma junção dos termos “negro” e “atitude”, e representa a valorização da cultura, história e identidade negra. A Negritude busca combater estereótipos e preconceitos raciais, promovendo o orgulho e a valorização da herança africana.

A Parditude, por sua vez, é um termo mais recente, que busca dar visibilidade e reconhecimento aos pardos ou mestiços no Brasil, que são aqueles que possuem origens indígenas, africanas, europeias e asiáticas. A Parditude é uma afirmação da identidade e cidadania dos pardos e mestiços, reivindicando seus direitos e sua participação na sociedade brasileira.

A diferença entre Parditude e Negritude é que a Parditude se refere à identidade e à cultura dos pardos ou mestiços no Brasil, enquanto a Negritude se refere à identidade e à cultura dos negros ou afrodescendentes no mundo. Ambos os conceitos buscam valorizar a diversidade e a riqueza cultural que esses grupos representam, reconhecendo suas origens e contribuições para a humanidade. No entanto, a Parditude e a Negritude também possuem suas especificidades e desafios, de acordo com os contextos históricos e sociais em que surgiram e se desenvolveram.

A Parditude não é separada da Negritude, Indigenitude e da Branquitude, pois compõe a essência da Afro-humanitude que mostra que a humanidade é uma só, mas com múltiplas expressões.  Assim, a Parditude e a Negritude são conceitos que se complementam e se fortalecem na luta contra o racismo e pela valorização da diversidade cultural.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut

O que é Parditude?

Parditude é um termo que se refere à identidade e à cultura dos pardos ou mestiços no Brasil. Uma forma de valorizar a diversidade e a riqueza cultural que os pardos e mestiços representam, reconhecendo suas origens indígenas, africanas, europeias e asiáticas. Parditude é uma afirmação da identidade e cidadania dos pardos e mestiços, reivindicando seus direitos e sua participação na sociedade brasileira.

Segundo a definição de Beatriz Bueno, uma pesquisadora e ativista do movimento racial brasileiro, Parditude é “a consciência de que somos um povo mestiço, que temos uma história própria, que não somos nem brancos nem negros, mas sim uma mistura de ambos, e que temos orgulho disso”. Parditude também é o nome de um canal no YouTube, onde Beatriz Bueno compartilha seus conhecimentos e experiências sobre o tema.

Parditude é uma forma de resistir ao racismo e ao apagamento histórico que os pardos e mestiços sofrem no Brasil, onde muitas vezes são invisibilizados ou forçados a se enquadrar em categorias raciais binárias. Os pardos no Brasil são as pessoas que se identificam como tendo uma mistura de origens étnicas, principalmente de brancos, negros e indígenas.

De acordo com o IBGE, pardo é um termo que se refere às pessoas que se identificam como tendo uma mistura de origens étnicas, principalmente de brancos, negros e indígenas. Preto é um termo que se refere às pessoas que se identificam como tendo uma ascendência oriunda de nativos da África, independentemente de seu território ou construção social, pelo fenótipo manifestado por sua pele de cor escura. Negro é um termo que se refere ao conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pelo IBGE, ou que adotam autodefinição análoga.

Os pardos são o maior grupo racial do Brasil, representando 46,8% da população, de acordo com a PNAD de 2019. Os pardos estão presentes em todas as regiões do país, mas são predominantes nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Os pardos têm uma história e uma cultura própria, que refletem a riqueza da diversidade brasileira.

A origem da palavra pardo vem do latim pardus, que significa leopardo, Panthera pardus, também chamado de pantera, faz parte da família dos felinos. Essa palavra teria passado para o grego como párdos, e depois para o português como pardo, designando uma cor entre o escuro e o menos escuro, por comparação com a cor do felino. No Brasil, a palavra pardo foi usada desde o século XVI para se referir às pessoas mestiças, especialmente de origem indígena e africana, que não se encaixavam nas categorias raciais impostas pelos colonizadores. A palavra pardo, portanto, tem uma origem complexa e uma história marcada pela diversidade e pela resistência.

O termo Parditude surge na inspiração do conceito de Negritude, de Senghor e de Césaire. Assim, a Parditude não é separada da Negritude, Indigenitude e da Branquitude, pois compõe a essência da Afro-humanitude que mostra que a humanidade é uma só, mas com múltiplas expressões. A Afro-humanitude é um conceito que propõe a África como o berço da humanidade e o centro da história universal do mundo. A Afro-humanitude é a conexão entre a África e a Humanitude (Sumak Kawsay, Teko Porã, e Ubuntu), que é o vínculo universal que liga toda a humanidade. A Afro-humanitude contempla a Negritude, a Indigenitude, a Branquitude, a Parditude, e continua aberta e disponível para outras humanitudes, reconhecendo a diversidade e a riqueza cultural que elas representam.

Por Hernani Francisco da Silva – Do Afrokut